domingo, 29 de janeiro de 2017

Corações tristes

Por Eberth Vêncio 

Um brinde aos corações tristes. Amor. Dor. E uma caixa de isopor repleta de corações congelados. Quem vai querer? Preferiria mil vezes ter rimado amor com Morena Flor, mas não deu certo. Erramos por um mundo faminto de respostas. Fazer o quê? São coisas que acontecem. Mistérios que lotam igrejas mantêm a mística, fazem girar moedas. Vocês não fazem ideia do quanto eu queria andar, andar, andar até gastar os pés, as pernas, o quadril, o corpo inteiro e sumir na paisagem derretida feito uma das estátuas de cera de Madame Tussauds.
Ando cheio de tudo isso, de gente vazia, do trânsito parado, do giro dos motores, da náusea, do calor do momento, da frieza nos olhares, dos milhares de estranhos se estranhando nas entranhas da cidade, dos motoristas gesticulando com histeria, homens e mulheres (que vergonha!) enlouquecendo mutuamente com a falta de espaço, com o excesso de pressa, com um tempo perdido rumo ao trabalho, o qual, claro, não volta nunca mais, senão nas decrépitas recordações da velhice. Será melhor perder totalmente a memória, para não ter o que lamentar? Não há novidade alguma em questionar a vida que se leva. Raro mesmo é ter coragem para desmamar do caos. A gente se amarra em tragédias.
Vejo um mundo guinando à estupidez,  arrogante e individualista a cada dia, enquanto esbraveja palavras de ordem com peito aberto: “Eu quero muros!”. Os truculentos nunca se sentiram tão confiantes. Ora, quem estabeleceu essa joça? Tenho sobrevivido aos trumps e barrancos, é verdade. Estou na luta. Quase na lata. Mas estou na luta. Velejo sem leme, solenemente entregue a fiapos de esperança por dias melhores. Eu me arvoro numa fé bisonha, é impreciso confessar. Pior que navegar sem rumo é remar com confiança na direção dos destinos de sempre, sem nunca pestanejar, como se fosse a coisa mais certa a fazer. Quisera pular pela escotilha, fugir da matilha que rosna nos calcanhares desse mundo cão, e ser capitão no meu próprio mar de lágrimas.
Um brinde sincero e condoído aos corações sofridos. Temos os corações tão parecidos. Essa aqui eu escrevi para os que se sentem um tanto fora dos padrões vigentes.

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Fonte: http://www.revistabula.com/