O universo de Logan Zillmer |
Por Christoph Türcke
Mas nós ainda não chegamos
lá. Primeiramente Nietzsche mostrou de modo ineludível sobre que a consciência
tem de se enganar para poder ser consciência: sobre o fato de que ela não é o
centro do mundo, tal como ela se põe; não é o puro espírito, na qualidade do
qual ela age. Agora, porém, vem a consequência: sendo cheia de tais defeitos,
ela não pode em todo caso ser aquilo por que foi tida desde os tempos mais
remotos, e com maior razão na filosofia: órgão da verdade. Então, o que é ela?
Poesia! Responde Nietzsche, e nos dá uma primeira amostra daquilo que ele mais
tarde irá chamar “transvalorização de todos os valores”. Entre sujeito e objeto
não há nenhuma causalidade, nenhuma adequação, nenhuma expressão, mas, quando
muito, uma relação estética, ou seja, uma transposição alusiva, uma tradução
balbuciante em uma linguagem totalmente estranha – para isto, porém, precisa-se
ter uma esfera e uma força intermediárias que livremente poetizam e inventam. O
intelecto, este sonhador que sonha não sê-lo, malogra até mesmo por não saber
sequer da grande força que reside em sua fraqueza, a saber: Apenas através do
esquecimento daquele primitivo mundo metafórico, apenas através do
endurecimento e enrijecimento de uma massa imagética originária, fluindo em
impetuosa liquidez da capacidade básica da fantasia humana, apenas através do
fato de o homem se esquecer como sujeito, e notadamente como sujeito
artisticamente criativo, é que ele vive com alguma tranquilidade, segurança e consequência:
se ele pudesse sair apenas por um momento das paredes que o aprisionam nesta
crença, então imediatamente desapareceria sua autoconsciência. Autoconsciência
significa aqui autorreflexão quanto à autocerteza. Nietzsche não conhece a
separação de ambos: aquele venerável empreendimento que se chama desde Aristóteles
'pensamento
do pensamento' nunca foi aquilo pelo que foi tomado. No auto-asseguramento
sobre o ente enquanto ente, sobre os primeiros princípios e as
supremas causas, sobre o pensamento em si e sua capacidade de ser o mais
agradável e melhor, em suma, em todo o esforço intelectual da filosofia, jamais
o motor foi uma pura inclinação para a verdade, mas sempre o impulso para a
segurança. Autoconsciência é meramente o estado da alma no qual ela ganhou
firmeza, consistência e verdade, é meramente seu nome para aquilo que é capaz
de lhe conferir suporte. Pois, o que as pessoas querem ao quererem conhecer?
Nada mais que isto: que algo “estranho” seja reconduzido a algo conhecido. E
nós – será que entendemos por conhecimento propriamente algo mais, não será
nossa necessidade de conhecer exatamente esta necessidade de algo conhecido, a
vontade de descobrir em meio a tudo que é estranho, insólito, questionável,
algo que não mais nos inquiete? Não seria o júbilo do conhecer exatamente o
júbilo pelo sentimento de segurança (re)conquistado?
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Do original alemão ‘Der tolle
Mensch – Nietzsche und der Wahnsinn der Vernunft'. Tradução de Daniel Sant’Anna
e Rosane Guedes.
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