sábado, 28 de fevereiro de 2015

O planeta de vaidades e o 'Pálido Ponto Azul'

O  vídeo aí abaixo é sobre o que foi enviado à terra pela sonda Voyager 1, em 1990. Em função disso, o escritor e cientista estadunidense Carl Sagan escreveu o livro 'Pálido Ponto Azul', em 1994. Evidencia a necessidade de conscientização sobre onde estamos e sobre tantas outras coisas mais! 


"A espaçonave estava bem longe de casa. Eu pensei que seria uma boa ideia, logo depois de Saturno, fazer ela dar uma última olhada em direção de casa.
De saturno, a Terra apareceria muito pequena para a Voyager apanhar qualquer detalhe, nosso planeta seria apenas um ponto de luz, um “pixel” solitário, dificilmente distinguível de muitos outros pontos de luz que a Voyager avistaria: Planetas vizinhos, sóis distantes. Mas justamente por causa dessa imprecisão de nosso mundo assim revelado valeria a pena ter tal fotografia.
Já havia sido bem entendido por cientistas e filósofos da antiguidade clássica, que a Terra era um mero ponto de luz em um vasto cosmos circundante, mas ninguém jamais a tinha visto assim. Aqui estava nossa primeira chance, e talvez a nossa última nas próximas décadas.
Então, aqui está – um mosaico quadriculado estendido em cima dos planetas, e um fundo pontilhado de estrelas distantes. Por causa do reflexo da luz do sol na espaçonave, a Terra parece estar apoiada em um raio de sol. Como se houvesse alguma importância especial para esse pequeno mundo, mas é apenas um acidente de geometria e ótica. Não há nenhum sinal de humanos nessa foto. Nem nossas modificações da superfície da Terra, nem nossas máquinas, nem nós mesmos. Desse ponto de vista, nossa obsessão com nacionalismo não aparece em evidencia. Nós somos muito pequenos. Na escala dos mundos, humanos são irrelevantes, uma fina película de vida num obscuro e solitário torrão de rocha e metal.
Considere novamente esse ponto. É aqui. É nosso lar. Somos nós. Nele, todos que você ama, todos que você conhece, todos de quem você já ouviu falar, todo ser humano que já existiu, viveram suas vidas. A totalidade de nossas alegrias e sofrimentos, milhares de religiões, ideologias e doutrinas econômicas, cada caçador e saqueador, cada herói e covarde, cada criador e destruidor da civilização, cada rei e plebeu, cada casal apaixonado, cada mãe e pai, cada criança esperançosa, inventores e exploradores, cada educador, cada político corrupto, cada “superstar”, cada “lidere supremo”, cada santo e pecador na história da nossa espécie viveu ali, em um grão de poeira suspenso em um raio de sol.
A Terra é um palco muito pequeno em uma imensa arena cósmica. Pense nas infindáveis crueldades infringidas pelos habitantes de um canto desse pixel, nos quase imperceptíveis habitantes de um outro canto, o quão frequentemente seus mal-entendidos, o quanto sua ânsia por se matarem, e o quão fervorosamente eles se odeiam. Pense nos rios de sangue derramados por todos aqueles generais e imperadores, para que, em sua gloria e triunfo, eles pudessem se tornar os mestres momentâneos de uma fração de um ponto. Nossas atitudes, nossa imaginária auto-importância, a ilusão de que temos uma posição privilegiada no Universo, é desafiada por esse pálido ponto de luz.
Nosso planeta é um espécime solitário na grande e envolvente escuridão cósmica. Na nossa obscuridade, em toda essa vastidão, não há nenhum indício que ajuda possa vir de outro lugar para nos salvar de nós mesmos. A Terra é o único mundo conhecido até agora que sustenta vida. Não há lugar nenhum, pelo menos no futuro próximo, no qual nossa espécie possa migrar. Visitar, talvez, se estabelecer, ainda não. Goste ou não, por enquanto, a terra é onde estamos estabelecidos.
Foi dito que a astronomia é uma experiência que traz humildade e constrói o caráter. Talvez, não haja melhor demonstração das tolices e vaidades humanas que essa imagem distante do nosso pequeno mundo. Ela enfatiza nossa responsabilidade de tratarmos melhor uns aos outros, e de preservar e estimar o único lar que nós conhecemos… o pálido ponto azul." (Carl Sagan) 
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Fonte: http://www.contioutra.com/

Mestrado em Educação

Encontram-se abertas as inscrições para o Mestrado em Educação da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN)/Campus Central/Mossoró - até o dia 09 de abril/2015. O Mestrado da UERN é possivelmente um dos únicos do país que tem como Área de Concentração a relação entre Educação e Contextos Locais, com duas Linhas de Pesquisa: 1) Políticas e Gestão da Educação; 2) Formação Humana e Desenvolvimento Profissional Docente. Pela relevância da sua perspectiva temática/acadêmica, mesmo sendo Professor da UFPB, estou vinculado ao corpo docente do Mestrado e, nessa condição, sou testemunha dos significativos debates que nele têm ocorrido a respeito da questão educacional, com foco na relação entre o global e o local. Quem estiver apto, anime-se a fazer a seleção. Mais informações, aqui: http://www.uern.br/servico.asp?item=noticia&notid=7742

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

As pessoas, por Cave


As pessoas, segundo Nick Cave, em performance serena, num show na Polônia - People ain't good. 





'Tempos muito estranhos'

Resultado de imagem para tempos muito estranhos

"Grandes mentes discutem ideias; mentes medianas discutem eventos (fatos); mentes pequenas discutem pessoas." É Eleonor Roosevelt, caro leitor, a autora dessa frase, companheira (ou, se quiser, esposa - sim, há diferença) do ex-Presidente estadunidense Franklin Roosevelt, que, da Casa Branca, junto com a Inglaterra e a então União Soviética, foi um dos responsáveis por comandar a derrota da insanidade nazista. Sobre esses tempos da Segunda Guerra, Doris Kearns Goodwin produziu o No Ordinary Times, que no Brasil ganhou a tradução de 'Tempos Muito Estranhos'. Eleonor é uma das personagens centrais do livro, livro que se viu envolvido em uma série de polêmicas, dentre as quais a originalidade de algumas partes do texto. Mas terá seu valor. Há de fato 'tempos muito estranhos', que realmente nos fazem lembrar que: grandes mentes discutem ideias; mentes medianas discutem fatos; mentes pequenas discutem (falam de/sobre) pessoas. 


quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

'Pequeno perfil de um cidadão comum - que a terra lhe seja leve'

Quem melhor define, em verso e música, o nosso desigual, injusto e 'selvagem' cotidiano urbano? Chico Buarque, Gilberto Gil? Por certo, eles colocam o cenário em perspectiva. Mas, da minha parte, caro leitor, quem melhor fez isso foi o cearense Belchior, embora, talvez, não reconhecido. Ainda mais agora, com, digamos, as suas "novas opções existenciais". Por onde andará o rapaz latino-americano? Pode-se dizer que, durante muito tempo, em tempos atrás, a sua música foi companhia para jovens solitários (românticos e revolucionários, poder-se-ia acrescentar), embebidos de existência, vendo o céu como limite... Faz falta! Sim, foi ele quem melhor retratou, em música e poesia, o nosso desigual, injusto e 'selvagem' cotidiano urbano. Confira isso logo aí, em 'Pequeno perfil de um cidadão comum'. 


quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Silêncio, a música do silencio

Do sítio francês Zones Subversives - Le Printemps mondial vient, um texto erudito e de bom gosto cultural.
John Cage et la musique du silence
Kyle Gann

Le musicologue Kyle Gann se penche sur l’inventivité de John Cage. Ce compositeur se distingue par son attention accordée au silence. Le livre No Silence. 4’33’’ de John Cage permet de découvrir un courant musical et artistique particulièrement original et transgressif.
« Cage considère que le silence fait partie intégrante d’une pièce musicale, et il lui accorde une importance égale à celle des notes jouées », indique Kyle Gann. Surtout, le silence n’est jamais total mais permet d’intensifier l’écoute. Kyle Gann étudie surtout les compositeurs les plus novateurs comme La Monte Young. Ce courant musical s’inscrit dans le sillage de John Cage, muséifié par l’université et l’académisme, mais qui peut raviver sa charge subversive. La composition 4’33’’ se contente de proposer un moment de silence pendant un concert.                                       

 

La musique de John Cage


Loin d’un silence total, la composition de John Cage permet surtout de se pencher plus attentivement sur les bruits du quotidien et d’affiner sa sensibilité musicale « Ce qu’ils ont pris pour du silence, parce qu’ils ne savent pas écouter, était rempli de bruits au hasard. On entendait un vent léger dehors pendant le premier mouvement. Pendant le deuxième, des gouttes de pluie se sont mises à danser sur le toit, et pendant le troisième ce sont les gens eux-mêmes qui ont produit toutes sortes de sons intéressants en parlant ou en s’en allant », décrit John Cage. Mais cette œuvre musicale, qui n’est directement produite par le compositeur, est perçue comme une véritable provocation contre les codes académiques de la musique.
Une autre composition propose différentes sonorités du quotidien, comme « souffler dans l’appeau à canard à l’intérieur d’un récipient rempli d’eau, battre et distribuer les cartes à jouer, allumer la radio, coincer des objets entre les cordes d’un piano pour en altérer le son, donner l’alerte au sifflet », décrit Kyle Gann. Cette composition se rapproche des pièces de théâtre proposées par le mouvement Dadaau début du XXe siècle. Mais elle se déroule devant un public sophistiqué avec des bourgeois qui se veulent amateurs de musique. Une autre œuvre se compose de sons bizarres qui proviennent de quelques cordes d’un piano sans se servir du clavier. John Cage est alors perçu comme un provocateur, avant de devenir l’icône incontournable de la musique contemporaine. Il invente également le piano préparé, entre les cordes duquel on insère des boulons, des vis, des gommes, des morceaux de feutre pour altérer le timbre et la hauteur. Le piano se transforme en orchestre de percussions qui peut être joué par une personne seule.

La composition silencieuse de John Cage, souvent considérée comme un canular destiné à tromper le public, se rapproche de la philosophie zen. « Elle exigeait une nouvelle approche de l’écoute et, peut-être, une nouvelle compréhension de la musique elle-même, un brouillage des frontières conventionnelles entre l’art et la vie », observe Kyle Gann. John Cage est même souvent perçu comme un arnaqueur. Il vit pourtant dans la pauvreté et ne touche aucun revenu de ses compositions, qu’il crée simplement pour le plaisir. Son concert silencieux, certes payant, s’inscrit dans le cadre d’une soirée de charité. John Cage n’a donc pas touché un centime à l’issue du concert. Même si le compositeur devient célèbre durant les années 1960 et qu’il peut toucher des revenus de ses œuvres, le geste initial de sa création n’est pas motivé par l’argent.
Le concert silencieux permet de libérer le son de la volonté des compositeurs. Le public devient actif et se laisse guider par ses désirs et sa sensibilité plutôt que par une musique imposée. « J’espérais permettre à d’autres personnes de sentir que les sons dans leur environnement constituent une musique qui est plus intéressante que la musique qu’ils entendraient s’ils allaient dans une salle de concert », précise John Cage. Cette démarche se rapproche de Dada qui attaque la culture académique pour permettre au public de sortir de la passivité et exprimer sa propre sensibilité et créativité.

 

 

Les origines d’une démarche créative


John Cage semble influencé par plusieurs artistes. Erik Satie, proche du mouvement Dada en 1919, invente une musique d’ameublement. Une sonorité d’ambiance doit permettre de meubler le silence et de s’harmoniser avec les bruits du quotidien, comme ceux des couverts. Cette démarche semble à l’envers de celle de 4’33 : « au lieu de ne rien jouer et de demander aux gens d’écouter des sons environnementaux, Satie jouait de la musique comme d’un son environnemental, et demandait – en vain – aux gens de ne pas l’écouter ! », observe Kyle Gann.
Luigi Russolo écrit L’Art des bruits. Il utilise des instruments pour créer des sonorités qui se rapprochent des bruits du quotidien. Le tonnerre, le vent, la pluie ou le bruissement des arbres révèlent une importante musicalité. « L’étude continue et attentive des bruits peut donc révéler des jouissances nouvelles, des émotions profondes », souligne Luigi Russolo. L’artiste Marcel Duchamp s’appuie sur la spontanéité et des processus aléatoires. Ses œuvres se composent d’objets et de matériaux du quotidien agencés dans un dispositif artistique. « Duchamp a libéré l’esprit de l’oeil, cependant que Cage a libéré nos oreilles de l’esprit », résume Morton Feldman.
Ananda K. Coomaraswamy permet de découvrir l’histoire de l’art asiatique, largement méconnue et dévalorisée en Occident. « Coomaraswamy rejette toute distinction entre les beaux-arts et les arts appliqués et il critique durement la culture muséale qui sépare les oeuvres d’art de la vie ordinaire », souligne Kyle Gann. Il refuse également la personnalisation et la distinction entre ceux qui sont artistes et ceux qui ne le sont pas. Daisetz Teitaro Suzuki, écrivain japonais, introduit les concepts du zen dans la société américaine. Il traduit les écrits spirituels d’Orient. Cette philosophie influence John Cage avec une création qui questionne et qui permet de décloisonner et de sortir des enfermements individuels.

Ce morceau de silence peut permettre de rompre avec un environnement sonore saturé de bruits et de musiques fatigantes. Même au travail les salariés doivent souvent supporter une musique permanente censée les rendre plus productifs. Le silence favorise également le zazen qui consiste à s’asseoir pour méditer. « Si vous pouvez accorder au bruissement du vent dans les feuilles des chênes ou au battement des pales du ventilateur la même attention que celle que vous alliez accorder aux mélodies du pianiste, alors par moments, vous pouvez prendre conscience que la division que vous établissez habituellement entre l’art et la vie, entre les belles choses et les choses ordinaires, est artificielle », analyse Kyle Gann.

 

Une influence musicale et artistique


La démarche de John Cage influence d’autres artistes. Parmi ceux qui suivent son cours intitulé « The Composition of Experimental Music » figurent certains participants au mouvement Fluxus comme George Brecht ou Dick Higgins. Ces artistes « formeraient dans les années 1960 le coeur du mouvement Fluxus, un groupe néo-dada dont l’art conceptuel faisait peu de cas des barrières entre la poésie, la musique, l’art visuel, le théâtre et les happenings », décrit Kyle Gann. Fluxus s’amuse à créer de la musique à partir des objets du quotidien. Les concerts se confondent souvent avec du théâtre. L’art n’est plus séparé de la vie et la créativité peut surgir du quotidien. John Cage ouvre alors de nouvelles possibilités artistiques. « La popularité de 4’33” a dissous les frontières, qui traditionnellement allaient de soi, d’une pièce musicale ou d’une œuvre d’art : le “cadre” pouvait désormais être déplacé vers n’importe quelle partie de la vie elle-même, et tous les phénomènes, mêmes les plus banals ou les plus rares, seraient considérés comme de l’art », analyse Kyle Gann. Fluxus propose des instructions qui se résument à quelques mots pour guider la créativité.
La Monte Young invente une musique ludique qui brise la séparation entre l’artiste et le public. « Par exemple, La Monte Young écrivit des pièces dans lesquelles le public était informé que la performance allait durer un certain temps, et que les auditeurs pouvaient faire tout ce qu’ils voulaient pendant cette durée, mais aussi des performances où des papillons volaient dans la salle ou, plus surréalistes encore, dans lesquelles on donnait à un piano une botte de foin à manger et un seau d’eau à boire », décrit Kyle Gann. La musique ne se réduit pas à une partition conventionnelle selon La Monte Young mais s’étend à toute chose que quelqu’un écoute. Tous les sons au cours d’une performance deviennent imaginés comme de potentiels phénomènes musicaux.
La musique pop s’empare également de la démarche de John Cage. Des artistes de hip hop introduisent des bandes de silence dans leurs morceaux. Une sonnerie de portable entièrement silencieuse est même commercialisée. « Sa sonnerie silencieuse, distribuée gratuitement grâce à un accord avec Start Mobile, est destinée à apporter un peu de paix dans la vie des millions d’utilisateurs de téléphones portables, ainsi qu’à ceux qui sont à côté d’eux », développe le communiqué de presse. 4’33’’ dépasse la sphère ésotérique de l’avant-garde artistique pour devenir célèbre auprès d’un large public qui ignore son contexte.

La démarche de John Cage peut se contenter de croupir dans les galleries d’art contemporain réservées à la petite bourgeoisie intellectuelle qui se complaît dans l’élitisme le plus ésotérique. En revanche, Kyle Gann décrit la démarche subversive du compositeur pour permettre de la comprendre.
John Cage attaque la séparation entre l’artiste et le public. La musicalité ne provient plus d’une scène avec ses vedettes qui jouent d’un instrument avant d’être applaudies et félicitées. Au contraire, les musiciens ne jouent aucun véritable rôle. C’est le public qui doit déceler lui-même la musicalité.
Cette démarche permet de rompre avec le statut de consommateur passif et incite à développer sa propre sensibilité musicale et artistique. Les bruits du quotidien, les sonorités les plus banales, peuvent alors revêtir une musicalité. John Cage permet d’ouvrir la perception de tous les sens. Tout le monde peut se saisir de la créativité et de la musique qui ne sont plus réservées à une petite élite de professionnels. Cette démarche permet donc de briser la dimension hiérarchique, consumériste et conformiste incarnée par la musique marchande et standardisée. Cette nouvelle sensibilité musicale et artistique doit alors permettre de ré-enchanter le monde. Cette démarche doit permettre de briser la routine du quotidien pour mettre la créativité, le plaisir et le jeu au centre de l'existence. 

Dialética e as intermitências do espaço-tempo

O título original deste aí é 'Lefebvre, Space e Dialetic', e o escrevi como comunicação para um evento no exterior. A pedido, faço-o vir novamente a lume. 

Dialéticas espaciais, de Lefebvre, em amor e luta 



By Ivonaldo Leite 

The dialectic is the centripetal of Henri Lefebvre’s many interests. Focusing on dialectical materialism as a general method developed by Marx but applied by him only a limited number of fields, Lefebvre proposed dialectical materialism as a universal method.  As Rob Shields says[i], while Althusser and “scientific Marxists” saw economics and materialism as the legacy of Marx, Lefebvre saw dialectic materialism as the rigorous core of Marx’s insight. The dialectic itself thus became the cornerstone of Lefebvre’s philosophical critique of the formal logic of traditional philosophies.
Like Marx and Engels, Lefebvre found the positive aspect of Hegel’s dialectic in his phenomenology, where he was not content simply to record the content of thought but attempted to develop a method that comprehended its ongoing process of production, autopoesis and change. Seizing life only in terms of logical concepts and celebrating the realisation of mind in social institutions such as the state – which act progressively against the people – is rejected as a form of alienation. This is why whole history of alienation is nothing more than the history of the production of abstract thought, of speculative, logical thought.
Marx and Engels had built upon the work of Feubarch, who exposed a fatal flaw in Hegel’s system: if mind becomes nature and matter, then matter becomes mind, dissolving the basis of Hegel´s dialectic. Feuerbach argued that philosophy was systematic religion, and he proposed setting individuals and their relationships with each other in the core of any post-Hegelian philosophy. Marx’s and Engels’ addition was to reconceptualise individuals as concrete social beings in definite historical-geographic relationships. Adopting this materialism, Lefebvre argued[ii], Marx and Engels were the first and foremost seeking to deepen humanism and their critique of alienation. Dialectical Materialism seeks to give thought back its force by linking it directly to practice, and moving Hegel’s dialect into concrete social analysis and finally applying it to economic relations before moving on to nature. Lefebvre argue that we in turn must apply the method of dialectical materialism to the contemporary problems. The truth, he says, is to be found in totality. The true is the concrete. Speculation must be transcendent.
However, Lefebvre is not a thinker who only repeats Marx’ and Engels’ arguments about dialectical materialism. He makes an additional contribution. Lefebvre shifts the ground of dialectical materialism from time to space. After his best-known work on space, he draws back from a periodicising historical narrative of the dialectical development of modes of space and their relationship with capital and visuality, substituting an analysis of the spatial extension of capital in the present.  Thus, for him, the contemporary dialectic no longer clings to historicity and historical time, or to a temporal mechanism such as thesis-antithesis-synthesis. This, then, is what is new and paradoxical: the dialectic is no longer attached to temporality. Therefore, refutations of… Hegelian historicity cannot function as critiques of the dialectic.
According to that, Soja proposes what he calls third space as a translation of, on the one hand, Lefebvre’s three-part dialectics of the social production of space[iii]. Ross also affirms: “time, said Feuerbach, is privileged category of the dialectic, because it excludes and subordinates where space tolerates and coordinates. Our tendency is to think of space as an abstract, whit physical contexts, as the container for our lives rather than the structures we helped create. The difficulty is also one of vocabulary, while words like ‘Historical’ and ‘Political’  convey a dynamic of intentionality, vitality and human motivation, ‘Spatial’, on the hand, connotes stasis , neutrality and passivity. But the analysis of social space, far from being reactionary or technocratic, is rather a symptom of strategic thought… that poses space as the terrain of political practice… always entails an encounter with history of – or better, a choice of histories”[iv].
However, the claim being argued here is that a spatialised dialectic foregrounds a new form of affirmation-negation-negation of the negation found in the old forms of dialectical materialism. We are aware, of course, that neither Hegel nor Marx used the terms thesis, antitheses, syntheses (it is, rather, from Fichte) and that affirmation-negation—negation of the negation is Marx’s and Engels’ formula. The third term of negation of the negation is that alternative route which displaces or reconfigures – divides – the dualism of affirmation-negation. This is the philosophical implication of Lefebvre’s proposition that dialectics could be extended into trialectics in which a position is opened up for otherness within dialectical materialism. Lefebvre himself does not appear to fully grasp or exploit the importance of this shift. His description of a dialectique de triplicité as merely a three-way dialectic consisting of a thesis with not on, but two anti-theses is confusing.
To use the example of Lefebvre’s description of social space, it suggests that practice, thought and imagined space are elements synthesised together in a social spatialization. But this third term is in fact treated more as a negation of the negation than an equal player with the first two, and he uses language that harks back to his old work on the “total person”. Perceived, conceived and lived out are used to describe practice, thought and imagined, respectively. The three make much more sense if they are rethought as a dialectical contradiction of: everyday perception/practice versus spatial theory/concepts relativised by a transcendent, entirely other, moment: creative, fully lived space. If we still insist on counting terms and positions, any notion of a totalising synthesis lies in a fourth, transcendent term, what Lefebvre calls l’espace, itself  - best understood as the spatialization. 
Conclusively, it is possible to show two figures on the subject[v].  One demonstrates the interpretation of Lefebvre’s triple dialectic and another one focuses its implications. See them.


I Affirmation
(Thesis)
e.g everyday practice
and perception
II Negation
(Anti-thesis)
vs. analytical theory
and institutions
III Negation 2
(Otherness)
vs. fully lived moments

IV Synthesis
i.e. social totality

Figure 1:  Common interpretation of Lefebvre’s triple dialectic



I Affirmation
e.g. everyday practice
and perceptions
II Negation
vs. analytical theory
and institutions

IV Analytical
Synthesis
i.e social totality
revealed by theoretical
analysis

III Negation of the negation
(otherness)
both overturned by unpredictable
fully lived moments

Figure 2:  The implications of Lefebvre’s dialectic of triplicity


Notes 


[i] - See SHIELDS, Rob (1999). Lefebvre, Love and Struggle: Spatial Dialectics. London: Routledge. 

[ii] - See LEFEBVRE, Henry (1974). Le matérialisme dialectique. Paris: Press Universitaires de France.

[iii] - SOJA, Edward (1996). Third Space. Oxford: Basil Blackwell.  

[iv] - ROSS, Kristin (1988). The Emergence of Social Space: Rimbaud and the Paris Commune. New York: Macmillan, page 348.  

[v] - According to SHIELDS, Rob (1999). Lefebvre, Love and Struggle: Spatial Dialectics. London: Routledge. 

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2015

Educação: o que pode dar certo

Quando dois pesquisadores da estirpe de Greg J. Duncan (University of Califórnia) e Richard J. Murnane (University of Havard) fazem parceria, é quase certo que resulta em coisa boa. É isso que demonstra a publicação, por ambos, do livro Restoring Opportunity, com foco no que pode dar em certo em educação no contexto de alunos de baixa renda. A base empírica do estudo é a realidade estadunidense, mas, no caso, com muita similaridade em relação ao Brasil. Reproduzo uma espécie de recensão da obra, repercutida pelo Jornal da Ciência/SBPC. 


Por Antônio Gois 

Lançado no ano passado nos Estados Unidos, o livro “Restoring Opportunity”, dos professores Greg Duncan (Universidade da California) e Richard Murnane (Harvard), traz boas e más notícias para quem acredita que a escola é capaz de reduzir desigualdades e garantir ensino de alta qualidade para os alunos mais pobres. A boa é que essa é uma missão possível, como demonstram iniciativas bem-sucedidas que passaram por rigorosas avaliações. A má é que não é uma tarefa simples e, para dar conta dela, não há bala de prata.
Sempre baseados num enorme arsenal de pesquisas acadêmicas, os autores primeiro demonstram como a pobreza e o crescimento da desigualdade estão ameaçando o sonho americano de mobilidade social. Famílias mais ricas, cujas crianças já entram na pré-escola com um vocabulário muito mais amplo que o das demais, estão investindo cada vez mais na educação de seus filhos, desde a educação infantil até o ensino superior. Enquanto isso, os mais pobres estudam em escolas de pior qualidade, exatamente como ocorre no Brasil.
Duncan e Murnane apresentam então três projetos com ótimos resultados e destacam duas características comuns a todos. A primeira é a existência de uma forte estrutura de apoio à escola e, principalmente, aos professores, para que possam desenvolver um currículo de alto padrão, com elevadas expectativas acadêmicas para todos os estudantes. A segunda é a avaliação (não apenas por testes padronizados) e monitoramento constante desse trabalho, de modo a garantir que os resultados estejam sendo alcançados, detectar problemas, e corrigir rumos. Para os autores, essas duas dimensões são essenciais. Avaliar e cobrar resultados das escolas sem que elas tenham apoio para promover as mudanças é tão ineficiente quanto oferecer ajuda sem monitorar se o projeto está sendo de fato bem executado.
Na educação infantil, o projeto destacado foi implementado em pré-escolas na cidade de Boston, onde a secretaria de educação estabeleceu um currículo de alto padrão, elevou significativamente os salários dos professores dos primeiros anos para atrair bons profissionais, e ofereceu a eles apoio e acompanhamento intensivo do trabalho em sala de aula. No ensino fundamental, o livro retrata uma rede de escolas privadas que, mantida com dinheiro público, atende alunos de baixa renda em Chicago. Aqui também o destaque é para a forte estrutura de apoio criada para orientar diretores e professores a desenvolverem seu projeto pedagógico. Já no ensino médio, os autores contam a história de escolas públicas de Nova York que receberam apoio de empresas e organizações educacionais contratadas pela prefeitura para dar suporte a esses colégios.
Ao final, Duncan e Murnane se deparam com um dilema. Por um lado, lembram que há ampla evidência de que simplesmente gastar mais dinheiro na educação não garante melhoria da qualidade do ensino. Por outro, reconhecem que os projetos destacados no livro demandaram significativos recursos adicionais. Diante disso, concluem: “É errado dizer que dinheiro não importa. Ele pode fazer a diferença, mas somente se usado efetivamente para melhorar a qualidade da instrução e enriquecer as experiências de aprendizado das crianças de baixa renda”.
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Fonte: http://oglobo.globo.com/sociedade/educacao/o-que-pode-dar-certo-15408214#ixzz3SaFj5qUa

O preço de ser educado e idiotas


Do inquieto talento do lusitano Jorge Palma, a música chama-se 'Do Pobre B.B.', mas, cá entre nós, também poderia ser algo do tipo "O preço de ser educado entre bárbaros(as) ou idiotas". Para bom entendedor, o enunciado é suficiente. E haja pachorra. Oui, c'est une question de finesse. Fiquemos com a sabedoria oriental através de Confúcio: 'um homem sábio tem prazer em passar-se por tolo diante de um tolo que quer se passar por sábio'. Fiquemos também, aí abaixo, com a música do Jorge Palma, que não é para tolos - ou, lembrando o sarcasmo de Nelson Rodrigues, não é para idiotas, que hoje estão por toda a parte, de forma direta ou sob o manto do anonimato dos dispositivos tecnológicos e da internet (por serem idiotas, não se dão conta de que facilmente podem ser identificados).  



'Não há tempo para nada que não seja o essencial'

O neurologista e escritor Oliver Sacks foi direto, ao saber que tem os dias contados em face de uma doença terminal: anunciou o fato no New York Times, afirmando que não há mais tempo para nada que não seja o essencial. Do 'sítio Cotioutra', reproduzo, aí abaixo, a repercussão da atitude de Sacks.  

OLIVER SACKS
Oliver Sacks: despedindo-se 

Oliver Sacks (81 anos), neurologista e escritor britânico ficou conhecido, dentre outras realizações, pelos livros “Tempo de despertar” e “O homem que confundiu sua mulher com um chapéu”. A primeira obra, datada de 1973 é um relato baseado em suas próprias experiências como médico e foi posteriormente adaptada e protagonizada por Robert Williams e Robert DeNiro no cinema, obtendo três indicações ao Oscar. Seus livros foram traduzidos para mais de vinte línguas e são sucesso de vendas, conquistando diversos prêmios pelo mundo. O neurologista também é membro honorário da Academia Americana de Artes e Letras, da Academia Americana de Artes e Ciências e da Academia das Ciências de Nova Iorque.
Nesta semana, Sacks anunciou a descoberta de um câncer em estágio terminal no fígado. O anúncio se deu por meio de um artigo intitulado “Minha própria vida”, originalmente publicado pelo New York Times no dia 19 de fevereiro.
Ele inicia o texto contando como foi a descoberta da doença:
“Há um mês, eu sentia que estava em boas condições de saúde, robusto. Aos 81 anos, ainda nado uma milha por dia. Mas a minha sorte acabou – há algumas semanas, descobri que tenho diversas metástases no fígado. Há nove anos, encontraram um tumor raro no meu olho, um melanoma ocular. Apesar da radiação e os lasers que removeram o tumor terem me deixado cego deste olho, apenas em casos raríssimos esse tipo de câncer entra em metástase. Faço parte dos 2% azarados.
Sinto-me grato por ter recebido nove anos de boa saúde e produtividade desde o diagnóstico original, mas agora estou cara a cara com a morte. O câncer ocupa um terço do meu fígado e, apesar de ser possível desacelerar seu avanço, esse tipo específico não pode ser destruído.”
Sacks ainda fala de como pretende viver de agora em diante:
“Depende de mim agora escolher como levar os meses que me restam. Tenho de viver da maneira mais rica, profunda e produtiva que conseguir. Nisso, sou encorajado pelas palavras de um dos meus filósofos favoritos, David Hume, que, ao saber que estava também com uma doença terminal aos 65 anos, escreveu uma curta autobiografia em um único dia de abril de 1776. Ele chamou-a de “Minha Própria Vida”.
Ainda inspirado em Hume: “Tive sorte de passar dos oitenta anos. E os 15 anos que me foram dados além da idade de Hume foram igualmente ricos em trabalho e amor. Nesse tempo, publiquei cinco livros e completei uma autobiografia (um pouco mais longa do que as poucas páginas de Hume) que será publicada nesta primavera; tenho diversos outros livros quase terminados.”
Sacks conta que Hume, no texto citado acima escreve que era “um homem de disposição moderada, de temperamento controlado, de um humor alegre, social e aberto, afeito a relacionamentos, mas muito pouco propenso a inimizades, e de grande moderação em todas as paixões.” Relata a seguir que aí se distancia do filósofo: “apesar de desfrutar de relações amorosas e amizades e não ter verdadeiros inimigos, eu não posso dizer (e ninguém que me conhece diria) que sou um homem de disposições moderadas. Pelo contrário, sou um homem de disposições veementes, com entusiasmos violentos e extrema imoderação em minhas paixões.”
O médico conta ainda:
“Nos últimos dias, consegui ver a minha vida como a partir de uma grande altura, como um tipo de paisagem, e com uma sensação cada vez mais profunda de conexão entre todas suas partes. Isso não quer dizer que terminei de viver.
Pelo contrário, eu me sinto intesamente vivo, e quero e espero, nesse tempo que me resta, aprofundar minhas amizades, dizer adeus àqueles que amo, escrever mais, viajar se eu tiver a força, e alcançar novos níveis de entendimento e discernimento.
Isso vai envolver audácia, claridade e, dizendo sinceramente: tentar passar as coisas a limpo com o mundo. Mas vai haver tempo, também, para um pouco de diversão (e até um pouco de tolice).”
E continua: “Sinto um repentino foco e perspectiva nova. Não há tempo para nada que não seja essencial. Preciso focar em mim mesmo, no meu trabalho e nos meus amigos. Não devo mais assistir ao telejornal toda noite. Não posso mais prestar atenção à política ou discussões sobre o aquecimento global.
Isso não é indiferença, mas desprendimento – eu ainda me importo profundamente com o Oriente Médio, com o aquecimento global, com a crescente desigualdade social, mas isso não é mais assunto meu; pertence ao futuro. Alegro-me quando encontro jovens talentosos – até mesmo aquele que me fez a biópsia e chegou ao diagnóstico de minha metástase. Sinto que o futuro está em boas mãos.
Nos últimos dez anos mais ou menos, tenho ficado cada vez mais consciente das mortes dos meus contemporâneos. Minha geração está de saída, e sinto cada morte como uma ruptura, como se dilacerasse um pedaço de mim mesmo. Não vai haver ninguém igual a nós quando partirmos, assim como não há ninguém igual a nenhuma outra pessoa. Quando as pessoas morrem, não podem ser substituídas. Elas deixam buracos que não podem ser preenchidos, porque é o destino – o destino genético e neural – de cada ser humano ser um indivíduo único, achar seu próprio caminho, viver sua própria vida, morrer sua própria morte.”
E Oliver Sacks conclui seu texto:
“Não posso fingir que não estou com medo. Mas meu sentimento predominante é de gratidão. Amei e fui amado; recebi muito e dei algo em troca; li, viajei, pensei e escrevi. Tive uma relação com o mundo, a relação especial do escritor e leitor.
Acima de tudo, fui um ser sensível, um animal pensante nesse planeta maravilhoso e isso, por si só, tem sido um enorme privilégio e aventura.”
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Fonte: http://www.contioutra.com/nao-ha-tempo-para-nada-que-nao-seja-essencial-trechos-da-carta-de-despedida-de-oliver-sacks/

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

A derrota do novo desenvolvimentismo e as "pistas" de O Capital

'Na real', ou no real (para pensar nas oscilações da nossa moeda frente ao dólar), falemos sobre economia. Sobretudo agora que o Sr. Ministro da Fazenda anda a anunciar aos altos financistas em Nova Iorque que, pasmem! (mas acreditem), o Brasil está a desmontar as medidas anticíclicas - mais precisamente: 'Brasil deixa medidas anticíclicas para trás'(http://economia.uol.com.br/noticias/reuters/2015/02/18/levy-diz-que-brasil-deixa-medidas-anticiclicas-para-tras-e-que-confia-em-recuperacao.htm).  
Ora, o que o Ministro está a dizer é que as políticas de estímulo à aquisição de bens, o acesso ao crédito, os juros "mais atraentes", etc. ficarão para trás. E repisa a fraude monetarista de que juro alto garroteia inflação. Se a banda tocasse nesse tom, há muito tempo a lavoura estaria salva em Pindorama. É isso mesmo? Realmente, dentro do governo federal, todos estão de acordo com essa patranha? Não há uma manifestação, um pronunciamento sequer em sentido contrário. Pois bem, e dentro do Palácio do Planalto ocupa um gabinete de destaque alguém que nos acostumamos a ver como um fervoroso defensor do chamado 'novo desenvolvimentismo', com tese de doutorado e tudo mais a respeito, em láureas, na companhia de outros, pelos corredores da Unicamp, a defender exatamente essas políticas que agora se diz que 'vão ficar para trás'. Vá se entender!  Em tempos assim, só mesmo voltando aos clássicos da Economia Política para respirar. Será meu "prato" neste sábado, por convite do amigo-irmão de sempre Alder Júlio: a apreciação do Capítulo IX, do Livro III, de O Capital. A minha interpretação está aí abaixo.



Anotações a propósito da leitura de O Capital, Livro III, Vol. IV, Capítulo IX: ‘Formação da Taxa Geral de Lucro (Taxa Média de Lucro) e a Conversão dos Valores em Preços de Produção’, de Karl Marx (Edição: Civilização Brasileira, tradução de Reginaldo Sant’Aana, 1 ed., 1984).


Por Ivonaldo Leite

Sabendo ser impertinente conceber a obra de Marx acantonando-a em compartimentos ou fazendo inferências a partir de textos isolados, a rigor, em minha perspectiva, devemos tratar do Capítulo IX do Livro III de O Capital, voltando ao Livro I. Fundamentalmente o que está em causa no Capítulo IX do Livro III é a questão da troca de mercadorias, de par com a discussão sobre a formação da taxa geral/média de lucro e a conversão dos valores em preços de produção. Essa volta ao Livro I, relacionada à leitura do Capítulo IX do Livro Terceiro, permite-nos perceber que há, em O Capital, duas concepções sobre o valor de troca das mercadorias. Quais sejam:
a) No Livro I, as mercadorias são trocadas pelos seus valores de custo, que os valores de troca expressam, sendo os valores de custo de produção consubstanciados pela soma dos valores de custo dos fatores produtivos com a mais-valia.
b) No Livro III, no Capítulo IX, a troca das mercadorias passa a ocorrer mediante os seus preços de produção, com eles já não correspondendo aos valores de custo, sendo estes últimos resultantes da soma dos preços de produção dos fatores produtivos como o lucro, decorrente da aplicação de uma taxa geral de lucro - a relação do lucro com a totalidade do capital empregado.  
Ao que parece, a concepção inicial do Marx, acreditando que as mercadorias eram trocadas pelos seus valores de custo e atribuindo a formação dos seus valores de troca à adoção de uma taxa geral de mais-valia, conduzia à obtenção de lucros não proporcionais aos capitais empregados e de taxas de lucro inversamente proporcionais às suas composições orgânicas, talvez, assim, discrepando da realidade. Também, por outro lado, poder-se-á considerar que a nova concepção é justificada como tendo sido formulada como produto de um estado mais avançado do desenvolvimento do capitalismo, a que não se referia a concepção inicial, tendo sido nessa direção então que Engels, a partir dos rascunhos deixados por Marx após a sua morte, encaminhou a edição póstuma dos Livros II e III de O Capital.

De toda forma, a nova concepção, isto é, a concepção presente no Capítulo IX do Livro III, é apresentada como resultado da conversão de preços representativos dos valores nos denominados preços de produção, realizada mediante a ação do mercado, pelo imperativo da concorrência, em resposta aos interesses dos ‘capitalistas associados’.  O mercado, que inicialmente formava os preços representativos dos valores, determinando por ação da concorrência o trabalho socialmente necessário para a produção de mercadorias, passa a formar então – também por força da concorrência – preços de produção não representativos de valores.   
Seja como for, não me parece que existam rupturas extremas no que é preconizado no Capítulo IX do Livro III, por comparação aos escritos anteriores, conforme, penso eu, uma revista de algumas das premissas básicas do referido Capítulo pode revelar. Vejamos:
- Logo de início é (re)afirmado o que se compreende por composição orgânica do capital: “em qualquer momento, depende [a composição orgânica] de duas circunstâncias: da relação técnica entre a força de trabalho empregada e a quantidade dos meios de produção utilizados, e do preço dos meios de produção” (p. 175). Representando isso, emblematicamente, apresenta-se uma ‘fórmula projetiva’ de composição orgânica do capital expressa nos seguintes termos 80c + 20v, decorrendo a configuração das frações da composição na seguinte ordem 4 /5 de capital constante e 1/5 de capital variável.
- Posto isto, são considerados, de forma suposta, cinco ramos industriais diferentes em que os capitais investidos têm em cada um composição orgânica distinta (p.176), com a mesma taxa de mais-valia (100%), tendo-se então taxas de lucros diversas, como reflexo das diferentes composições orgânicas do capital (cc e cv) em cada ramo. Desenvolve-se, a partir daí, toda uma discussão específica a respeito das variações, com fundamento em base quantitativa.
- As taxas de lucro nos diferentes ramos da produção diferem. Daí elas, por força da concorrência, nivelam-se numa taxa geral de lucro, que é a média de todas elas. “O lucro que, de acordo com essa taxa geral, corresponde a capital grandeza dada, qualquer que seja a composição orgânica, chama-se lucro médio” (p. 179).
- Os capitalistas, de diferentes ramos da produção, ao venderem as mercadorias, recobram os valores de capital consumidos para produzi-las; contudo, a mv que colhem não é gerada no próprio ramo com a respectiva produção de mercadorias, mas sim a que cabe a cada parte alíquota do capital global, numa repartição uniforme da mv global produzida, em dado espaço de tempo, pelo capital global da sociedade em todos os ramos.
- Sobre lucro e mais-valia, mais um raciocínio projetivo, para considerar uma diferença: “sabemos que o preço do produto do capital B, por exemplo, se desvia do valor porque a mais-valia realizada por B pode ser maior ou menor que o lucro incluído no preço dos produtos de B, o que se estende às mercadorias que constituem a parte constante do capital B e às que, indiretamente, como meios de subsistência dos trabalhadores, formam a parte variável” (p.183).
- A propósito da mudança de concepção relativa a preços, antes aludida, pode-se ler na pág. 187: “(...) modificou-se a determinação do preço de custo das mercadorias. No início, admitíamos que o preço de custo de uma mercadoria era igual ao valor  [destacado no texto] das mercadorias consumidas para produzi-la. Mas, para o comprador, o preço de produção de uma mercadoria é o preço de custo, podendo por isso entrar na formação do preço de outra mercadoria como preço de custo. Uma vez que o preço de produção da mercadoria pode desviar-se do valor, também o preço de custo de uma mercadoria, no qual se inclui esse preço de produção de outra mercadoria, está acima ou abaixo da parte do valor global formada pelo dos correspondentes meios de produção consumidos. Em virtude dessa significação modificada do preço de custo, é necessário lembrar que é sempre possível um erro quando num ramo particular de produção se iguala o preço de custo da mercadoria ao valor dos meios de produção consumidos para produzi-la. Em nossa pesquisa atual, é desnecessário insistir nesse ponto. Entretanto, continua correta a afirmativa de que o preço de custo das mercadorias é menor que o valor”.
- Preços: o preço de custo de uma mercadoria refere-se à quantidade do trabalho pago nela contido; o valor, a totalidade do trabalho nela contido (pago e não pago); o preço de produção, corresponde a soma do trabalho pago, acrescida de determinada quantidade de trabalho não pago.
- No que concerne à diferença quantitativa real entre lucro e mais-valia nos ramos particulares de produção, é de se notar que ela “oculta a verdadeira natureza e a origem do lucro, não apenas para o capitalista que tem aí especial interesse em enganar-se, mas também para o trabalhador. Com a transformação dos valores em preços de produção encobre-se a própria base da determinação do valor. E mais. A simples transformação da mais-valia em lucro leva a parte do valor a qual constitui o lucro a confrontar a outra parte, o preço de custo da mercadoria, já fazendo desaparecer para o capitalista a noção de valor. É que ele não tem diante de si o trabalho total que custa produzir a mercadoria, mas apenas a parte paga desse total, viva ou morta, configurada em meios de produção, aparecendo-lhe desse modo o lucro como algo extrínseco ao valor encerrado na mercadoria” (p.191).