Por Rui Herbon
Neste mundo
obsessivamente interconectado, onde é mais fácil comunicar com alguém em
Tombuctu que falar com o vizinho do lado, o mais difícil de tudo é
comunicar consigo mesmo. Schopenhauer colocava-o assim: «A solidão é a
sorte de todos os grandes espíritos». Mas, mais que sorte, é uma aprendizagem,
uma auto-exigência e, talvez, uma valentia. No fundo não estranho que tenhamos
pânico da solidão, como o temos também do silêncio, porque ambos nos resgatam
do ruído quotidiano, desmontam os subterfúgios que pacientemente havíamos
construído, e devolvem-nos sem piedade ao essencial. Inclusive incitam-nos a
fazer perguntas. E nestes tempo onde o surfing da vida triunfa em todos os
aspectos — comida rápida, relações rápidas, conversas rápidas —, a ideia
de estar só consigo é quase revolucionária.
Falo evidentemente da solidão criativa, escolhida e procurada entre o ruído
quotidiano. A outra, a daquelas pessoas que ficaram sós, amiúde em idades
avançadas, é outra história. Nesse caso não se trata de uma respiração que
insufla a alma, mas de viver com a sensação de abandono. O que, estranhamente,
é uma consequência mais desta sociedade de tanta gente junta e ligada
que contudo está a perder a capacidade de falar. Este tipo de solidão, sem
dúvida nenhuma, não tem nada de criativo e tem tudo de doloroso. Mas a outra
solidão, a que é capaz de conviver e construir caminhos partilhados, que não
está vazia de gente, mas muito cheia, que não foge, mas que busca e encontra,
essa solidão devia ser uma reivindicação diária, uma auto-exigência, um prazer
concedido.
Pouco a pouco vamos perdendo essa capacidade de recolher-nos em nós, seja para
ler um livro ou ouvir um disco, ou simplesmente para observar a vida. E
perdemo-la porque é mais fácil vivermos rodeados de ruído humano, ainda que
tenhamos esquecido a gramática para entender a linguagem. No fundo creio que
somos uma sociedade assustada e frágil, e que preferimos colocar-nos apenas as
perguntas certas para não vislumbrarmos o abismo interior pelo qual derrapamos.
Por isso educar é também ensinar a parar o tempo, despojar-se dos disfarces,
ficar só com as próprias interrogações e aprender a gostar de si. Essa solidão
conquistada é, no fundo, a conquista de si mesmo.
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Fonte: Delito de Opinião - http://delitodeopiniao.blogs.sapo.pt/
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