Leon Trotsky (centro), um dos principais líderes da Revolução Russa, no exílio, ao lado do surrealista André Breton (direita) e do escritor Diego Rivera (esquerda) |
Por
Leonardo Pádua
O dia 7 de novembro marca o
98º aniversário de um acontecimento que pretendeu não apenas mudar a história,
mas transformar o mundo do presente e do futuro. Com a tomada do Palácio de
Inverno de São Petersburgo pelos bolcheviques, como todos sabemos (ou deveríamos
saber) e o anúncio de que o poder na Rússia passava para as mãos dos sovietes,
pretendia-se iniciar uma nova etapa de desenvolvimento do homem, da sociedade e
da história.
A
criação do novo tipo de Estado fomentado pelos revolucionários bolcheviques a
partir das aplicações práticas da filosofia marxista se distinguiria por seu
caráter de modelo socioeconômico que, respondendo à vontade da maioria
trabalhadora, imporia uma nova forma de exercer o poder, praticar a economia e
reger a política.
Seria
uma estrutura social em que as grandes massas criadoras de riqueza e
eternamente exploradas passariam a ser as novas beneficiadas e possibilitariam
a concretização de uma das utopias mais antigas do homem civilizado: viver em
uma sociedade na qual, com um máximo de liberdade e uma democracia popular
compacta, o ser humano alcançaria a plenitude de seus direitos, capacidades e
possibilidades. A idílica sociedade dos iguais.
Leon
Trótski foi um dos líderes do levante popular que passaria para a história como
a Revolução Bolchevique de outubro de 1917 (pois, segundo o antigo calendário
russo, aconteceu no dia 26 de outubro, que corresponde a 7 de novembro) e foi
exatamente Trótski o encarregado de anunciar "urbi et orbi", que o
poder na Rússia passava para os sovietes, ou comitês de trabalhadores.
Como
todos sabemos (ou deveríamos saber), Liev Davidovich Bronstein, já então
conhecido por seu nome de guerra e pseudônimo literário, foi um dos pensadores
e revolucionários mais radicais e influentes de sua época.
Foi
também um dos primeiros invasores que tomariam aquele palácio russo, símbolo do
poder e da pompa do regime czarista que chegava ao fim naquele dia, dando lugar
a uma nova etapa histórica.
Mas
precisamente nesse dia, 7 de novembro de 1917, o revolucionário Trótski
completava 38 anos de idade, razão por que agora poderemos comemorar,
juntamente com os 98 anos da Revolução, os 136 anos do nascimento de um de seus
líderes, ocorrido em 1879 num pequeno povoado ucraniano da província de
Kherson, hoje chamada Kirovograd.
Os
mistérios insondáveis das datas fizeram coincidir em um mesmo dia um momento da
história que gerou mudanças profundas e aceleradas e um aniversário
significativo da vida de um personagem justamente histórico, protagonista
daquele acontecimento.
Porém,
como também sabemos (ou deveríamos saber), para além de alguma coincidência
notável ou conjuntura especial, as datas não costumam ter peso muito grande nos
caminhos da história: Trótski poderia ter nascido em 6 de novembro e a tomada
do Palácio de Inverno poderia ter acontecido no dia 8, e embora a essência do
que aconteceu poderia ter sido a mesma, o dia 7 de novembro de 1917 teria
perdido seu peso histórico muito especial para o mundo e sua relação intrínseca
com a vida de um homem imerso na história.
O
que importa de fato é o que aconteceu nesse dia e, dramaticamente, o que a
história e o destino reservaram para o fato histórico e o homem unidos pela
ação e data.
Porque
aquele sonho utópico de fundar a mais democrática, livre e igualitária das
sociedades se frustrou em muito pouco tempo. As condições da história e o
caráter dos homens se conjugaram para que o poder dos sovietes e a ditadura do
proletariado nascidos naquele 7 de novembro se convertessem na ditadura
criminosa de Josef Stálin e sua polícia política e, é claro, na mais dolorosa
perversão do velho e necessário anseio social da humanidade e no calvário que
acabaria com a vida do homem que tinha anunciado em São Petersburgo o
nascimento de uma nova era.
E a
perversão do sonho foi tão radical, tão devastadora e criminal que hoje a
alvorada de outubro de 1917 não passa de uma comemoração nostálgica de algo que
poderia ter sido e não foi, enquanto a lembrança da glória de Trótski é apenas
a convicção, para seus seguidores, de que ainda é preciso sonhar com a utopia
de um mundo melhor.
Lembramos
as lições do dramático fracasso de uma história cujos sinos tocariam pela
última vez no dia de 31 de dezembro de 1991, em que se anunciou o fim oficial
do país e da sociedade nascidos entre as brumas de São Petersburgo, um 7 de
novembro – ou um 26 de outubro.
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Fonte: Folha de São Paulo, versão para assinantes, edição do dia 07/11/2015
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