segunda-feira, 25 de junho de 2012

Novas Perspectivas em Educação e Saúde

Nos últimos tempos, ciências como história, sociologia e antropologia têm, com freqüência, tomado a saúde como objeto de estudo, contribuindo, por exemplo, para superar os enfoques estritamente biomédicos. Como parte disso, a educação em saúde tem surgido como uma temática central nas abordagens históricas, sociológicas e antropológicas. Este é o norte do artigo abaixo, que escrevi quando ainda trabalhava na UFPE, e foi publicado na Revista Espaço Acadêmico (nº 114 - http://periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/viewFile/10350/6250). 


Ivonaldo Leite 
O profissional da saúde e a educação: novas configurações
Nas sociedades contemporâneas, a realização de cuidados de saúde constitui um campo de práticas sociais, profissionais e formativas em plena expansão e diversificação (Canário, 2003), isto tanto por conta de razões demográficas e sociais como também políticas. Como assinala Canário (ibidem, p. 119),[1] “a ênfase colocada na promoção da saúde, alargando o conteúdo deste conceito e articulando-o com contextos sociais e ambientais (em vez de um acento tônico na ‘cura de doenças’), corresponde a uma nova visão paradigmática”, a qual tem conduzido, nos últimos tempos, a uma reformulação do papel atribuído às instituições e aos sujeitos responsáveis pelos serviços de saúde.
Nesse sentido, ocorre de forma similar em outras esferas da atividade social e profissional, como no caso do campo da pedagogia, onde tem emergido como atributo a atuação não só nos espaços formais, na escola, mas também nos contextos educativos não-formais, isto é, fora da escola, no âmbito, por exemplo, das ONGs, movimentos sociais, empresas, etc. De igual modo, o campo da saúde tem passado por significativas reconfigurações, seja por decorrência das mudanças paradigmáticas que lhe perpassam, seja, ainda, em decorrência de fenômenos como a revolução tecnológica e informacional.  Dessa maneira, a formação emerge como um instrumento imprescindível em função de, pelo menos, dois propósitos: compreender os novos cenários das sociedades contemporâneas e levar a cabo as ações específicas, próprias do métier dos profissionais de saúde.
Em países europeus, como Portugal (mais adiante, veremos o Brasil), a importância atribuída à formação em saúde tem dado expressão a três grandes tendências, cujos contornos revelam o grau de processualidade que a questão formativa adquire nos dias de hoje.
A primeira tendência diz respeito ao desenvolvimento e a expansão quantitativa da oferta de formação contínua, dirigida aos profissionais de saúde, sobretudo aos enfermeiros. Tendo em conta designadamente o caso português, pode ser realçado, por exemplo, o Programa ProSalus, responsável pela efetivação de ações de formação a partir de uma perspectiva marcadamente inovadora, qual seja, a adoção de guias teórico-metodológicos referenciados em temas como “histórias de vida, formação-ação, formação multiprofissional, formação e desenvolvimento organizacional” (ibidem, p. 120).
A segunda tendência refere-se a uma espécie de re-arrumação da hierarquia profissional no campo da saúde. Ou seja, como afirma Canário (2003, p. 120):
Corresponde a um processo de enriquecimento, diversificação e complexificação de uma “paisagem” profissional tradicionalmente polarizada no médico e na enfermeira, mas tendo como referência tutelar o ideal tipo da profissão médica, marcada pela tenacidade e pela cientificidade, consubstanciando-se no que é geralmente designado por “modelo biomédico. Esta reconfiguração dos territórios profissionais da saúde corresponde a uma reformulação no interior das profissões clássicas, com a emergência ou revalorização de determinados ramos especializados (é o caso do clínico geral ou do enfermeiro de saúde pública).
Trata-se de um movimento que se desenvolve numa dupla direção: por um lado, faz surgir novos espaços de atuação profissional e novas especialidades, delineando um quadro que, mutatis mutandis, a título de exemplo, lembra, no caso brasileiro, a configuração da esfera de atuação do profissional de saúde coletiva. Por outro lado, o movimento incide sobre um horizonte teórico-prático que questiona a tendência de hiperespecialização científico-disciplinar, cuja base é uma abordagem fragmentada da saúde humana, tendente a transformar cada pessoa “numa quadrícula sem sentido” (Santos, 1987, p. 46). 
Quanto à terceira tendência, ela concerne à articulação entre a formação – sobretudo, a formação inicial – e os processos de construção, reconstrução ou afirmação identitária dos grupos profissionais não-médicos. Esta tendência, por outra parte, tem sido responsável pelo surgimento de uma esfera no ensino superior português que, ocupando-se do campo da saúde, tem as suas funções voltadas às questões da formação inicial e contínua, da pesquisa e da intervenção nas comunidades locais. Isto tanto no âmbito das faculdades de medicina como nas de educação, sendo um exemplo neste último caso a Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Lisboa, pioneira na institucionalização da pós-graduação orientada especificamente para a qualificação de grupos multiprofissionais em saúde.
No caso brasileiro, dentre os aspectos que têm marcado a relação entre educação e saúde, podem ser referidos três elementos.
O primeiro é de natureza sócio-histórica. Isto é, no Brasil, o realce no tema educação e saúde é algo já com uma longa tradição. De acordo com Melo (1987), entre as décadas de 1950 e 1960, houve um período áureo da educação sanitária no Brasil, a qual integrava, de forma interligada, educação e saúde nas políticas oficiais. Daí resultou, por exemplo, a instituição de escolas maternais, creches e parques infantis. Por outro lado, todavia, tal movimento era decorrente de uma ideologia modernizante levada a efeito pela burguesia industrial, que, assim, estruturou uma pedagogia da saúde que tinha como propósito remover (sem diálogo) obstáculos culturais e psicossociais, no seio das comunidades, diante das políticas oficiais de saúde (Canesqui, 1984). Esse cenário começa a se alterar a partir da década de 1970, quando, sob a influência da pedagogia de Paulo Freire, emergem os movimentos de educação popular em saúde (ibibem). Foram movimentos que, “comprometidos com as necessidades e possibilidades das classes populares, encaminharam uma nova articulação entre a educação e a saúde, onde, em paralelo à causalidade biológica, são consideradas as dimensões de vida e trabalho como fatores predisponentes centrais” (Mohr e Schall, 1992, p. 200).  
O segundo elemento é temporalmente mais recente. Diz respeito à formulação, pelo Ministério da Educação, das diretrizes curriculares para os cursos da área de saúde. Com base na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996, que assegura ao ensino superior uma maior flexibilidade na organização curricular dos cursos, a ideia de currículo mínimo de cada curso foi substituída pelas chamadas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs). Elas definem, de modo geral, o perfil dos profissionais de cada área, o conjunto de competências e o rol de conteúdos a serem ministrados.
No caso dos cursos da área de saúde, as DCNs “vieram ao encontro das necessidades do Sistema Único de Sáude (SUS), estruturado a partir de uma ampla rede de atenção relacionando-se com serviços de outros graus de complexidade” (Almeida et. al, p. 157). Daí emergiu a demanda por profissionais com uma formação que compreenda a integralidade dos cuidados requeridos pela população.  Assim, “as DCNs propõem um perfil profissional com boa formação geral, humanista, crítico e reflexivo” (ibidem, p. 157). Como consequência, no que se refere ao curso de medicina, em 2003, foi lançando o Programa Nacional de Incentivo às Mudanças Curriculares para as Escolas Médicas, através de portaria interministerial do Ministério da Educação e do Ministério da Saúde. O Programa foi formulado tendo como propósito reorientar a formação médica, prevendo iniciativas como a celebração de protocolos entre os gestores do Sistema Único de Saúde e as escolas médicas; a inserção do médico no processo social com vistas à prevenção de doenças; e a adoção de metodologias pedagógicas ativas no processo no processo de formação, que permitam interação com a realidade social.
O terceiro elemento que tem marcado a relação educação e saúde no Brasil, conforme a nossa abordagem, concerne à Educação Permanente. Ela tem inspirado e norteado fortemente as ações pedagógicas no campo da saúde nos dias presentes. Conforme Ceccim (2005, p. 162):
A Educação Permanente em Saúde pode corresponder à Educação em Serviço, quando esta coloca a pertinência dos conteúdos, instrumentos e recursos para a formação técnica submetidos a um projeto de mudanças institucionais ou de mudança de orientação política das ações prestadas em dado tempo e lugar. Pode corresponder à educação continuada, quando esta pertence à construção objetiva de quadros institucionais e à investidura de carreiras por serviço em tempo e lugar específicos. Pode, também, corresponder à Educação Formal de Profissionais, quando esta se apresenta amplamente porosa às multiplicidades da realidade de vivências profissionais e coloca-se em aliança de projetos integrados entre o setor/mundo do trabalho e o setor/mundo do ensino.
Por outro lado, indo mais às raízes do conceito de Educação Permanente em Saúde, é de se registrar que há quem o veja como um desdobramento da Educação Popular, designadamente tendo como aporte a obra de Paulo Freire, e há quem o compreenda como um desdobramento do Movimento Institucionalista em Educação, onde são figuras de relevo os franceses René Lourau e George Lapassade, os quais propuseram alterar a noção de recursos humanos, oriunda da Administração e depois da Psicologia Organizacional – como o elemento humano nas organizações -, para a noção de coletivos de produção. No centro desta perspectiva, estão as categorias auto-análise e auto-gestão. Seja como for, cabe razão a Ceccim (ibiem, p. 162), quando ele afirma que:    
Aquilo que deve ser central à Educação Permanente em Saúde é sua porosidade à realidade mutável e mutante das ações e dos serviços de saúde; é sua ligação política com a formação de perfis profissionais e de serviços, a introdução de mecanismos, espaços e temas que geram auto-análise, autogestão, implicação, mudança institucional, enfim, pensamento (disruptura com instituídos, fórmulas ou modelos) e experimentação.

Pesquisa e saúde: a formação profissional em pauta
Contrariando uma determinada tradição acadêmica que tende a limitar, no campo da saúde, a investigação às dimensões manipuláveis deste, isto é, aos “objetos experimentais” sobre os quais ele incide, donde o trabalho em laboratório é uma das suas principais expressões, tem-se registrado internacionalmente, nos últimos tempos, o desenvolvimento de um conjunto de investigações voltado à prática e ao processo de formação dos profissionais da área. Dentre os temas que têm sido focados, podem ser referidos a formação inicial, o condicionamento das práticas profissionais pela dimensão organizacional e a autoformação.  
No que toca à formação inicial, atendo-nos aqui ao caso dos enfermeiros, tem sido posto em evidência a relativa “ineficácia” da formação inicial, destacando-se a dificuldade de realização do transfert das aprendizagens oriundas da situação de formação para situações reais de trabalho.  Tendo em conta a pesquisa que conduziu, no contexto lusitano, Costa (1994, p. 221) assinala que os enfermeiros das unidades de saúde estudadas tendem a indicar uma relação negativa entre o que foi a formação inicial e a experiência, mesmo durante a formação em cuidado com idosos. De forma similar, mas de modo mais direto, Palmeiro (1995, p. 182) afirma que os enfermeiros objeto de seu estudo têm “uma posição quase unânime no que se refere à insuficiência e inadequação da formação inicial, face às realidades com que se confrontam no contexto de trabalho”.
Carraça (1994, p. 204), por sua vez, a partir de um estudo de caso com médicos portugueses, enfatiza o seguinte:  
As percepções dos inquiridos sobre a formação inicial, ao nível da faculdade e ao nível do internato em geral, tendem a polarizar-se negativamente em termos de adequação às necessidades da prática. A faculdade recolhe referências mais negativas, surgindo respostas de formação ‘totalmente inadequadas’.
Tanto no caso dos enfermeiros como no dos médicos, a ilação que desde logo se retira é que há um “desajustamento” entre o que foi “ensinado” e “treinado” na formação inicial e as práticas profissionais observáveis nos contextos de trabalho. Contudo, coloca-se como necessário problematizar o significado desse “desajustamento”.   
Antes de tudo, o “desajustamento” entre a formação inicial e a ação nos contextos de trabalho só é entendido como ineficaz em decorrência do fato de a matriz conceitual que, tradicionalmente, se tem como referência nos processos de formação, conceber a prática profissional como um momento de “aplicação” caracterizado pela previsibilidade. Nesta perspectiva, uma formação inicial “pouco eficaz” é possível de ser “corrigida” com uma adição de racionalidade técnica e de cientificidade. Ignora-se, assim, as particularidades da distinção entre as duas situações (de formação e de trabalho). Como destaca Canário (2003, p. 138):
A ação profissional tem lugar em contextos sociais, marcados pela singularidade e incerteza, em que se cruzam as prescrições hierárquicas, a procura social e os interesses dos próprios profissionais. É por esta razão que a sociologia do trabalho tem, sistematicamente, posto em evidência a distância que separa o trabalho prescrito do trabalho real. Por outro lado, a aquisição de um conjunto de saberes, a interiorização de um conjunto de valores e o domínio de um conjunto de gestos técnicos não constituem pré-requisitos susceptíveis de uma transferabilidade linear, determinando a ação profissional.   
Tendo isso em consideração, pode-se então fazer uma diferenciação entre qualificação e competência. Quer dizer, importa ter em conta que os saberes prévios ao exercício profissional não são uma garantia de competência, pois a produção de competências corresponde a um processo multidimensional, simultaneamente individual e coletivo, sempre contingente, o que significa dizer dependente de um determinado contexto e de um determinado projeto de ação. Ou seja, o conceito de competência diz respeito a “saber encontrar e pôr em prática eficazmente as respostas apropriadas ao contexto na realização do projeto” (Reinbold e Breillot, 1993, p. 15), sendo o mesmo dizer, como em Morin (1990), que elas são propriedades globais resultantes da reorganização e do acréscimo de complexidade do cérebro. Portanto, pode-se “armazenar” informações, mas não competências.  
Relativamente ao condicionamento das práticas profissionais pela dimensão organizacional, Palmeiro (1995, p. 179) é incisivo:
A parcelarização do trabalho por tarefas tende a desenvolver comportamentos de isolamento, dificultando a própria cooperação e partilha de experiências, diminuindo em simultâneo a responsabilização do enfermeiro pelos cuidados que presta. A tentativa de “trabalho em equipe” frustra-se, à partida, por problemas logísticos, é um fato, mas também por problemas de dependência e de comunicação interprofissional.
Trata-se, ao fim e ao cabo, de uma discrepância entre, de uma parte, as diretrizes contemporâneas do campo da saúde e o funcionamento efetivo dos seus serviços. Essa discrepância não tem significação meramente conjuntural, como um fato com consequências meramente momentâneas, mas, sim, se inscreve num quadro estrutural que mantém um modelo de prática médica centrada na instituição, na doença e na consulta.
Denominando tal modelo como “modelo da caixa”, e tendo em atenção designadamente o trabalho em centros de saúde, Canário enfatiza que ele “é concomitante e favorece o modelo biomédico como [única] referência estruturante das práticas profissionais dos médicos que são ‘convidados’ pela situação a ‘refugiar-se’ no território da consulta individual”. Essa situação, por outro lado, não é dissociável do estilo de gestão adotado nos serviços de saúde, que, por vezes, limita a capacidade de interlocução das unidades de atendimento com os contextos sociais onde elas estão situadas. 
Last but not least, a autoformação. Ela aparece como sendo marcada por uma dupla dimensão. Por uma parte, refere-se às decisões individuais dos profissionais em relação ao seu aperfeiçoamento formativo, seja buscando cursos de qualificação, seja realizando aquisição bibliográfica e fazendo leituras a respeito do campo de atuação. Por outra parte, a autoformação concerne às aprendizagens decorrentes dos contextos/processos de trabalho, isto é, da prática. Esta é uma via experiencial de aprendizagem que coloca em primeiro plano a importância de uma reflexão sistemática e deliberada  das práticas realizadas nos contextos de trabalho.
Quer numa dimensão, quer noutra, tem-se que os processos formativos correspondem, fundamentalmente, a processos autoformativos no sentido em que cada um gerencia e se apropria de “um conjunto de situações por que passou, realizando um trabalho, sobre si próprio, de autoconstrução, como pessoa e como profissional” (Canário, 2003, p. 141-2).  
Nota metodológica sobre a construção do artigo
Ao nos aproximarmos da conclusão deste trabalho, cabe uma nota explicativa relativa a métodos e materiais a partir dos quais ele foi construído. Escrito no âmbito de um projeto de pesquisa que busca apreender as principais abordagens das ciências sociais/humanas voltadas ao campo da saúde, o presente artigo, metodologicamente, foi produzido sob os aportes de uma revisão bibliográfica, a qual relacionou livros, artigos e trabalhos de pós-graduação. Realizou-se uma leitura desse material tendo-se como guia de análise unidades de inferência, isto é, unidades temáticas por via das quais foram apreendidos os enfoques do material concernentes à relação educação e saúde. Tratou-se, como se percebe, de um procedimento que combina análise de discurso e análise de conteúdo, sem necessariamente recorrer, neste último caso, à quantificação estatística. Para o acesso à bibliografia referente a Portugal e a realização da análise da situação lusitana no tocante à relação educação e saúde, foi de grande valia uma estadia realizada pela autoria do artigo nesse país.     
À guisa de conclusão
Da abordagem aqui desenvolvida, realizando uma incursão pela bibliografia revisada, é possível, da nossa parte, apresentar um quadro conclusivo que, estruturado por dois pressupostos analíticos que delineamos, evidencia a importância da contribuição acadêmica das ciências humanas nos processos de formação sem saúde.
O primeiro pressuposto analítico refere-se ao significado do que se entende por formação. Diferente do que tradicionalmente se entende, é necessário realçar que a outorga de um diploma, na formação inicial, representa a autorização jurídico-cognitiva e política para o exercício de uma profissão, mas não necessariamente a concessão de todo o repertório de competências para o exercício da mesma, e menos ainda a chancela da identidade que caracterizará as práticas profissionais do outorgado.
Daí advém o segundo pressuposto. Ele diz respeito ao fato de que, tanto em saúde como outras áreas, a constituição das competências é indissociável do processo de socialização profissional. Quer isto dizer que os contextos de trabalho são também espaços de formação, que eles fornecem subsídios imprescindíveis à constituição das competências e influenciam fortemente o jeito de ser do profissional, ou seja, são indutores da definição da identidade profissional.           
Assim sendo, poder-se-á dizer que a questão da mudança das práticas profissionais em saúde (na sua dimensão individual e coletiva) requer atenção à questão da socialização profissional, tendo-se então que a efetiva produção de mudanças coincide, nos contextos de trabalho, com uma dinâmica formativa e de construção identitária que demanda novas (e alternativas) formas de atuação profissional.
Ora, se considerarmos que temáticas como socialização, relações humanas, mudança social, subjetividade, processo de formação, etc. são par excellence temáticas das ciências sociais/humanas, é forçoso enfatizar que um dos imperativos do novo de atuação dos profissionais da área de saúde demanda que sejam assimilados os contributos das referidas ciências. São contributos que, ressalte-se, não se restringem apenas à esfera da relação entre a educação e o campo da saúde, mas incidem sobre os objetos específicos deste campo, aportando novas concepções. Neste sentido, há de se referir, por exemplo, as formulações das ciências sociais/humanas em torno de questões como: 1) biomedicalizção, biosociabilidade e biopoder; 2) a “velha” e “nova” saúde pública; 3) o público e o privado; 4) ação coletiva e participação; 5) saúde e direitos humanos. 
Enfim, trata-se de entender que a distinção entre ciências naturais e ciências sociais/humanas deixou de ter sentido. Essa distinção assenta numa concepção mecanicista da matéria e da natureza à que contrapõe os conceitos de ser humano, cultura e sociedade. Porém, com os avanços recentes em ciências como física e biologia, tal distinção deixou de ter sentido tanto no plano lógico como empírico, na medida em que se põe em causa, por exemplo, as dicotomias sobre as quais a ciência moderno-positivista se ergueu.    
Importa, portanto, ter presente nos serviços de saúde que as atribuições a serem exercitadas em seu âmbito requerem que o ser humano seja compreendido em toda a sua integralidade, e não apenas a partir do enfoque de uma área científica específica, que, assim sendo, será sempre um enfoque parcial e, como tal, incapaz de apreender o significado das situações em consideração. Isto é, tendo em conta que o ser humano é síntese de muitas determinações, é imperativo que o profissional de saúde o compreenda em sua complexidade, nos processos de formação, construindo então um conhecimento profissional cuja pertinência é validada pelo compromisso com a promoção da vida em todas as suas dimensões.      

Referências bibliográficas
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[1] - Tratando-se de uma citação direta, na atual, como em outras, mantém-se o grafo do português de Portugal. Na citação em foco, ao dizer “a ênfase colocada na promoção da saúde”, o autor pretende afirmar a ênfase atribuída à promoção da saúde.  

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