segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

'Seta à esquerda, caminho à direita'



Por Ricardo Melo

Parece paradoxal, mas quanto mais se aprofunda a investigação sobre a Petrobras, mais o PT ganha músculos para tentar se manter vivo. Resta saber se ele quer --e pode-- seguir este caminho.
Seis de fevereiro de 2015. Neste dia, praticamente todos os jornais do país estamparam na manchete que o PT teria recebido US$ 200 milhões de propina em dez anos. A afirmação vinha do ex-gerente da estatal Pedro Barusco, o showman da moda na Lava Jato, My Way ou outro nome qualquer.
Conforme somos informados, o depoimento de Barusco, um doente terminal, foi colhido em 20 de novembro de 2014. Por que veio a público apenas agora cabe à turma do juiz Sérgio Moro explicar.
O mais intrigante não é isso. Nas páginas internas dos jornais, a salvo as manchetes, deparamos com outras declarações de Barusco. "Afirma que começou a receber propina em 1997 ou 1998 da empresa holandesa SBM, enquanto ocupava cargo de gerente de tecnologia de instalações, no âmbito da diretoria de Exploração e Produção (...) Sendo uma iniciativa que surgiu de ambos os lados e se tornou sistemática no segundo contrato (...) firmado entre a SBM e a Petrobras no ano 2000." (Folha, pág. A8, 6/2).
Barusco nada mais faz do que afirmar: o esquema da Petrobras é velho de guerra. Aliás, foi facilitado por uma lei de 1998. "Esse modelo de concorrência passou a ser usado a partir de 1998, após o fim do monopólio do petróleo, quando um decreto livrou a estatal da lei de licitações que rege o setor público.
A intenção era dar mais agilidade à companhia para enfrentar concorrentes. Uma das inovações foi a licitação por convite, na qual a Petrobras não é obrigada a divulgar edital nem a aceitar propostas de qualquer interessado. Ela decide quem pode se candidatar. Depoimentos das delações premiadas de Pedro Barusco, ex-gerente executivo de Engenharia da Petrobras, e de Augusto Mendonça, executivo da Setal, revelados na semana passada, apontam que o uso desse tipo de licitação fortaleceu o cartel que direcionava licitações e superfaturava contratos, segundo as investigações". ("O Globo", 8/2).
Nem é preciso um calendário para saber quem governava o país nos momentos citados por Barusco. De tudo o que ele supostamente falou, descontando os interesses na delação premiada, fica a evidência de que a Petrobras sempre foi alvo de um esquema combinando cobiça do grande empresariado e os políticos/executivos de turno. A roda da fortuna, como lembra a reportagem acima, foi azeitada em 1998. O PT assumiu o governo em 2002...
Nada disso isenta o partido no poder de acusações que, se comprovadas, merecem uma justa punição nos tribunais. Situam, no entanto, a extensão dos delitos pelo tempo e seus personagens.
O que está em questão, quanto mais o juiz Moro extravasa na cenografia, é a relação promíscua histórica entre os donos do dinheiro e o aparelho estatal. O PT tem responsabilidade pela falta de coragem, ou vontade, de romper com este círculo vicioso. Ao mesmo tempo, as provas de que o esquema envolve "todo o mundo" mantêm Dilma acima da linha d'água.
Por quanto tempo? Não há resposta para esta pergunta. Mas de nada adiantam discursos inflamados de Lula convocando militantes a reagir enquanto o governo que ele defende, desde a reeleição de 2014, só tem feito atacar conquistas do povo humilde. Seta à esquerda e rumo à direita: eis uma mistura que não costuma dar certo.

 -----------------
Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/poder/207551-seta-a-esquerda-caminho-a-direita.shtml

Nenhum comentário:

Postar um comentário