"Os
conceitos que temos acerca da coisa mesma são os seguintes: 1º) ou consideramos
a coisa como contingente, isto é, podendo ocorrer ou não; 2º) ou deve ocorrer
necessariamente. Isso quanto à coisa mesma. Com respeito a quem concebe a
coisa, ou deve fazer algo para promover a chegada da coisa, ou bem para
impedi-la.
Desses
conceitos nascem todos esses sentimentos do seguinte modo: se concebemos que
uma coisa que está por vir é boa e pode ocorrer, daí a mente adquire essa forma
que denominamos esperança, e que não
é mais que uma certa espécie de alegria mesclada com um pouco de tristeza. Se,
pelo contrário, julgamos que a coisa que pode ocorrer é má, daí vem à nossa
mente a forma que denominamos medo.
Se
concebermos que a coisa é boa e ocorrerá necessariamente, daí vem à nossa mente
a tranquilidade que denominamos segurança,
e que é uma certa espécie de alegria não mesclada de tristeza, como no caso
da esperança. Porém, se concebemos que a coisa é má e ocorrerá necessariamente,
daí vem à mente o desespero, que não é mais que uma certa espécie de tristeza.
Falamos
[dessas] paixões de maneira afirmativa e dizendo o que é cada uma delas.
Inversamente também podemos defini-las de modo negativo: esperamos que o mal
não venha, tememos que o bem não ocorra, estamos seguros de que o mal não
ocorrerá e nos desesperamos porque o bem não virá.
Jamais
existem segurança ou desespero sem que antes tenha havido esperança e medo. Por
exemplo, se alguém opina ser bom o que ainda tem a esperar, então adquire, em
sua mente, a forma que denominamos esperança, e estando segura de alcançar o
bem suposto, a mente adquire a tranquilidade que denominamos segurança.”
(Espinosa, in Breve Tratado, tradução e notas de
Emanuel Ângelo R. Fragoso e Luís César G. Oliva, 1ª edição, Belo Horizonte:
Autêntica, 2014, págs. 109-110).