O historiador/cientista político Michel Zaidan (UFPE) é um analista social de verve afiada. Aborda, com agudeza analítica e objetividade, fenômenos complexos. E não recusa hard subjects - o que lhe tem valido reações espinhosas, como a do governador pernambucano Paulo Câmara, consubstanciada na ardilosa tentativa de o levar à prisão. Para quem conhece o percurso de Zaidan, sabe que isso, no entanto, não o intimida, pois não recusa as boas causas e o bom combate. Nesse sentido, ele é emblemático no texto aí abaixo, a respeito de como o também pernambucano Mendonça Filho se tornou Ministro da Educação, em decorrência do afastamento da presidente Dilma. É um texto a ser lido por professores, estudantes e por todos os que se preocupam com os rumos da educação e da cidadania no país.
Por Michel Zaidan Filho
Permaneci
esse tempo todo intrigado com o modo como foi indicado o deputado pernambucano
José Mendonça Filho (o "Mendoncinha") para o Ministério da Educação.
No
início, pensei que fosse uma retribuição pelo seu ingente trabalho
conspiratório contra a Presidente da República, mesmo desmerecendo com isso a
importância da Educação.
Conheço
o deputado pernambucano há vários anos, mas nunca tinha visto nele nenhuma
vocação especial para tratar de políticas públicas para a Educação.
"Mendoncinha" é natural de Belo Jardim (PE) e filho de um ex-deputado
do PFL, José Mendo Bezerra. É casado com a filha do genro do coronel Chico
Heráclito, de Limoeiro, e do senador biônico Marcos Vinícius Vilaça, que apesar
de posar de literato e intelectual, nunca se referiu ao genro, de maneira
intelectualmente elogiosa.
Há
pouco, descobri através de uma das minhas leitoras que ele tinha sido professor
dela. E ótimo professor! Fiquei matutando que disciplina o colega de Belo
Jardim teria lecionado. Depois descobri que ele tinha sido presidente de uma
Associação de Avicultores. Daí passei a achar que ele tivesse conhecimentos de
galináceos e seus correlatos.
O
colega foi duas vezes à Pós-graduação de Ciência Política, a meu convite. Mas
foi "puxado" pelo seu tio, o saudoso empresário Edson Moura Mororó,
de quem me considerei amigo até o dia de sua morte. Foi Dr. Edson quem rebocou
o sobrinho (como faria com o ex-senador Marco Maciel) a atender o meu convite.
Em nenhuma das vezes, o deputado do DEM (e conspirador) demonstrou dotes
oratórios, intelectuais ou mesmo políticos; chegou a mostrar nervosismo e
derramar uma xícara de café. Depois disso, Mendoncinha não voltaria a aceitar
nenhum convite para ir ao Programa, apesar das promessas...
Qual não foi, então, a minha surpresa quando soube de sua nomeação pelo
usurpador interino para Ministro da Educação! E, por extensão, da
Cultura. Fiquei pensando: cultura avícola? Ou quem sabe lupina? Agora vem o esclarecimento que foi o
empresário dos serviços educacionais, Janguiê Diniz, dono da Faculdade Maurício
de Nassau, quem bancou a indicação do nome de José Mendonça Filho para o
Ministério da Educação!
Mais
ainda, o empresário educacional conseguiu também emplacar o nome do economista
Maurício Romão para a Secretaria de regulação e supervisão, do MEC, órgão
responsável pela licença e autorização para funcionamento de novos cursos.
Vocês imaginem como é colocar uma raposa no galinheiro e avaliem o resultado
dessa astuta operação: o dono da faculdade privada interfere diretamente no
órgão responsável pela fiscalização do seu negócio!
Não
foi à-toa que o ministro interino [Mendonça Filho] entrou com uma ação no STF
para derrubar as cotas dos estudantes nos cursos superiores públicos e agora se
saiu com a ideia “extraordinária” de autorizar a cobrança de mensalidades nas
IESs públicas. Dissipou-se o mistério da indicação do deputado de Belo Jardim:
representante de interesses privatistas no Ministério da Educação.
Tal
como o da saúde, o deputado Ricardo Barros, quer acabar ou diminuir o SUS,
atendendo ao pedido das empresas privadas de Saúde. E o das cidades, o menudo
Bruno Araújo, pretende acabar ou diminuir com o programa de habitação
popular. E o do Desenvolvimento Social, ansioso em acabar ou diminuir as
políticas compensatórias de redistribuição de renda. E o das Relações
Exteriores, acabar com a política externa multilateral, sul-sul, do governo
LULA, para voltar à subserviência do Brasil aos interesses norte-americanos.
Esse ministério é o ministério da privatização grosseira, brutal, antipopular e
antinacional. Perguntaram-me porque tantos pernambucanos estão nesse ministério
do temerário amigo de Eduardo Cunha, o desventuroso. A explicação é uma só:
troca-troca, compra e venda, fisiologismo puro. Nunca ficou tão clara e
revelada a vocação desses políticos provincianos em vender o apoio - para
causas tão deprimentes - em troca de alguma visibilidade, de alguma
notabilidade, mesmo às custas de um golpe e da destruição das políticas
redistributivas.
Não se preocupam com nada, nem com ninguém. Só com os cargos e os dividendos políticos que eles podem trazer. Lamentável essa crise de representação parlamentar. Ela só contribui para aumentar a descrença do cidadão comum nos políticos e para pavimentar a estrada para os aventureiros de toda estirpe.
Não se preocupam com nada, nem com ninguém. Só com os cargos e os dividendos políticos que eles podem trazer. Lamentável essa crise de representação parlamentar. Ela só contribui para aumentar a descrença do cidadão comum nos políticos e para pavimentar a estrada para os aventureiros de toda estirpe.
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