sábado, 13 de maio de 2017

Do método, do caminho: para não desperdiçar a mente

Os mortais são dominados por uma curiosidade tão cega que, muitas vezes, envenenam o espírito por caminhos desconhecidos, sem qualquer esperança razoável, mas unicamente para se arriscarem a encontrar o que procuram: é como se alguém, incendiado pelo desejo tão estúpido de encontrar um tesouro, vagueasse sem cessar pelas praças públicas para ver se, casualmente, encontrava algum perdido por um transeunte.  Não nego que tenham, por vezes, muita sorte nos seus caminhos errantes e encontrem alguma verdade; contudo, não estou de acordo que sejam mais competentes, mas apenas mais afortunados. Ora, vale mais nunca pensar em procurar a verdade de alguma coisa que fazê-lo sem método: é certíssimo, pois, que os estudos feitos desordenadamente e as meditações confusas obscurecem a luz natural e cegam os espíritos. Quem se acostuma a andar assim nas trevas enfraquece de tal modo a acuidade do olhar que, depois, não pode suportar a luz do pleno dia. 
Entendo por método regras certas que permitem a quem exatamente as observar nunca tomar por verdadeiro algo de falso, e sem desperdiçar inutilmente nenhum esforço da mente, mas, aumentando sempre gradualmente o saber, atingir o conhecimento de tudo o que será capaz de saber. 

(René Descartes, in Regras para a Direção do Espírito