sexta-feira, 17 de julho de 2015

Confundir desejo com realidade: tropeços

Fazer análise confundindo desejo com a realidade significa andar, no mínimo, meio caminho para tropeços nas conclusões. É o caso do artigo a seguir reproduzido, de autoria de Renato Rovai, que tem, registre-se, desenvolvido pertinentes abordagens em outros textos. O Brasil chega ao fim de semana sob o impacto das apreensões de bens do ex-Presidente Fernando Collor e a acusação frontal de delatores, na Operação Lava Jato, ao Presidente da Câmara, Eduardo Cunha. Sempre hábil em fugir das acusações de trambiques, o deputado, acuado, usou a instituição e convocou cadeia nacional de rádio e televisão para falar à Nação nesta sexa-feira (17/07). Não se sabe o que dirá dizer, mas já se sente a configuração da cortina de fumaça, detectada em duro pronunciamento contra Cunha pelo deputado pernambucano Jarbas Vasconcelos. Percebendo o cerco, Cunha declara agora que rompeu com a Presidente Dilma. A justificativa oficial é que o Ministério Público e o Governo, por via do Ministério da Justiça, lhe persegue. Como se fosse a Presidente Dilma que conduzisse a Lava Jato ou tivesse ascendência sobre o juiz Sérgio Moro! Na verdade, com o gesto, o deputado Cunha busca abrigo na oposição, buscando sobrevier. Dos fatos, Renato Rovai conclui que o Presidente da Câmara está liquidado. 'Menos', como dizem os jovens. Se juntar a capacidade de manobra do deputado Eduardo Cunha, já tantas vezes demonstrada - agora movida pela ira do instinto de sobrevivência -, com o desejo de setores da oposição de depor a Presidente de qualquer forma, a mistura pode ser explosiva. De todo modo, segue aí o descompassado artigo de Rovai. 

Por Renato Rovai

A delação de Júlio Camargo, da Toyo Setal, de que Eduardo Cunha teria sido responsável pela cobrança de 10 milhões de dólares de propinas referentes a dois contratos de US$ 1,2 bilhão de navios-sonda, assinados pela Petrobras entre 2006 e 2007, é a tampa do caixão político do presidente da Câmara Federal que já vinha perdendo força no Congresso, apesar de todo seu comportamento de dono da Casa. Quem tiver dúvidas do que estou dizendo deve procurar o que Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) andou dizendo dele.
Cunha  vem escapando de escândalos aqui e acolá há algum tempo. E vem conseguindo ampliar seu raio de atuação agindo como lobista de vários setores. Na disputa do Marco Civil da Internet, por exemplo, operou fortemente para derrotar a nova legislação a favor das teles. Certamente apenas por ideologia…
A força de Cunha no Congresso tem muito a ver com isso. Ele não é um líder natural, que conquista seguidores pela ideias que representa. Ele é aquele que sabe se movimentar nos bastidores e influir a partir de operações um tanto heterodoxas.
Diversos deputados falam à boca pequena que Cunha ganhou as eleições para a presidência na Câmara ainda na campanha eleitoral. E que sua força teria relação com o financiamento da campanha de vários dos eleitos.
Se é verdade ou não, as investigações que serão abertas a partir do depoimento de Júlio Camargo poderão mostrar.
Mas em política, as coisas são mais complicadas do que parecem. E hoje Cunha acabou.
E por que ele acabou?
Porque mesmo os deputados que podem ter sido agraciados com seus favores agora já devem estar apagando todas as chamadas e torpedos que receberam dele nos últimos meses. Sabem que neste momento se relacionar com o presidente da Câmara passa a ser uma ameaça.
Aos poucos, alguns começarão a não só a se afastar dele como vão lhe sugerir que é hora de baixar as armas e sair do foco. Ou seja, tentar fazer uma presidência menos barulhenta ou mesmo se afastar dela enquanto as investigações acontecem. E para que com a sua presença de investigado não atrapalhe a ação de todos os seus colegas.
Certamente Cunha vai ter a generosidade de parte da mídia na cobertura do seu caso. Principalmente da Globo, cujas relações que mantém não vem de hoje.
Antes de ser parlamentar, Cunha foi convidado por Paulo César Farias (lembram?) para presidir a Telerj na gestão de Fernando Collor, o senador da Lamborghini de 2,5 milhões de reais.
Na época, ele encaminhou a privatização da empresa e envolveu-se em um escândalo de superfaturamento. Ele assinou um aditivo de US$ 92 milhões da Telerj com a fornecedora de equipamentos telefônicos NEC Brasil que era controlada pela família Marinho (vejam que coincidência).
Mas mesmo com a benevolência quase certa da Globo, Cunha não vai dar conta do que vai acontecer com ele a partir de agora. Manifestações contra o deputado passarão a ser uma constante depois disso. Principalmente porque ele tem se mostrado uma ameaça aos direitos da infância, dos LGBTs e de tudo que guarda relação com direitos humanos e ampliação de conquistas progressistas.
Ou seja, esses grupos terão ainda mais um motivo para combatê-lo.
Como previsto por este blogueiro, Cunha não estava indo com tanta sede ao pote à toa. Ele queria mostrar força para tentar escapar das denúncias que sabia apareceriam na Operação Lava Jato. E que poderiam levá-lo a ter o fim de Severino Cavalcanti.
Cunha jogou seu jogo duro e ainda vai tentar outras caneladas, como aprovar o processo de impeachment de Dilma. Mas a partir de hoje ele é mais do que um pato manco. É um congressista carimbado por uma acusação gravíssima de corrupção, porque dez milhões não são dez tostões.
E ai, meus caros, com essa ameaça lhe infernizando a vida, Cunha não terá alternativa. Vai ter de trabalhar para se defender. E ficará sem condições de liderar o que quer que seja. E terá de voltar para a tumba da sua inexpressividade. De onde nunca deveria ter saído. Ou seja, o caixão político de Cunha está sendo lacrado antes do seu primeiro pronunciamento à Nação.
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Fonte: http://www.contextolivre.com.br/2015/07/chega-ao-fim-presidencia-de-eduardo.html



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