sábado, 26 de dezembro de 2015

A morte a cada instante e a despedida que não se sabe se é para sempre

Há, entre alguns povos orientais, o hábito de as pessoas se despedirem com 'muito apreço'. A razão é que - explicou-me pacientemente um amigo indiano certa feita - leva-se muito em conta a probabilidade de a despedida ser a última. Bem, no Ocidente, por estes tempos de fim de ano/início de outro, possivelmente isso seja algo que valha a pena pensar, assim como em outros aspectos das milenares culturas orientais. Dando uma vista de olhos num livro do poeta português Manuel Alegre ('Chegar Aqui'), revi essa preciosidade aí abaixo, que se insere inteiramente nessa perspectiva da brevidade da vida. Chama-se 'Agora Mesmo', mas poderia ser também a 'A Morte a Cada Instante'. 




Por Manuel Alegre

Está gente a morrer agora mesmo em qualquer lado 
Está gente a morrer e nós também 

Está gente a despedir-se sem saber que para 
Sempre 
Este som já passou Este gesto também 
Ninguém se banha duas vezes no mesmo instante 
Tu próprio te despedes de ti próprio 
Não és o mesmo que escreveu o verso atrás 
Já estás diferente neste verso e vais com ele 

Os amantes agarram-se desesperadamente 
Eis como se beijam e mordem e por vezes choram 
Mais do que ninguém eles sabem que estão a 
                               [despedir-se 

A Terra gira e nós também A Terra morre e nós 
Também 
Não é possível parar o turbilhão 
Há um ciclone invisível em cada instante 
Os pássaros voam sobre a própria despedida 
As folhas vão-se e nós 
Também 
Não é vento É movimento fluir do tempo amor e morte 
Agora mesmo e para todo o sempre 
Amen 







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