quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

Ser Professor agora: Lições dos mestres, a Era da irreverência e a vulgaridade

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Por Boyd Tonkin 
(The Independent) 

Quando a entrevista chega ao fim, George Steiner, 74, vai até a estante e pega dois objetos. O primeiro é um cartão cumprimentando os pais vienenses de Steiner pelo casamento. O cartão traz os nomes "Frau und Dr. Freud". O segundo, um manual de enfermagem, pertencia a um jovem de Praga, "F.Kafka".
Hoje pertence a G. Steiner, graças a um marco precoce na carreira de professor desse humanista incansavelmente eloquente. Os 50 anos dessa carreira motivaram reflexões sobre professores e alunos numa série de palestras que deu em Harvard, publicada como "Lessons of the Masters" (Lições dos Mestres).
Quando Steiner discorre sobre o tema, não se deve esperar uma aula simpática. Em trabalhos como "Linguagem e Silêncio" e "No Castelo de Barba Azul", o pensador, crítico e acadêmico já voou por todo o mundo cultural como uma ave migratória, carregando más notícias.
Embalado pelo legado judaico perdido da Europa Central que tanto Freud quanto Kafka enriqueceram, esse ""filho do tempo do Holocausto" já executou voos espantosos de profecia e polêmica. Explorou a ligação entre a cultura e o barbarismo modernos, a perda de fé do Ocidente não apenas na divindade, mas na própria humanidade, e o aviltamento da linguagem e do aprendizado na sociedade de consumo.
Todas essas forças conspiram, diz ele, para enfraquecer não só as relações entre professores e estudantes, mas também a própria ideia da autoridade. "Vivemos num tempo em que a ideia de respeito por um professor, um mestre, é quase ridícula."
Em lugar do aprender, hoje reina suprema a busca do lucro. "Vivemos sob o fascismo da vulgaridade", troveja Steiner, "que, para resumir, também chamo de berlusconismo."
"Lessons of the Masters" sugere que os grandes mestres atrapalham os esquemas de poder. Os mestres conduzem raios, atuando como vetores do choque, tanto quanto do estímulo. Ele inicia sua jornada com Sócrates e Jesus: "Essas duas mortes terríveis determinaram a história intelectual, moral e psicológica do Ocidente". Em seguida, passa por Dante e santo Agostinho, Nietzsche, o misticismo dos mestres zen, os exageros da correção política e os métodos do treinador de futebol americano Knut Rockne.
Por trás dos exemplos que Steiner oferece há três tipos de relação entre mestre e pupilo: rebelião ou traição por parte do aluno, destruição deste pelo professor e a parceria, "desejosa" num sentido espiritual, como  marca do  aprendizado.
Steiner teme que esses momentos transformadores de comunhão entre aluno e professor desapareçam na chamada "era da irreverência". "Alguma coisa que talvez seja insubstituível está sendo destruída", lamenta. Ele teme, por exemplo, o "receio de chantagem" que assombra os corredores universitários, onde professores homens [na Europa, nos Estados Unidos] se sentem obrigados a manter as portas  [dos seus ambientes] abertas quando conversam com alunas.
Ele acrescenta que pode haver uma crise mais profunda em ação. Hoje em dia, "as ciências humanas sofrem a pressão da dúvida extrema. Elas não conseguiram barrar a barbárie de nosso tempo. Em vista dessa atitude defensiva e do faro aguçado que os jovens têm para [identificar] o que é espúrio e hipócrita, a relação entre mestre e aluno se tornou difícil".
O primeiro mestre foi seu pai. Steiner cresceu sentindo-se à vontade com o francês, o alemão e o inglês. Aprendeu grego aos seis anos para descobrir o que acontecia na "Ilíada". Sentiu pela primeira vez a centelha do professor quando iluminou Joyce para seus colegas estudantes da Universidade de Chicago. "Eu percebi que podia conduzir outras pessoas a apreender o significado."
Para ele, o professor que ensina de maneira honrada confia no aluno para que ele o supere. "Chega um momento em que o discípulo dá adeus. Quando o professor intui: "Este jovem é mais capaz do que eu, vai me ultrapassar". Acredite, essa é a recompensa suprema."

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Tradução de Clara Allain.