quinta-feira, 2 de julho de 2015

Grécia: o que está em causa

Difícil encontrar, nos principais órgãos de imprensa (nacional e internacional), notícias confiáveis sobre a situação grega. Em geral, predomina a parcialidade para desgastar o governo grego. Só garimpando muito, encontra-se informação digna dessa denominação a respeito. Nesse sentido, aí abaixo uma entrevista com o conhecido economista James Galbraith, da Universidade do Texas em Austin (EUA). 

grecia
Jovem apoiante do governo grego, liderado pelo partido Syriza

Por Eleonora Lucena (Folha de São Paulo) 

Folha — Quais são as possíveis consequências da atual crise na Grécia?
James Galbraith — Nesse momento, as potências europeias estão esmagando Grécia de todas as maneiras possíveis. Claramente, elas pretendem derrubar o governo eleito da Grécia e substituí-lo por um governo mais complacente.
Qual deve ser o voto no próximo domingo? Se você fosse grego, como o sr. votaria?
Eu certamente votaria "Não". A independência política do país está em jogo.
A Grécia deve sair do euro?
Não. Não há nenhum mecanismo legal que possa forçar a Grécia a sair, e o país não vai deixar voluntariamente o euro sob este governo.
Quais seriam as consequências políticas e econômicas de uma saída da Grécia do euro?
As consequências da política vingativa das potências europeias em relação à Grécia serão muito graves. Ela vai envenenar toda uma geração contra a Europa e encorajar partidos anti-europeus. Incluindo, especialmente, a Frente Nacional, na França.
Em qual dimensão essa crise pode afetar o projeto de Europa?
A liderança europeia parece inclinada a sacrificar a Europa para o seu próprio projeto de controle político e financeiro.
Como o sistema bancário europeu deve reagir a esta crise? Há risco de quebras?
O Banco Central Europeu pode lidar com o sistema bancário e poderia também ter protegido os bancos gregos se não se guiasse por forças políticas para destruí-los.
Há paralelos entre a situação grega atual e Argentina no início do século 21?
Possivelmente.
Há paralelos entre a situação atual e a que antecedeu a Primeira Guerra Mundial?
Certamente. O momento lembra agosto de 1914, quando a Europa tombou em uma guerra destrutiva. Também se assemelha à "Paz cartaginesa" de 1919, quando o Tratado de Versalhes impediu a criação de uma solução de paz justa e durável, exigindo o pagamento de dívidas impagáveis pela Alemanha.
Por que as alegações de que a Grécia é "preguiçosa" e "perdulária" estão erradas?
São estereótipos racistas, vis e condenáveis como são todos os estereótipos racistas.
Qual é o papel do sistema financeiro na crise grega?
Não há "crise grega". É uma crise da Europa e uma consequência da crise financeira global. É claro que o sistema financeiro tem desempenhado um papel central.
Nas causas da crise, é correto afirmar que a dívida privada grega se transformou em pública e que houve fraude de bancos?
A dívida grega, em grande parte para bancos franceses e alemães, foi assumida em 2010 pelos outros Estados europeus, o BCE e o FMI, a fim de resgatar esses bancos. A Grécia não obteve nenhum benefício dessa operação. Os bancos, que fizeram empréstimos terríveis, não tiveram perdas e escaparam.
Diretores não-europeus do FMI objetaram e previram que poderia ser um desastre.
Com Yanis Varoufakis [ministro grego], o sr. defendeu um novo modelo de desenvolvimento para o continente. Como seria este modelo? O sr. tem falado com ele?
Estamos em comunicação todos os dias. Estou orgulhoso de estar com Yanis Varoufakis que é, a meu ver, uma das pessoas mais extraordinárias que tive o privilégio de conhecer.
Qual é a sua avaliação do desempenho do governo grego e das instituições europeias nesta crise?
Nenhum governo lida com tudo perfeitamente. Mas o governo grego tem tido uma posição honesta. As instituições europeias (e o FMI) têm um comportando que a história julgará.
Como explicar a posição da Alemanha no caso? O país não é o maior beneficiário do euro e não deverá perder muito se o projeto fracassar?
A Alemanha, a França e os países do Norte europeu são comandados por lideranças com visão tacanha, mais interessadas em se manter no poder e avançar em suas ambições políticas.
A Grécia deveria buscar apoio na Rússia ou na China?
Não há esperança razoável para afirmar que isso iria funcionar.


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