terça-feira, 21 de janeiro de 2014

"Economia dos riscos" e imóveis

Lembrando Florestan Fernandes, costumo dizer que a ciência social é 'como uma caixa de ferramentas'. Para determinado fenômeno da realidade, utiliza-se o "utensílio teórico" que calhe melhor à sua inteligibilidade. Daí serem despropositadas as profissões de fé, numa espécie de fidelidade cega, em torno de paradigmas analíticos - o que, infelizmente, é algo cada vez mais comum, sob o impulso de modas acadêmicas. Contudo, o que importa à análise social, dentre outras perspectivas, é construir quadros de inteligibilidade a respeito da realidade, para, se for o caso, orientar as ações em função das questões que ela coloca como desafio. Realço este preâmbulo para repisar o tema da "economia dos imóveis", como exemplo do que uma análise social criteriosa pode nos fazer enxergar. A "economia dos imóveis" está, de forma ascendente, a se configurar numa espécie de "economia dos riscos". Os alertas sobre a formação de uma bolha multiplicam-se, mas a marcha da insensatez segue o seu curso. O momento não é dos mais recomendáveis para aquisição de imóveis. Por mais que tenha ocorrido aumento na renda, esse aumento não tem sintonia com os preços que estão a ser praticados. É assim que as bolhas são infladas. E, ao que parece, nesse sentido, de algum modo, determinadas formas de gestão do Programa Minha Casa Minha Vida têm contribuído para a geração desse quadro anômalo - formas de gestão, que fique claro, não a matriz originária do Programa. Isto porque a má execução desse Programa gera uma situação inflacionária em decorrência de um conjunto de variáveis, que envolve empreiteiras e o setor bancário, com este exorbitando o valor dos financiamentos com juros extorsivos, fato responsável pelo completo divórcio entre a renda e o preço real das coisas. A matéria abaixo, tendo em conta o Recife, e fazendo um comparativo com os EUA, bem evidencia os aspectos anômalos que estão a transformar a economia dos imóveis em "economia dos riscos".

O surreal preço dos imóveis no Recife


O preço dos imóveis no Recife disparou. Nos últimos 12 meses, aumento foi superior a 12%, segundo o índice FipeZap

Por Pierre Lucena 
Que está elevado o preço dos imóveis no Recife, não é novidade para ninguém. Nos últimos anos, o valor dos imóveis no Brasil disparou, e o Recife não ficou de fora.
Para termos uma ideia, na última pesquisa que fiz, ainda em junho, patrocinada pelo IPMN e publicada no Acerto de Contas, o preço do metro quadrado na capital pernambucana estava em mais de R$ 5 mil. De acordo com o índice FipeZap, que mede os preços praticados em 16 cidades brasileiras, o valor médio do metro quadrado subiu mais de 12% nos últimos 12 meses, tendo como referência o mês de outubro.
Mas o que impressiona é quando comparamos com imóveis em outras regiões do mundo. O site Estamos Ricos fez comparação semelhante, chamando a atenção de todos.
Vamos pegar o caso mais flagrante:
Casa na Flórida, EUA

Imagine morar nesta casa, no Estado da Flórida, nos Estados Unidos. Fica em Fort Piece, entre Miami e Orlando, em uma cidade muito agradável. Como diz o anúncio:
“A casa tem quatro quartos, três banheiros, garagem fechada para um carro, e é moderna com tudo o que poderia imaginar – ar condicionado central, máquina de lavar louça, lavador e secador de roupas e janelas grandes que deixam a luz natural entrar na casa.”
Pois bem….esta casa está custando US$ 110 mil. Em reais, fica pouco menos de R$ 250 mil. Isso ainda pode ser financiado a uma taxa de juros em percentual próximo à metade do Brasil.
E o que compramos com este mesmo dinheiro em Recife?
Fui procurar em sites de vendas e encontrei algumas comparações interessantes. Encontrei uma casa de R$ 250 mil, no bairro do Ipsep. Não é nem o mais caro, nem o mais barato da cidade.
A comparação é chocante.
Para começar, estamos falando de uma diferença estrutural de bairro que nem merece comparação. Além disso, é o mesmo que comparar os estádios de futebol antigos com uma arena europeia.
Se você achar que está muito longe, pode comprar uma casa similar em Miami Beach, o lugar mais caro da Florida. Está saindo por menos de US$ 250 mil. Algo próximo a R$ 560 mil. Com este valor você nem pensa em comprar uma casa pequena em Boa Viagem. Sairá o dobro disso.
Na verdade, o preço dos imóveis no Brasil chegou a um patamar surreal. Esta precificação fora da realidade é função basicamente de dois fatores: aumento de renda da população e diminuição da restrição creditícia (financiamento abundante). Some-se a isso uma enorme demanda reprimida da classe média por imóveis, temos esta equação onde a renda real das pessoas é incapaz de explicar o patrimônio adquirido de imóveis.
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Fonte: http://blogs.diariodepernambuco.com.br/licoesdebolso/o-surreal-preco-dos-imoveis-no-recife/

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