terça-feira, 31 de março de 2015

A cegueira da pequenez de espírito diante da pequenez humana

Por Luiz Caversan* 

‘Pobreza’ e grandeza de espírito: os espíritos inferiores ressentem-se frequentemente com coisas insignificantes; os espíritos elevados apercebem-se delas, mas não se ressentem minimamente.
(François de La Rouchefocauld) 


Chegaram esses dias pela internet uma sequência de fotos muito emblemáticas sobre o maremoto na Ásia. Diz o e-mail que são imagens inéditas, que registram alguns momentos dramáticos, exatamente quando a fúria da natureza desaba, literalmente, sobre os homens.
Há divergências quanto à autenticidade das fotos; poderiam ser de um outro evento na região, mas não deixam de ter conexão com o que acaba de acontecer.
Principalmente uma dessas fotografias, que é particularmente assustadora. Mostra, em primeiro plano, um grupo de pessoas correndo, algumas delas rindo, como se aquilo fosse mais uma brincadeira de praia, e logo atrás a monstruosa massa de água.
A imagem remeteu imediatamente à fragilidade, à pequenez do ser humano diante da natureza que desde sempre ele, homem minúsculo, tenta domar, controlar, conduzir. Em vão, como sempre se viu.
Na semana passada, uma revista holandesa ocasionou revolta por conta de um artigo em que diz nada menos o seguinte: trata-se, o maremoto de milhares de vítimas, de nada menos que uma punição de Deus. Esse desatino tem sua "lógica", porque, afinal, diz a tradição cristã que nascemos em culpa, desde Adão e devemos louvar, sim, a infinita bondade do criador, mas também temer, sempre e sempre, a sua eventual ira.
Dogmas religiosos à parte, o maremoto, os mais de 150 mil mortos e os outros tantos que virão por conta das doenças e do desamparo que irão se suceder, oferecem mesmo uma grande oportunidade de reflexão.
Sobretudo sobre a transitoriedade de tudo o que nos cerca e sobre a nossa incapacidade de aceitar a condição em que vivemos, seja ela imposta por Deus ou apenas pela inexorabilidade da evolução de nossa espécie nesse planeta lindo e instável.
"Carpe diem", sugere o dito latino, aproveite, desfrute o dia, porque se provavelmente jamais saberemos exatamente de onde viemos, uma certeza a tsunami nos reavivou: iremos, desta para outra, seja ela qual for, a qualquer momento, em situações as mais impensáveis.
Há, portanto, a chance que nos resta, de desfrutar a felicidade de olhar o céu azul e constatar, por exemplo, a beleza do dia, que, sabe-se lá até quando, podemos desfrutar com alegria e paz.
Sim, vale a pena tentar.
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Jornalista e produtor cultural.  

Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/folha/pensata/luizcaversan/ult513u383305.shtml. 


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