Tourists – Three Couples (neil on a boat) |
Por Fabricio Teixeira
O casal permanecia calado na
mesa ao lado. Sentados um em cada canto da mesa, mas sem estarem exatamente de
frente um para o outro. Olhei mais uma vez para eles e tentei traçar uma linha
imaginária no meio da mesa. Reparei que ele estava um pouco para a esquerda,
ela um pouco para a direita. Como se tentassem não se encarar em um ângulo
muito preciso, para que os anos todos em que se arrastaram juntos naquela
relação não lhes viessem à tona. Para que não tivessem que se olhar no espelho,
para que não vissem refletido no outro tudo aquilo que abriram mão no meio do
caminho. Olhava tudo isso na mesa ao lado e rapidamente desviava o olhar, para
não deixar que eles percebessem o complexo roteiro que minha cabeça inventava.
Ela
tinha os olhos tristes. Imaginou que ela escondesse marcas de desrespeito por
baixo da roupa. Ela vestia roupas velhas e comportadas, que não combinavam
muito com a beleza que ostentara com orgulho no passado. Devia ser mãe. Mãe de
três crianças lindas, mãe de três lindas escolhas que nunca fez. E
provavelmente tinha largado a profissão que sempre sonhou para ocupar uma outra
que lhe coubesse melhor em sua rotina de mãe.
Ele
devia ser engenheiro. Tinha o olhar sisudo e cansado, de quem passou o dia
dando ordens a gente que considera menos competente que ele, participando de
reuniões sem sentido e eventualmente escapando do trabalho para alimentar uma
relação extra-conjugal que já não o alimentava de volta. Usava o dosado poder
que lhe foi garantido pelos anos de trabalho e pelas rugas acumuladas no rosto
para cimentar o vazio que o habitava. No prato, as sobras de costelas roídas
com afinco.
E
hoje eles sentavam de lados opostos da mesa, ligeiramente desviados do centro,
como fazem os casais que já não fazem questão de aparecerem juntos na mesma
foto. Calados. Já haviam terminado o prato havia longos minutos, mas pareciam
não terem força para levantar da mesa e irem para casa.
Na
mesa da frente, uma mulher sentada sozinha se ocupava com o celular.
Eventualmente lançava olhares para a minha mesa, mas logo desviava.
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Fonte: http://confeitariamag.com/
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