terça-feira, 4 de agosto de 2015

As três despedidas e o tempo que não mais vem

Por Leont Etiel

Agora a noite já chega. A florista aproxima-se com uma flor que cintila viver. Mas isso já não importa. Quando a vida bate às portas do noturno a sua visão torna-se cinzenta.
Na vilazinha, a penumbra da luz da pequenina Igreja faz réstia por entre as frestas das janelas, enquanto o soar breve do sino anuncia simbolicamente despedidas. São 18h00. Três despedidas.
Despedida do dia que cessa, que anunciou para alguns e cumpriu; que, para outros, anunciou e não cumpriu; e, para outros terceiros, nem sequer anunciou. Foi apenas um feixe de luz escorrendo desordenadamente no espaço.
Despedida de alguém que encerrou o ciclo vital, sem se dar conta de que este teria  fim. E sem entender o significado de a ‘existência preceder a essência’. Alheio à satisfação resultante da interação entre corpo e mente. Alheio à introspecção.
Despedida do que fica, porém não mais enxerga, ou não quer enxergar, a flor que a florista traz na mão esquerda. A luz do dia não mais lhe corre pela noite da idade. O noturno se lhe levanta fazendo cinzento a cor de tudo à sua frente. Chega o outono, com a transição para a quietude do inverno existencial.
Agora a noite já chega. E o tempo de vê-la além do cinzento não mais vem...


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