Para uma reflexão sobre meio ambiente, 'desenvolvimento insustentável' capitalista e governo. Enquanto as conferências do clima, realizadas há anos mundo a fora, não passam de faz de conta. Quando muito têm servido para turismo de evento e acadêmico.
"Lama" da mineradora Samarco, em Mariana (MG), se espalha pela foz do rio Doce na praia de Regência em Linhares (ES) (Foto: Fabio Braga, Folhapress) |
Por João Lara Mesquita
O desastre de Mariana,
possivelmente, é o pior acidente ambiental brasileiro. Além de soterrar
comunidades, matando 11 pessoas, e deixando 8 desaparecidos até agora, provocou
a morte do rio Doce.
O
Saae (Serviço Autônomo de Água e Esgoto), de Baixo Guandu (ES), analisou a água
do rio e encontrou metais pesados: chumbo, alumínio, ferro, bário, cobre, boro
e mercúrio.
"O
rio está morto, o cenário é o pior possível", disse Luciano Magalhães,
diretor do Saae. Morte anunciada em razão de uma legislação frouxa e
inexistência de fiscalização.
Além
da Samarco, propriedade da Vale e da anglo-australiana BHP Billiton, o governo
federal também deveria ser punido; afinal, a responsabilidade é dele.
O
Código de Mineração, no capítulo 2º, artigo 21º, inciso 24, estabelece que
"compete à União organizar, manter e executar a inspeção do
trabalho".
Já o
capítulo 1º, artigo 174, é claro: "Como agente normativo e regulador da
atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de
fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor
público e indicativo para o setor privado".
Infelizmente,
como denuncio em meu trabalho, a ausência de fiscalização é unânime em todas as
comunidades nativas do litoral.
A
Folha noticiou, em junho passado, que o principal órgão de controle ambiental
do governo federal, o Ibama, tem apenas três barcos em atividade para
fiscalizar os mais de 7.300 km do litoral brasileiro.
Em
entrevista para o site "Mar sem Fim" (www.marsemfim.com.br), Maria
Tereza Jorge Pádua, um dos ícones do ambientalismo brasileiro, sentenciou:
"o meio ambiente nunca foi prioridade no Brasil".
Alguém
duvida?
Fui
aos sites. Descobri que a "missão" da Vale é "transformar
recursos naturais em prosperidade e desenvolvimento sustentável".
Desconfio de quem se diz "verde", "sustentável", "eco
isso ou aquilo". Cansei de ver a destruição do litoral por empresas que
abusam do jargão.
De
toda forma, continuei a leitura. A Vale lista no site seis valores que norteiam
a atuação da empresa. O primeiro e o terceiro foram duros de engolir.
Respectivamente, "a vida em primeiro lugar" e "cuidar de nosso
planeta". Argh!
O
pior estava por vir. Vasculhando sobre a BHP, a casa caiu. O governo federal
foi tão omisso que não se preocupou com o histórico de acidentes da empresa.
A
BHP Billiton, ao contrário de Midas, tem dedo podre. Acidentes graves são
frequentes onde atua. Um dos piores aconteceu em Papua-Nova Guiné, ao abrir uma
mina de ouro e cobre, a OK Tedi Copper Gold Mine, em 1984.
Durante
20 anos despejou, dia após dia, 80 mil toneladas de rejeitos contendo cobre,
cádmio, zinco e chumbo, diretamente na bacia do rio Fly, o que arruinou terras
de milhares de agricultores, envenenando 2.000 quilômetros quadrados de
floresta. E detonou dois rios, o Fly e o Ok Tedi.
Para
fugir das responsabilidades, assinou acordos com líderes comunitários, que
isentaram a empresa do pagamento de indenizações.
ONGs
informaram que "ao conversarem com os nativos, ficou claro que eles não
sabiam o que estavam assinando". O histórico da BHP gerou um relatório
alternativo, "BHP Billiton Dirty Energy", informando sobre a
destruição de comunidades na Colômbia, acidentes na Indonésia e Austrália.
Já o
"Mining Journal" cita outros, como o da mina de cobre em Pinto
Valley, Arizona (EUA).
Só o
Brasil oficial não sabia?
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Fonte: Folha de São Paulo, versão para assinantes, edição do dia 02/12/2015. Título original: 'Só o Brasil oficial não sabia?'
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