sexta-feira, 14 de agosto de 2015

Solidão



Por Rui Herbon 


Neste mundo obsessivamente interconectado, onde é mais fácil comunicar com alguém em Tombuctu que falar com o vizinho do lado, o mais difícil de tudo é comunicar consigo mesmo. Schopenhauer colocava-o assim: «A solidão é a sorte de todos os grandes espíritos». Mas, mais que sorte, é uma aprendizagem, uma auto-exigência e, talvez, uma valentia. No fundo não estranho que tenhamos pânico da solidão, como o temos também do silêncio, porque ambos nos resgatam do ruído quotidiano, desmontam os subterfúgios que pacientemente havíamos construído, e devolvem-nos sem piedade ao essencial. Inclusive incitam-nos a fazer perguntas. E nestes tempo onde o surfing da vida triunfa em todos os aspectos — comida rápida, relações rápidas, conversas rápidas —, a ideia de estar só consigo é quase revolucionária.

Falo evidentemente da solidão criativa, escolhida e procurada entre o ruído quotidiano. A outra, a daquelas pessoas que ficaram sós, amiúde em idades avançadas, é outra história. Nesse caso não se trata de uma respiração que insufla a alma, mas de viver com a sensação de abandono. O que, estranhamente, é uma consequência mais desta sociedade de tanta gente junta e ligada que contudo está a perder a capacidade de falar. Este tipo de solidão, sem dúvida nenhuma, não tem nada de criativo e tem tudo de doloroso. Mas a outra solidão, a que é capaz de conviver e construir caminhos partilhados, que não está vazia de gente, mas muito cheia, que não foge, mas que busca e encontra, essa solidão devia ser uma reivindicação diária, uma auto-exigência, um prazer concedido.
Pouco a pouco vamos perdendo essa capacidade de recolher-nos em nós, seja para ler um livro ou ouvir um disco, ou simplesmente para observar a vida. E perdemo-la porque é mais fácil vivermos rodeados de ruído humano, ainda que tenhamos esquecido a gramática para entender a linguagem. No fundo creio que somos uma sociedade assustada e frágil, e que preferimos colocar-nos apenas as perguntas certas para não vislumbrarmos o abismo interior pelo qual derrapamos. Por isso educar é também ensinar a parar o tempo, despojar-se dos disfarces, ficar só com as próprias interrogações e aprender a gostar de si. Essa solidão conquistada é, no fundo, a conquista de si mesmo.

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Fonte: Delito de Opinião - http://delitodeopiniao.blogs.sapo.pt/


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