Com a sabedoria oriental, está em The Development of Local Methods in Ancient Chine (Xangai: Oriental Book Company):
Tu me achas um homem erudito, elegante, instruído, bem educado?
Com certeza, retrucou Zi-gong. Não és?
Confúcio respondeu: Eu consegui encontrar o fio da meada. O método.
Pois então, método, etimologicamente, significa caminho. Très bien. C'est la question. Encontrar o caminho. Nessa busca, o francês Matthieu Ricard, doutor em biologia molecular, acostou-se ao budismo - lembrando que este tem uma dupla dimensão (não necessariamente interligadas): religião e 'filosofia de vida'. Ele garante-nos: é possível treinar a mente para ser feliz. Confira isso na entrevista a seguir, realizada pela Folha de São Paulo. Assim, a felicidade seria uma questão de abrir a 'fechadura' que está em nossa cabeça.
Folha
- Você é apresentado como o homem mais feliz do mundo. O que isso quer dizer?
Matthieu Ricard - (Risos) Isso não quer dizer nada. Trata-se de uma
distorção feita por um jornal britânico a partir de uma pesquisa científica
sobre os efeitos da compaixão, do amor e da bondade no cérebro, da qual
participei, feita pelo neurocientista Richard Davidson, da Universidade de
Wisconsin (EUA).
Nela, vários meditadores experientes tiveram
seus cérebros escaneados durante a meditação e foi mapeada atividade intensa e
muito poderosa nas áreas relacionadas a emoções positivas. O resultado superou
tudo o que já havia sido reportado em neurociência, mas não existe base
científica para dizer quem é a pessoa mais feliz do mundo.
O que é felicidade, então?
Felicidade é bem-estar. Não é busca incessante por sensações prazerosas. Tudo
bem querer sentir prazer, mas é algo efêmero. Felicidade é outro negócio: é
realização, satisfação e florescimento.
Felicidade é consequência de várias
qualidades, entre elas a liberdade interior. Não liberdade para você fazer o
que quiser, mas em relação a pensamentos que escravizam. Obsessões, ganância,
raiva, ciúmes, arrogância.
Depois de 15 anos de pesquisas e encontros
com cientistas, cheguei à conclusão que altruísmo é a mais importante das
qualidades que compõem a felicidade.
Vivemos num mundo em que parece haver
mais individualismo, ganância e corrupção que altruísmo.
A gente subestima enormemente o fato que, na vida cotidiana, há muito mais
gestos de bondade e gentileza que de agressividade ou maldade. Não prestamos
atenção no fato de as pessoas se reunirem nas ruas ou no trabalho sem se
estapear a cada cinco minutos. Achamos normal. Mas se em uma ocasião apenas
dois colegas de trabalho trocarem socos, isso será assunto para o mês todo.
Como podemos ser mais felizes e
altruístas, então?
Se observar o que faz em um dia, vai ver que é gentil na maior parte do tempo.
Um estudo suíço pegou mil pessoas e pediu que
catalogassem suas atitudes: 75% eram ações positivas; outra porção era neutra e
uma fatia mínima era má e antissocial.
Há uma ideia de que somos naturalmente
egoístas e individualistas. Pesquisei mais de 1.600 estudos, e isso não
encontra respaldo.
Como explicar a noção darwinista de
que há competição e conflito pela vida e que apenas os mais aptos sobrevivem?
Isso é Herbert Spencer (1820-1903), a luta de todos contra todos. Isso não é
Darwin, que fala muito mais de cooperação do que de competição. A tendência
mais atual do darwinismo é que, além da óbvia competição, a cooperação foi
crucial na evolução.
Uma pesquisa feita em 35 países perguntou
sobre os dez fatores que mais contribuíam para o bem-estar das pessoas, incluindo
riqueza, que ficou em sexto lugar. Em primeiro ficou "qualidade das
relações sociais", e isso tem a ver com comportamentos altruístas.
É possível treinar o altruísmo? É algo
que deveria ser ensinado nas escolas?
Com certeza! Há estudos com crianças de pré-escola. Elas recebem treinamento
três vezes por semana, por 40 minutos, de atividades de cooperação e meditação.
Após dez semanas, o comportamento se altera e a discriminação com quem é
diferente diminui. A meditação apresentada às crianças é secular. Não há
religião envolvida.
Acabei de voltar de um laboratório de
neurociência nos EUA, no qual estamos estudando mudanças no cérebro daqueles
que praticam meditação. O resultado: 20 minutos diários por um mês já modificam
a estrutura e o funcionamento do cérebro, ativando áreas ligadas a emoções
positivas e o volume das áreas ligadas à aprendizagem e ao controle emocional.
Como você vê a meditação extrapolando
a seara espiritual para ganhar a científica?
É importante desmistificar o conceito de meditação, muitas vezes visto como
algo exótico. Muita gente acha que meditar é esvaziar a mente e relaxar.
Bobagem. A palavra em sânscrito e em tibetano significa "cultivar".
Meditar é cultivar um estado mental. É um
treino. O segredo é praticar. Quem toca um instrumento tem de treinar e treinar
até desenvolver seu potencial. Ninguém espera tocar piano sem treino. Por que
esperar que compaixão, altruísmo, liberdade interior e concentração ocorram
magicamente? Não faz sentido.
O budismo enfatiza muito o treinamento da
mente. E pesquisas feitas com eletroencefalograma e com máquinas de ressonância
magnética estão apontando para os efeitos desse treinamento no cérebro, no
sistema imunológico e na diminuição de doenças como a depressão.
Não há mistério. Treine, de novo e de novo.
Você pode começar com algo fácil, como a concentração em um objeto ou em
sentimentos de amor que tem por uma determinada pessoa. Se o pensamento
desaparece, você o reaviva. Se a mente se distrai, você a traz de volta. Cinco,
dez, vinte minutos diários. Isso é meditação. Quanto mais praticar, mais
significativas serão as mudanças no cérebro e no seu comportamento.
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Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/equilibrioesaude/2015/05/1630092-e-possivel-treinar-o-cerebro-para-ser-feliz-diz-monge-frances-especialista-em-biologia-molecular.shtml
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