Por
Marion Strecker (Pioneira da Internet no Brasil; liderou a equipe
que criou a
FolhaWeb, em julho de 1995)
A
informação seria livre. Todo o saber do mundo seria compartilhado, bem como a
música, o cinema, a literatura e a ciência. O custo seria zero. O espaço seria
infinito. A velocidade, estonteante. A solidariedade e a colaboração seriam os
valores supremos. A criatividade, o único poder verdadeiro. O bem triunfaria
sobre os males do capitalismo. O sistema de representação se tornaria obsoleto.
Todos os seres humanos teriam oportunidades iguais em qualquer lugar do
planeta. Todos seriam empreendedores e inventivos. Todos poderiam se expressar
livremente. Censura, nunca mais. As fronteiras deixariam de existir. As
distâncias se tornariam irrelevantes. O inimaginável seria possível. O sonho,
qualquer sonho, poderia se tornar realidade.
Livre, grátis, inovador, coletivo,
palavras-chave do novo mundo que a internet inaugurou. Por anos esquecemos que
a internet foi uma invenção militar, criada para manter o poder de quem já o
tinha. Por anos fingimos que transformar produtos físicos em produtos virtuais
era algo ecologicamente correto, esquecendo que a fabricação de computadores e
celulares, com a obsolescência embutida em seu DNA, demandam o consumo de
quantidades vexatórias de combustíveis fósseis, de produtos químicos e de água,
sem falar no volume assombroso de lixo não reciclado em que resultam, incluindo
lixo tóxico.
Ninguém imaginou que o poder e o dinheiro se
tornariam tão concentrados em megahipercorporações norte-americanas como o
Google, que iriam destruir para sempre tantas indústrias e atividades em tão
pouco tempo. Ninguém previu que os mesmos Estados Unidos, graças às maravilhas
da internet sempre tão aberta e juvenil, se consolidariam como os maiores
espiões do mundo, humilhando potências como a Alemanha e também o Brasil, impondo
os métodos de sua inteligência militar sobre a população mundial, e guiando ao
arrepio da justiça os bebês engenheiros nota dez em matemática mas ignorantes
completos em matéria de ética, política e em boas maneiras.
Ninguém previu a
febre das notícias inventadas, a civilização de perfis falsos, as enxurradas de
vírus, os arrastões de números de cartão de crédito, a empulhação dos
resultados numéricos falseados por robôs ou gerados por trabalhadores mal pagos
em países do terceiro mundo, o fim da privacidade, o terrorismo eletrônico,
inclusive de Estado.
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Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/
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