quinta-feira, 31 de março de 2016

Universidade, debates e o fundo do poço


Na escuridão da cegueira, Jorge Luís Borges recorreu ao alemão alles nahe werde fern (‘tudo que é próximo se afasta’), de Goethe, para dizer que, ao entardecer, as coisas que nos são mais próximas já se afastam dos nossos olhos. Vão-nos deixando. Por certo, soava paradoxal e melancólico que o mundo visível se afastasse dos olhos de Borges quando da manifestação crepuscular de uma existência que, pela sua produção espiritual, negava o perecer e o sagrava pela consagração da sua obra. Na vista que desaparecia, Borges conseguia, contudo, manter o equilíbrio de comportamento. Prova de que, mesmo diante das intempéries da cegueira, o exercício da racionalidade pode assegurar a permanência da razoabilidade. Pois bem, difícil mesmo é testemunhar a cegueira da irracionalidade nos não cegos dos olhos, e num local em que, de per si, é a casa da racionalidade, isto é, a universidade.  Imagine o que é um padrão de campanha de eleição reitoral ter como marca o modus operandi das torcidas de futebol, onde, além dos gritos, resolver as “diferenças” no braço não é uma opção descartada. Imagine o que é se programar um debate para o Campus de uma universidade, e a comunidade local desse Campus (professores, estudantes e servidores técnicos) ver-se constrangida por presenças exógenas. Imagine o que é o debate ser suspenso porque a atmosfera que prevalece é a da truculência, e não a do diálogo.  Dessas situações, a dedução logo se apresenta: chegou-se ao fundo do poço pelo exercício da irracionalidade numa instituição que deve ser guardiã da razão e exemplo de civilidade para a sociedade. Lamentável.


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