Existe no silêncio uma tão profunda sabedoria que, às vezes, ele se
transforma na mais perfeita resposta (Fernando Pessoa)
Por Israel Mazzacorati*
Não conseguimos mais viver sem barulho!
Às vezes, somos obrigados a ouvir o barulho dos
outros. É o caso incômodo de uma festa na casa do vizinho que não nos deixa
dormir. O som alto, a falação, as risadas, os gritos... tudo contribui para uma
noite de estresse profundo. Há também os barulhos do dia a dia: buzinas,
veículos e conversas alheias, que se somam aos barulhos que procuramos, tais
como a TV, música e internet. Estamos o tempo todo conversando e processando
informações, mesmo quando estamos sozinhos e achamos que estamos em silêncio.
O silêncio perdeu sua importância no mundo agitado,
apressado e barulhento em que vivemos. Seria a morte do silêncio um sinal de
progresso humano? Creio que não. O silêncio tem o poder de dizer coisas que não
podem ser expressadas num discurso. William Barclay nos dá alguns exemplos:
“Temos o silêncio de admiração, quando não se encontram palavras
para dizer. Temos o silêncio de desprezo, quando ao invés de
responder o protesto de alguém, o ouvinte o deixa desdenhosamente sem resposta.
Temos o silêncio do medo, quando o temor interior, a covardia da
alma impede o ouvinte de responder aquilo que ele sabe que deveria dizer. Temos
o silêncio do coração dolorido, quando uma pessoa é duramente
ofendida e ferida e não fica querendo protestar e rejeitar as palavras ditas
contra si, mas silenciosamente sente a sua dor. E, temos o silêncio da
tragédia, quando não há nada o que dizer diante das deslavadas mentiras,
das incompreensíveis acusações e da antevisão de um final terrível.”
Esses exemplos mostram como o silêncio tem o seu
lugar nas relações humanas. No entanto, será que o silêncio tem uma dimensão
mais profunda? Para algumas religiões do passado, os brâmanes, por exemplo, o
ápice da manifestação da divindade se dava através do silêncio, quando as
pessoas se conscientizavam do vazio do discurso. Tradições cristãs também
cultivaram a prática do silêncio como uma valiosa disciplina espiritual,
através da qual nos silenciamos para ouvir Deus falar. Em nossos dias, quando
conscientes do valor do silêncio, tentamos colocá-lo em prática. Quase que como
uma chave automática, a nossa mente é tomada por um turbilhão de pensamentos,
dentre os quais há aquele que tenta nos convencer de que ficar em silêncio é
perda de tempo.
É por isso que o silêncio é uma disciplina
espiritual, pois requer esforço e persistência. Não conseguimos desfrutar dos
benefícios do silêncio nas primeiras tentativas, mas com o tempo vamos colhendo
seus frutos. Aos poucos, vamos aprendendo o valor de cada palavra pronunciada,
e, com isso, nos tornamos mais “econômicos” ao falar. Ou seja, o silêncio nos
ajuda a compreender que palavras podem ser apenas palavras, jogadas ao ar e sem
sentido. O silêncio nos ensina a ouvir mais e falar menos, e, ao falar, se ater
ao necessário, evitando, assim, as conversas fiadas e fofocas. O silêncio nos
ensina o respeito pelo próximo, quando ao invés de silenciar as palavras do
outro com os nossos pensamentos, aprendemos a ouvi-las com atenção.
Se você está pensando agora naqueles momentos em
que você prejudicou alguém, ou a si mesmo, por falar demais, então é hora de
começar a descobrir a sabedoria no silêncio.
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* Doutorando em Estudos Clássicos pela Universidade de Coimbra/Portugal.
Fonte: https://www.blogger.com/blogger.g?blogID=5084853060023085017#editor/target=post;postID=1120935764001075773
Belo texto! Adoro o silêncio, acrédito que é um momento de reflexão e encontro interior.
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