Por Leont Etiel
As feições ocultas da fala e da escrita,
quase sempre, desfilam diante dos nossos olhos e soam sem serem entendidas por
nossos ouvidos. ‘Cada palavra tem mil faces secretas’ sob uma suposta face
neutra’. A palavra dita que diz sem dizer; a palavra falada que fala sem falar
o que está abrigado no cerne do falante.
Na ausência de barulho, quando o eco das
palavras desaparece, cria-se um silêncio que, ao mesmo tempo, oculta e revela,
e é como se o silêncio que havia antes contivesse um silêncio maior, que agora
se apresenta como que interrogando as pessoas, que se olham, riem contidamente
e nada dizem. Ou apenas lamentam-se pelo olhar.
Aquelas palavras que são pronunciadas como uma
espécie de fio, que depois de findas se estendem, ficando implícito que algo
faltou falar, que não se disse tudo, que na sequência dir-se-á o que restou por
pronunciar. Mas a conversa cessa. Aí o segredo tem morada.
Aquelas palavras que se manifestam apenas em
pensamento, mais aquelas outras que se diz apenas de si para si em voz
inaudível, para falar de desejos, de planos, de erros, de arrependimentos, de
tristezas, de alegrias íntimas. Aí o segredo encontra habitação.
Como residência do segredo, as palavras
deambulam com relativo ‘grau de autonomia’. Com efeito, os nomes das pessoas,
por vezes, ‘falam’ sobre elas mais do que elas de si. Foi o que José Saramago,
tratando de ‘todos os nomes’, anotou ao sentenciar ‘que conheces o nome que te
deram, mas não conheces o nome que tens’. O denominado pensa que tem o nome,
mas é o nome que tem o denominado.
Talvez essa ‘vida autônoma’ das palavras, ao
abrigo dos segredos, contribua para o esvanecimento dos pensamentos que não
fazem bem, que incomodam e machucam. Encarregam-se as palavras de os deixarem a
sós, com eles pelejando consigo mesmo até se cansarem e serem ultrapassados pelo
devanear biopsicossocial. Chegam a uma bifurcação mental onde, cansados e
desgastados, sem palavras que os animem, caem na via do esquecimento.
O segredo que mora nas palavras resiste à
fala pronunciada. Palavras ditas e repetidas sem, contudo, revelarem a essência
de quem está a falar. Com Antoine de Saint-Exupéry, ‘eis o meu segredo: só se
vê bem com o coração. O essencial é invisível aos olhos. Os homens esqueceram
essa verdade, mas tu não a deves esquecer. Tu te tornas eternamente responsável
por aquilo que cativas.’
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