sexta-feira, 3 de fevereiro de 2017

'O estádio do espelho como formador da função do eu'

Resultado de imagem para Le stade du miroir comme formateur de la fonction du Je: telle qu’elle nous est révélée dans l’expérience psychanalytique


Penso onde não sou; portanto, sou onde não me penso 
(Jacques Lacan) 


Por Hernani Pereira 

Neste texto ['O estádio do espelho como formador da função do eu'], originalmente apresentado como comunicação no XVI Congresso Internacional de Psicanálise, em Zurique, na data de 17 de julho de 1949, Lacan, nascido em 1901, falecido em 1981, oferece a sua visão sobre o tema da formação do eu e de sua função. A sua função, do eu, basicamente entendida, é “proteger” o sujeito, daí que Lacan se utilize da metáfora do campo fortificado e da armadura para referir-se ao eu. Ponto interessante é este em que aparece a fratura entre o eu e o sujeito, uma particularidade da psicanálise desde Freud em que o sujeito não é entendido como equivalente à consciência e, por isto, ao eu. Ao contrário, o eu (embora, como diz Freud, tenha conexões profundas com o inconsciente, é mais facilmente caracterizado pelo atributo da consciência) é entendido como apenas uma "parte" do sujeito (cuja maior e mais expressiva "parte" é inconsciente). Assim, como Lacan já aponta no início de seu texto, a sua perspectiva se opõe a toda a filosofia do cogito. Como se sabe, a filosofia do cogito é, mutatis mutandis, a filosofia da primazia da consciência, de sua centralidade, ou melhor, do egocentrismo. Outro ponto de expressão de uma tal filosofia é o existencialismo, cujo solo fértil é o pensamento francês dos anos 40 e 50 do século XX. Contra tal corrente, Lacan proporá a fase (ou estádio, como amplamente citado) do espelho como formadora da função do eu – título do presente texto. A fase do espelho demarca o delineamento da função do eu através da identificação, isto é, da modificação do sujeito através da incorporação de imagens; assim a fase própria funciona como ponto de transição entre o corpo fragmentado e a “armadura”, quer dizer, o eu rígido e estático, aquele que já tem uma imagem. Lacan chama esta função do eu de alienante: trata-se de uma alienação do sujeito, de um afastamento após a fundação do “campo fortificado”, da inauguração de uma vivência para esse “pouco de realidade” conclamado e que, por sua vez, delineia o sujeito à determinação social e ao relacionamento com o outro. Este eu antes de sua determinação social, conforme nos diz Lacan, por ser ainda mais primitivo, talvez devesse ser registrado, na categoria freudiana, como eu-ideal. Fundamental e indispensável para a compreensão de um pensamento anticartesiano e de uma psicanálise rigorosa, este é o ganho deste texto. Contudo, vale dizer que talvez não seja possível entendê-lo sem uma iniciação à terminologia lacaniana.

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Fonte: http://simeioseis-kai-scholia.blogspot.com.br/