Óleo e acrílica sobre tela, Francisco Ben |
Por Eric Costa
Somos reféns perpétuos de
nosso próprio microcosmo mental. Já diria eu outras vezes por essas mesmas
linhas tortas.
Eternidade é transcendental ao tempo: agrava-se quando se
vê a chave de nossos problemas às mãos de um carcerário cruel, que faz do
tilintar das chaves a gota torturante que cai sobre a testa indefinidamente. É
desumano – ou talvez seja humano demais? – constatar: as soluções estão logo
ali, mas o braço é curto demais para alcançá-las – se é que somos capazes de
esticá-los.
Um pesadelo. Um medo profundo de não acordar. Uma fiel
certeza de aquela agonizante dimensão ser real por alguns minutos. Por horas,
quem sabe. Em um cárcere profundo, perdem-se as noções de tempo e espaço.
Braçadas, passos largos e quedas a outros planos. Súbito, um universo em
desejada e longamente pretendida expansão. A orquestra ao fundo, com o maestro
de sempre, mas com uma peça teatral em palco vizinho. Nela a imperfeita
simetria com a assimetria tão sempre pensada: os personagens de sempre, mas em
áureo rearranjo. Poderia se dizer ideal, se tal condição existisse e não fosse
uma utopia palpável apenas às visões distorcidas.
Outrora, do caos a criação – não que a atualidade seja
diferente disto. Do profundo e sombrio pesadelo, um par de minutos em harmônico
sonho.
Há um quê de admiração, no fim, a anarquia deste
microcosmo mental que nos cerca. Sob nosso lúcido controle, somos encarcerados
na vigília. Os muros e grades ao nosso redor? Um pouco de mais do mesmo daquilo
que é intrínseco. Ao sono, parecemos ganhar o pincel da criatividade, as
tintas e até mesmo as telas já prontas que tanto idealizamos nas tão
improdutivas horas que habitam nossos dias. O piloto automático do acordar, ao
dar lugar ao voo planador das horas de sono, nos faz refletir que a mesma
encarcerada mente diurna é espírito livre à escuridão e capaz de dos pesadelos
edificar sonhos em estalar de dedos.
O que afasta cada um de tal propriedade de constante
mudança, se só ela é de fato permanente? O braço de cada um poderia, mas não
estica o suficiente a alcançar as chaves dos problemas. É a terceira conclusão
que tiro da mesma forma. Segunda? De fato, a desordem cerca. Até contar
torna-se difícil. Mais pura constatação de se estar perdido meio a um laço
infinito.
O braço segue sem esticar. Talvez por incapacidade. Quase
certamente por opção. As portas da percepção me trazem: será mesmo girar as
chaves e explorar novos horizontes o desejo definitivo? Na imperfeita métrica
humana, segue-se caminhando. Ao sabor de quem dedilha as cordas do universo
sim, mas talvez ao som da sinfonia do tilintar de chaves do carcerário com a
qual, quem sabe, já estejamos acostumados e rendidos. E que talvez
meramente aceitemos.
Um medo agonizante de não acordar, por ora. Um receio sem
fim do que nos habita a simples abertura dos olhos. Quase sempre.
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Fonte: http://canalsubversa.com/?p=2422
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