Aí abaixo um texto do Prof. Aldo Fornazieri, que, com uma ironia entrecortada de erudição, bem analisa o significado da reforma ministerial promovida pela Presidente Dilma. Agrego apenas os seguintes elementos:
1) a vergonhosa entrega do Ministério da Ciência e Tecnologia a alguém (aliado do deputado Eduardo Cunha) que não tem a menor qualificação para a sua gestão. Que pelo menos, espera-se, o novo ministro se cerque de assessores que entendam dos temas da pasta.
2) Nada assegura que a tal reforma traga estabilidade ao governo. E mais: a descoberta dos malfeitos de Eduardo Cunha não garante que ele cairá.
3) No terreno da busca por alternativas, referidas pelo Prof. Aldo no artigo, ter-se-á que evitar todos os resquícios de populismo que, hoje, galopam por aí em diversas esferas: no pensamento de "autores passados/ícones da libertação", em ditos "movimentos sociais" que se transformaram em fontes de receita para 'camisas pardas', em discursos universitários supostamente progressistas, etc.
Por Aldo Fornazieri
(Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo)
Em 2010, o marqueteiro das
campanhas petistas, João Santana, sugeriu que Dilma deveria ocupar o espaço da
rainha no imaginário popular. Haveria na “mitologia política sentimental
brasileira uma imensa cadeira vazia que, metaforicamente, é a cadeira de rainha”.
Dilma deveria suprir o vazio deixado pela saída de Lula com a ocupação dessa
cadeira. A reforma ministerial anunciada agora proporciona a Dilma, finalmente,
a ocupação dessa cadeira. Mas essa cadeira não estava vazia apenas de uma pessoa.
Estava vazia também de poder. A reforma ministerial confere a Dilma a condição
de uma governante sem o comando do seu governo. O governo será tocado pelo PMDB
de alguns caciques e pelo PT de Lula.
Não que o quadro gerencial e
administrativo do governo nesses nove meses do segundo mandato fosse animador.
Dilma montou um ministério desconectado com as terminações nervosas da
política, que têm seus centros de comando na Câmara dos Deputados, no Senado e
nos partidos. Cada vez mais afundada na crise política, econômica e moral do
país, sem capacidade de reação e cometendo um rosário interminável de erros, a
presidente está entregando agora, sem honra, aquilo que mais quis manter por
teimosia.
No fundo, a reforma tem dois
objetivos: 1) salvar o mandato de Dilma e evitar o impeachment; 2) criar as
condições políticas para buscar uma saída para a crise econômica. Do ponto de
vista imediato, os dois objetivos podem até ser atingidos. Mas, dada a
imperícia e a crise de legitimidade que atingem a Presidência da República e as
instituições, e dada a fragmentação política, a divisão entre e dentro dos
partidos e a existência de um jogo entre oposição e governismo que visa apenas
o poder, nada garante que a crise política seja estancada e que as condições de
governabilidade sejam estabelecidas.
Se é verdade que os governos
em crise ditam as suas ações sob a égide da necessidade, nem tudo o que abrange
a atual reforma ministerial deveria seguir os ditames de becos sem saída. Por
exemplo: os ministérios da Educação e Saúde, por dizerem respeito a dois
direitos fundamentais do povo e por serem áreas estruturantes para o
desenvolvimento econômico e social do Brasil, não deveriam ter entrado no rol
das barganhas políticas.
Sacrificar essas duas áreas –
Educação e Saúde – no altar conspurcado dos apetites sem fim dos políticos,
significa sacrificar o próprio povo, significa sangrar o próprio futuro da
nação. Saúde e Educação vinham sendo tocadas por técnicos de reconhecida
competência. Saúde e Educação, junto com a Cultura, são áreas inarredavelmente
ligadas à dignidade das pessoas, à dignidade de um povo. Quando elas entram no
jogo do mercantilismo político puro e simples, cujo único propósito é o poder
pelo poder, é porque o próprio poder já não tem nenhuma alma, nenhum espírito,
nenhum pudor.
Um governo que perdeu tudo
isto, perdeu a sua própria dignidade. O mais grave é que não se vislumbram
alternativas a isto que está aí, e nem perspectiva de virada em favor do Brasil
e da sociedade. Se alternativa existir, ela não parece estar no rol dos
principais partidos existentes. Se alguma alternativa existir, terá que ser
forjada e construída pela própria sociedade.
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Fonte: http://www.fespsp.org.br/
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