sábado, 14 de fevereiro de 2015

A sabedoria do silêncio

 Existe no silêncio uma tão profunda sabedoria que, às vezes, ele se transforma na mais perfeita resposta  (Fernando Pessoa)

Por Israel Mazzacorati*

Não conseguimos mais viver sem barulho!
Às vezes, somos obrigados a ouvir o barulho dos outros. É o caso incômodo de uma festa na casa do vizinho que não nos deixa dormir. O som alto, a falação, as risadas, os gritos... tudo contribui para uma noite de estresse profundo. Há também os barulhos do dia a dia: buzinas, veículos e conversas alheias, que se somam aos barulhos que procuramos, tais como a TV, música e internet. Estamos o tempo todo conversando e processando informações, mesmo quando estamos sozinhos e achamos que estamos em silêncio.
O silêncio perdeu sua importância no mundo agitado, apressado e barulhento em que vivemos. Seria a morte do silêncio um sinal de progresso humano? Creio que não. O silêncio tem o poder de dizer coisas que não podem ser expressadas num discurso. William Barclay nos dá alguns exemplos: “Temos o silêncio de admiração, quando não se encontram palavras para dizer. Temos o silêncio de desprezo, quando ao invés de responder o protesto de alguém, o ouvinte o deixa desdenhosamente sem resposta. Temos o silêncio do medo, quando o temor interior, a covardia da alma impede o ouvinte de responder aquilo que ele sabe que deveria dizer. Temos o silêncio do coração dolorido, quan­do uma pessoa é duramente ofendida e ferida e não fica querendo protestar e rejeitar as palavras ditas contra si, mas silenciosamente sente a sua dor. E, temos o silêncio da tragédia, quando não há nada o que dizer diante das deslavadas mentiras, das incompreensíveis acusações e da antevisão de um final terrível.”
Esses exemplos mostram como o silêncio tem o seu lugar nas relações humanas. No entanto, será que o silêncio tem uma dimensão mais profunda? Para algumas religiões do passado, os brâmanes, por exemplo, o ápice da manifestação da divindade se dava através do silêncio, quando as pessoas se conscientizavam do vazio do discurso. Tradições cristãs também cultivaram a prática do silêncio como uma valiosa disciplina espiritual, através da qual nos silenciamos para ouvir Deus falar. Em nossos dias, quando conscientes do valor do silêncio, tentamos colocá-lo em prática. Quase que como uma chave automática, a nossa mente é tomada por um turbilhão de pensamentos, dentre os quais há aquele que tenta nos convencer de que ficar em silêncio é perda de tempo.
É por isso que o silêncio é uma disciplina espiritual, pois requer esforço e persistência. Não conseguimos desfrutar dos benefícios do silêncio nas primeiras tentativas, mas com o tempo vamos colhendo seus frutos. Aos poucos, vamos aprendendo o valor de cada palavra pronunciada, e, com isso, nos tornamos mais “econômicos” ao falar. Ou seja, o silêncio nos ajuda a compreender que palavras podem ser apenas palavras, jogadas ao ar e sem sentido. O silêncio nos ensina a ouvir mais e falar menos, e, ao falar, se ater ao necessário, evitando, assim, as conversas fiadas e fofocas. O silêncio nos ensina o respeito pelo próximo, quando ao invés de silenciar as palavras do outro com os nossos pensamentos, aprendemos a ouvi-las com atenção.
Se você está pensando agora naqueles momentos em que você prejudicou alguém, ou a si mesmo, por falar demais, então é hora de começar a descobrir a sabedoria no silêncio.
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* Doutorando em Estudos Clássicos pela Universidade de Coimbra/Portugal.  

Fonte: https://www.blogger.com/blogger.g?blogID=5084853060023085017#editor/target=post;postID=1120935764001075773



Um comentário:

  1. Belo texto! Adoro o silêncio, acrédito que é um momento de reflexão e encontro interior.

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