O texto aí abaixo é da coluna do jornalista Elio Gaspari, na Folha de São Paulo (edição para assinantes, 22/03/2015). Versa sobre as irresponsabilidades que têm perpassado o ensino superior. No ritmo que vai a toada, faz cada vez mais sentido dizer que muitos passam pela universidade, mas a universidade não passa por eles. O acesso ao ensino superior tem servido para muita coisa, mas, em vezes várias, menos para o estudo e a devida formação das novas gerações, com o efetivo sentido universitário. Tem sido, por exemplo, uma escandalosa fonte de comércio (como se já não bastasse o 'comércio de eventos').
Por Elio Gaspari
O governo está diante de duas encrencas. Pela
amplitude, a maior é a do sistema de financiamento dos estudantes de faculdades
privadas. Pelo valor, é a da empresa Sete Brasil, que fabricaria sondas para a
Petrobras. Ambas foram produto da irresponsabilidade do governo e do
oportunismo de empresários que se associaram em empreendimentos condenados ao
fracasso, certos de que, na hora da conta, a patuleia seria chamada para cobrir
o buraco.
Começando pelo Fies.
Em 2010 o ministro Fernando Haddad mudou o acesso aos financiamentos da
garotada. Baixou os juros, afrouxou as fianças e criou um sistema pelo qual um
estudante que tirasse zero (repetindo, zero) na prova de redação poderia
conseguir o financiamento. Com isso floresceram empresas bilionárias. Qualquer empresário
sério saberia que essa conta não fechava, pois o dinheiro emprestado não
retornaria no volume necessário.
O governo deu-se
conta da encrenca e criou novos critérios, todos razoáveis. Centralizará a
concessão dos empréstimos, dará prioridade às escolas bem avaliadas pelo MEC e
exigirá a nota mínima de 450 pontos do Enem para o acesso ao programa. Quem
tirar zero na redação cai fora. O que em 2010 parecia ser uma solução era um
problema, e o que hoje parece ser um problema é uma solução.
As mudanças terão
duas consequências: quem não tem nota não entra, e quem não oferece ensino de
qualidade não arrecada.
Os interesses que se
atrelaram à bolsa da Viúva apresentam as mudanças do Fies como um prejuízo
social. Falso, elas é que se meteram num prejuízo fiscal. Tanto é assim que,
para manter a clientela, começaram a criar financiamentos laterais com a rede
bancária, onde não se brinca com fiança. Antes das mudanças de 2010 a rede
privada trabalhava num modelo de financiamento privado. Veio o maná do MEC e nele
refastelou-se. Agora, começam a estudar um novo caminho, talvez misto. Ele
existe. Uma estudante de Chicago, filha de um zelador, casou-se com outro negro
da classe média, educado pelos avós. Deram-se bem na vida e diplomaram-se em
Harvard. Michelle e Barack Obama levaram 25 anos para quitar os empréstimos de
US$ 80 mil dólares que tomaram para concluir seus estudos.
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