Por ocasião da morte de Merleau-Ponty, Paul Ricoeur afirmou que o 'inacabamento de uma filosofia do inacabamento é duplamente desconcertante'. A inquietação do pensamento na senda do mistério do mundo e na marcha da razão. Na 'cor do tempo quando passa', o eterno é a própria vida. Fenomenologia de Merleau-Ponty, nas pegadas de Husserl. Vale a leitura do texto abaixo. Transcendental encarnado? A nouvelle ontologie.
O transcendental encarnado: Merleau-Ponty e a Nouvelle
Ontologie1
Claudinei Aparecido de Freitas da Silva (UNIOESTE)
1
Qual é o estatuto da
relação entre o transcendental e o empírico? Um pode sobrepor-se ao outro? Em
que medida um tal inventário, desde já, enseja uma reformulação da teoria
clássica do conhecimento e, portanto, da própria subjetividade?
Como se sabe, esse
estado de questão passa a assumir, desde a modernidade metafísica (sobretudo
com Kant), uma enunciação decisiva, reanimando-se, no debate filosófico
contemporâneo, sob um giro crítico de inflexão absolutamente radical. A obra de
Merleau-Ponty é um dos esforços que protagoniza, substancialmente, essa
intrépida reviravolta ao pautar uma nova agenda transcendental que vemos pôr-se
a caminho desde La Structure du Comportement em que as relações entre a consciência e a natureza2 se
tornam um estado de questão privilegiado. Será, então, necessário, tanto para
além do naturalismo quanto do criticismo, compreender a estrutura mais profunda
entre o fato e a essência, o a priori e
o a posteriori sem
se condicionarem absolutamente. Entre essas ordens não há subsunção ou
justaposição. Ambas se compreendem, antes, sob outra lógica: a de um movimento
dialético pelo qual se correlacionam sem se desprender ou desintegrar da
existência mais profunda que nos define, isto é, da "realidade carnal das
coisas"3. É por isso que
Merleau-Ponty, já no contexto de sua obra inaugural de 1942, reconfigura,
partindo do idealismo fenomenológico transcendental de Husserl, a "ideia
de uma filosofia transcendental, ou seja, a da consciência como constituindo o
universo diante dela e apreendendo os próprios objetos numa experiência externa
indubitável"4. Essa ideia radicalmente
nova – admite o filósofo – se torna, pois, nesse momento, uma aquisição
definitiva enquanto primeira fase da reflexão. Ora, na contramão do idealismo
crítico, observa ele, "a consciência transcendental, a plena consciência
de si não está inteiramente feita, está por fazer, ou seja, por realizar na
existência"5, já que "o sujeito
não vive num mundo de estados de consciência ou de representações a partir do
qual acreditaria poder, por uma espécie de milagre, agir sobre as coisas
exteriores ou conhecê-las. Vive num universo de experiência, num meio neutro
relativamente às distinções substanciais entre o organismo, o pensamento e a
extensão; vive num comércio direto com os seres, com as coisas e com seu
próprio corpo"6.
É fundamentalmente
esse projeto idealizado sob um novo escopo transcendental que vai se maturando
no contexto dos escritos subsequentes de Merleau-Ponty. Projeto que passa a ser
concebido nos termos de uma "redefinição da situação humana para melhor
ver as tarefas da razão"7. É essa "tomada de
consciência mais radical"8, reitera o filósofo, que
deve orientar o sentido último da racionalidade para além de todo abismo
intransponível entre "sujeito" e "objeto",
"razão" e "experiência". Tais planos não se circunscrevem
mais sob uma mera "relação de conhecimento" conforme imputava o
idealismo clássico, mas uma "relação de ser". Como vemos, o que
Merleau-Ponty pauta nesse momento programático de sua pesquisa é uma nova
gramática, um novo discurso ontologicamente exequível no sentido de que há
outra "teoria do conhecimento por recomeçar"9, teoria, a bem dizer,
explicitamente ontológica. Por meio desse "recomeço", o discurso
filosófico passa a enunciar outro referente; um referente não mais
extramundano, isto é, conceitualmente abstraído numa etérea análise
transcendental. Trata-se, agora, de um discurso que não se transporta mais para
a "atmosfera rarefeita da introspecção ou para um domínio numericamente
distinto daquele da ciência"10. ele passa a figurar, a
bem da verdade, outra feição: é um discurso que fala "do mundo, dos homens
e do espírito"11, cuja enunciação
transcendental exprimirá uma ordem de experiência bem mais efetiva e íntima: a
interrogação ontológica de nossa encarnação. Nessa projeção, o estatuto da nova
filosofia transcendental posta aqui em curso fixará outra exigência da qual
toda "procura das condições de possibilidade é, por princípio, posterior a
uma experiência atual e concreta do mundo"12; experiência que,
originariamente, constitui o coração de toda transcendência desde onde pulsam
nossas operações cognitivas ou coagulam nossas representações mais verossímeis.
É mediante o retorno
a essa experiência-matriz que o discurso filosófico prepara, conforme
acompanhamos, um imprescindível recomeço: a questão transcendental se reinventa
numa nova densidade especulativa que viria, semanticamente, subverter a própria
agenda fenomenológica inaugurada por Husserl no momento em que ele daria
audiência à empresa de um idealismo fenomenológico transcendental com todo o
vigor que uma filosofia de rigorpoderia comportar.
2
Parece incorrer,
irremediavelmente, numa grave heresia fenomenológica... Como transpor, para
além dos marcos fixados por Husserl ou até mesmo por Heidegger, a fronteira
entre o transcendental e o empírico? Merleau-Ponty não estaria se tornando mais
uma vítima da ilusão retrospectiva do naturalismo ou, ainda, quem sabe, prestes
a afundar seu novo programa filosófico na areia movediça ou no pântano do
irracionalismo?
Ora, tais suspeitas
tendem a se dissipar quando se adentra, mais meticulosamente, nos escritos
merleau-pontyanos, buscando compreender o estatuto ou a semântica mais
profunda, pela qual Merleau-Ponty torna legível a expressão de seu projeto
filosófico. A retomada do tema da diferença ontológica é reconstruída
criticamente pelo filósofo, por flagrar-se, ainda, como signo recalcitrante de
um limite cartesiano: "não há nenhuma diferença absoluta" – assevera ele – "entre o
transcendental e o empírico, o ontológico e o ôntico"13. Por meio dessa enfática
e curiosa asserção esboçada numa nota de Le
Visible et l'Invisible, Merleau-Ponty
adverte que não existe fala filosófica absolutamente pura. Afinal, "não
atingimos o universal abandonando nossa particularidade, mas fazendo dela um
meio para alcançar os outros, em virtude de uma afinidade misteriosa que faz
com que as situações se compreendam entre si"14. Merleau-Ponty, desde
logo, põe as cartas na mesa: "não somos obrigados a
priori a investir o mundo das condições sem as quais ele
não poderia ser pensado"15. A questão inicial é que,
para que o próprio mundo possa ser pensado, jamais devemos ignorá-lo, uma vez
que ele se torna antes de qualquer pensamento o dado fundamental pelo qual ele
ganha alguma existência para mim. Sob esse critério, não se vê em que sentido
caberia fixar as condições de uma experiência se antes "a operação que a
torna atual ou pela qual ela se constitui"16 não
venha à tona em sua efetividade ou gratuidade mais plena. Postas tais
condições,
O verdadeiro
transcendental não é o conjunto das operações constitutivas pelas quais um
mundo transparente sem sombras e sem opacidade se exporia diante de um
espectador imparcial, mas a vida ambígua em que se faz a origem (Ursprung)
das transcendências, que, por uma contradição fundamental, me põe em
comunicação com elas e, sobre esse fundo, torna possível o conhecimento17.
Não resta a menor
dúvida de que o que temos agora à nossa frente é a emergência de uma nova
gramática transcendental. A filosofia não pode mais se restringir aos limites
de um discurso especulativamente dualista entre a razão e a experiência, o fato
e a essência – discurso, caricatura Merleau-Ponty – de "uma filosofia em
parte dupla, notável em toda doutrina do entendimento em que se salta de uma
visão naturalista (aquela que exprime nossa condição de fato) para uma dimensão
transcendental em que todas as servidões estão revogadas de direito"18. Ora, o que explica esse
aspecto sintomaticamente bipolar do pensamento moderno da subjetividade?
A questão nevrálgica
é que "a análise reflexiva se encontra inteiramente repousada numa ideia
dogmática do ser"19, quer dizer, "a
reflexão não acredita ter de fazer uma genealogia do ser, ao contentar-se,
apenas, em investigar as condições que o tornam possível"20. Desse modo, observa
Merleau-Ponty, a própria análise reflexiva termina por "ocultar o nó vital
da consciência perceptiva na medida em que tão somente investiga as condições
de possibilidade do ser absolutamente determinado, deixando-se tentar por essa
pseudo-evidência da teologia de que o nada não é coisa alguma. Os filósofos que
a praticaram sempre sentiram, pois, que havia algo a procurarabaixo da consciência absoluta"21. "Eis então a
razão", atesta Merleau-Ponty, "porque a fenomenologia é a única entre
todas as filosofias a falar de um campotranscendental [...]. É notório ver como as
filosofias transcendentais do tipo clássico nunca se interrogam sobre a
possibilidade de efetuar a explicitação total que elas sempre supõemfeita em
algum lugar"22. Elas renunciam, a rigor,
a uma verdadeira interrogação ontológica de suas premissas no momento em que
não se dão conta de que "a distinção entre o uso empírico e o uso
transcendental mais mascara a dificuldade do que a resolve"23. Ora, pois, "na
medida em que nos ocupamos com estruturas mais integradas, percebemos que cada
vez menos as condições dão conta do condicionado"24. Esse flagrante fracasso
do projeto clássico transcendental evidencia que há, na verdade, entre o a
priori e o a posteriori25 uma
trama comum, já que a "idealidade pura não existe sem carne e nem liberada
das estruturas de horizonte"26. Aí, um novo "campo
transcendental é aberto"27, enquanto dimensão
estruturante, cuja base de apoio põe a nu o fato de que a condição e o
condicionado perfazem um só círculo, uma só relação recíproca, fazendo entrever
uma circularidade entre a reflexão e o irrefletido28. Ora, todo sistema de
condições a priori jamais
pode, de direito, elevar-se ao fato e, desse modo, suspender o domínio mais
efetivo desde onde, ele próprio, se constrói: a facticidade. É que essa última
deixou, há tempo, de ser um mundo à parte; uma espécie, digamos, de submundo,
um meio impuro filosoficamente injustificável. Tudo agora consiste em
compreender em que sentido as filosofias reflexivas terminam por escamotear a
verdadeira natureza do transcendental. Sendo assim, como então o âmbito da
facticidade parece transtornar, por completo, a exigência transcendental em sua
motivação clássica?
3
Em tal contexto ao
qual Merleau-Ponty aqui nos transporta, um dos caminhos a ser perseguidos nessa
destinação do argumento transcendental é a via privilegiada concernente ao
estatuto último da ideia de subjetividade. Essa instigante pista já abre, de
passagem, um contundente diagnóstico crítico a duas figuras paradigmáticas da
noção clássica de sujeito, a saber, o empirismo e o intelectualismo. Conforme
avalia Merleau-Ponty, o que falta
ao empirismo é a
conexão interna entre o objeto e o ato que ele desencadeia. O que falta ao
intelectualismo é a contingência das ocasiões de pensar. No primeiro caso, a
consciência é muito pobre; no segundo, é rica demais para que algum fenômeno
possa solicitá-la [...].
O empirismo permanece na crença absoluta no mundo enquanto totalidade dos
acontecimentos espaço-temporais vindo a tratar a consciência como um cantão
desse mundo. Por outro, a análise reflexiva rompe com o mundo em si, já que ela
o constitui pela operação da consciência29.
Essa dupla carência,
aqui diagnosticada, não é o registro de apenas um momento ou de um período
exclusivo da história do pensamento. No âmbito do próprio circuito fenomenológico,
ela somatiza um mesmo sintoma do qual não só Husserl, mas, inclusive, Sartre
viria a se tornar, retrospectivamente, vítimas. Na contramão de Husserl,
Merleau-Ponty sentencia:
O centro da filosofia
não é mais uma subjetividade transcendental autônoma situada em todas as partes
e em parte alguma. Tal centro se encontra no começo perpétuo da reflexão, ou
seja, naquele ponto em que uma vida individual se põe a refletir sobre si
mesma. A reflexão só é verdadeiramente reflexão se não se arrebatar para fora
de si mesma; se, ainda, se reconhecer como reflexão-sobre-um-irrefletido e, por
conseguinte, como uma mudança de estrutura de nossa existência30.
No que cabe a Sartre,
será preciso também rejeitar o ideal de uma subjetividade que assume a forma de
um saber reflexionante puramente negativo fundado na ideia do "nada"
'"que vem ao mundo', bebe o mundo, precisa do mundo para ser o que quer
que seja, mesmo nada, e que, no seu autosacrifício ao ser, permanece estranho
ao mundo"31. No fundo, Merleau-Ponty
remodela cada uma dessas imagens da subjetividade, como ícones de uma só
cosmovisão teórica: o "pensamento de sobrevoo". Pensamento tipificado
na figura do filósofo ou do cientista enquanto kosmothéoros, isto é, enquanto sábio que eleva sua atividade a
um poder absoluto e imparcial de contemplação, pairando sobre o mundo e, sob
essa medida, mantendo-se impermeável a ele e às coisas sem, contudo,
habitá-las. Tudo se passa – observa Merleau-Ponty – "como se o senso comum
e os filósofos tivessem durante muito tempo tomado por modelo e ideal de conhecimento
humano nossa contemplação dos objetos inanimados, das coisas indiferentes de
tal modo que não nos tocassem"32. ora, se é assim, a
partir de qual fonte podemos haurir a verdadeira subjetividade, sem apelo a
alguma figura do kosmothéoros?
A alternativa
trilhada por Merleau-Ponty é a de uma nova aposta transcendental explorada, num
primeiro momento, pela ideia de que o Cogito traduz outra experiência de transcendência: ele se
revela como uma "estrutura global, total"33. Quer dizer, ele se
insurge como uma "nova forma de unidade"34, já que "o homem não
é um animal racional"35 ou
um espírito puro, mas, em sua revelação última, espírito encarnado, corpo. Por
isso, "ser uma consciência, ou, antes, ser
uma experiência, é comunicar interiormente com o
mundo, com o corpo e com os outros, ser com eles em lugar de estar ao lado
deles"36. Experiência que deflagra
um movimento de coexistência pondo à prova o ideal de um Eu penso universal
transcendentalmente desencarnado. Nessa perspectiva, a distinção entre o
factual (ôntico) e o estrutural (ontológico) não se impõe mais enquanto
critério absoluto de justificação, já que o transcendental não pode manter-se
indiferente ao seu coeficiente de facticidade. Tal coeficiente se torna, desde
então, uma exigência ontológica inalienável, pois a "simples transposição
do sujeito encarnado em sujeito transcendental"37, tal qual promovia o
idealismo, é uma abstração que esquece e perde a concretude da experiência
efetiva do mundo. O mundo que aqui redescobrimos, mostra Merleau-Ponty, não
constitui aquilo que eu penso ou possuo, mas aquilo que eu vivo; horizonte
desde onde me abro e me comunico incessantemente38. Não há mais
"evidência absoluta liberada de toda facticidade"39, pois o que se
redescobre, agora, é que a operação transcendental já pressupõe um movimento de
engajamento, uma práxis subjacente ao seu próprio exercício. Ela está envolta
naquele movimento de circularidade ou simetria entre a condição e o
condicionado. Por isso, ela jamais poderá manter-se, a
priori, indiferente à abertura e à comunhão
com o mundo. Se a subjetividade não se condiciona mais a uma investigação
puramente cognitiva no sentido clássico de uma teoria do conhecimento, é
porque, a essa altura, Merleau-Ponty visa, naturalmente, qualificar outra ideia
de subjetividade. Trata-se, aqui, não mais de um "sujeito"
absolutamente "puro", mas, antes, consagrado, uma vez que ele é uma "consciência
que vive nas coisas"40, um "modo de
consciência mais originário"41 e
inscrito, portanto no mundo enquanto "estrutura concreta e encarnada"42. Noutros termos, se
"a posse de si, a coincidência consigo não é a definição do
pensamento"43, se, não há, ainda,
"atrás da linguagem um pensamento transcendente"44, é porque já nos
encarnamos num horizonte de mundo, atestado pela experiência do corpo. Ao mesmo
tempo, se a subjetividade não se reduz a uma mera "série de atos
psíquicos" ou não se conforma numa unidade sintética, é porque ela é a
experiência de uma única "'coesão de vida', uma única temporalidade que se
explicita a partir de seu nascimento e o confirma em cada presente. É esse
advento ou, ainda, esse acontecimento transcendental, que o Cogito reencontra"45.
4
A esta altura, já é
visível ao leitor o quanto Merleau-Ponty confere atenção a dois temas
fundamentais mediante os quais a experiência transcendental do cogito é reelaborada, sob o horizonte, é claro, de uma
filosofia da carnalidade. O primeiro nível temático é a experiência do
"tempo" e o segundo, a experiência do "corpo". Trata-se de
dois campos temáticos que se entrecruzam na audiência que recebem,
particularmente, na Phénoménologie de la Perception, cujos limites teóricos não demarcaremos aqui. O
que, por ora, se discutirá é a devida procedência dessa constelação temática e
a fecundidade especulativa que ela promove no contexto da obra tardia do
filósofo. Merleau-Ponty projetará o advento do tempo para além de sua figuração
clássica seja enquanto um conceito seja enquanto, em sentido kantiano, uma
estrutura a priori.
Que papel transcendental o tempo, aqui, cumpre? Ele se revela como uma
experiência privilegiada de nossa relação de princípio com o mundo. Nessa
medida, uma verdadeira filosofia transcendental, reconhece Merleau-Ponty, será
aquela que jamais prescindirá de "atribuir à finitude uma significação
positiva"46, quer dizer,
"nenhuma filosofia pode ignorar o problema da finitude, sob pena de
ignorar-se a si mesma enquanto filosofia"47. essa tese apenas
endossa, significativamente, aquele grau de coeficiente inerente a toda
facticidade: o de que "eu não sou o autor do tempo, assim como não sou
autor dos batimentos de meu coração. Ora, não sou eu quem toma a iniciativa da
temporalização; eu não escolhi nascer e, uma vez nascido, o tempo funde-se
através de mim, o que quer que eu faça"48. A temporalidade se
torna, originariamente, o "fundamento e a medida de nossa espontaneidade,
isto é, a potência de ir além e de 'niilizar' que nos habita [...] uma vez que
somos o surgimento do tempo"49.
O argumento de que se
vale Merleau-Ponty é o de que é preciso "compreender o tempo como sujeito
e o sujeito como tempo [...] já que a subjetividade não está no tempo, mas vive
o tempo"50. "Sujeito" e
"tempo" exprimem um só fenômeno, perfazem uma só dialética,
inscrevem-se numa só coesão, fundação de toda síntese perceptiva. O que
vislumbramos, portanto, é uma carne do tempo capaz de subverter a própria ideia
de "reflexão". Ao tecer a trama da experiência, ele – o tempo – se
torna, em sentido próprio, o "sujeito transcendental" a que se
buscava, ou seja, aquilo que nos permite "compreender exatamente a
pertença do mundo ao sujeito e do sujeito a si mesmo: uma cogitatio que torna possível a experiência"51. É ele – o tempo – a
experiência-matriz com a qual o "sistema eu-outrem-mundo" compõe um
todo único, desconstruindo, de um só golpe, o ideal de subjetividade como ser
eternitário, psicológico ou constituinte. Mais do que isso: se o tempo não se
dobra a um espectador absoluto, é porque enuncia, em última análise, uma
experiência de "anonimato": a rigor, inominável ou representável, o
tempo não é "para" alguém, mas "é" alguém. Só assim,
descreve Merleau-Ponty, teremos "o tempo por inteiro e estaremos presentes
a nós mesmos porque estamos presentes no mundo"52. É esse acordo entre o
transcendental e o mundo53 assegurado
pela "passagem do tempo" que permite compreender a
"existência" como "encarnação". É essa a "tese
subentendida", mediante a qual se pode, agora, considerar que "a
existência efetiva de meu corpo é indispensável à de minha consciência"54. É a experiência do corpo
que agora entra em cena, em meio a esse novo domínio transcendental
perspectivado, como vimos, pela experiência da finitude.
5
Merleau-Ponty retoma
e aprofunda, no contexto de um novo debate transcendental, o peso ontológico da
experiência da corporeidade no momento em que visa dar corpo àquela
"teoria do cogito e
da reflexão" anunciada, como vimos, na Phénoménologie
da Perception – teoria que passa a radicalizar, na segundo metade
dos anos 1950, uma decisiva tônica programática: o projeto de uma
"reabilitação ontológica do sensível"55. A noção
fenomenológicoexistencial de um "cogito situado" e encarnado temporalmente já
presumia, na verdade, o surgimento de "um sujeito abaixo de mim, para quem
existe um mundo antes que ali eu estivesse, e que marcava lá o meu lugar"56. esse "sujeito"
é o "corpo", circunscrito em toda a sua radicalidade ontológica, isto
é, como um fenômeno manifesto "em pessoa", "em carne e
osso (leibhaft)"57. Assim, na experiência
tátil "não sou eu que toco, é meu corpo; quando toco, não penso um
diverso, minhas mãos encontram um certo estilo que faz parte de suas
possibilidades motoras, e é isso que se pode dizer quando se fala de um campo
perceptivo: só posso tocar eficazmente se o fenômeno encontra um eco em
mim"58. a partir de Signes, essa ilustração se radicaliza ainda mais: de sua
abstrata desfiguração (no pensamento clássico) à expressiva transfiguração, o
"corpo" que agora entra em cena se revela sob a forma de um enigma
fundamental, segundo o qual meu corpo é, simultaneamente, vidente e visível,
quer dizer, "ele se vê vendo, toca-se tocando, é visível e sensível para
si mesmo"59. Essa metamorfose ou
paradoxo constitutivo deflagrado na experiência do corpo apenas atesta que a
reflexão não se consome num puro ato intelectual. A reflexão deixa, por assim
dizer, de ser um apanágio da consciência para, enfim, propagar-se
estesiologicamente, corporalmente. O corpo se transfigura, admiravelmente, como
uma espécie de "'coisa senciente', 'sujeito-objeto'"60. Trata-se, na verdade, de
uma transfiguração que transcende os limites de todo solipsismo:
Se, ao apertar a mão
de outro homem, tenho a evidência de seu ser-aí, é porque ela se coloca no
lugar de minha mão esquerda: meu corpo se anexa ao corpo do outro nesta
'espécie de reflexão' da qual ele é paradoxalmente a sede. Minhas duas mãos são
'co-presentes' ou 'coexistem' porque são as mãos de um só corpo: o outro
aparece por extensão dessa co-presença. Ele e eu somos como os órgãos de uma só
intercorporeidade61.
Como vemos, o que o
enigma do corpo prefigura é uma percepção mais abrangente, quer dizer, a
experiência dos "outros em seu aparecimento na carne do mundo"62. Como descreve
Merleau-Ponty, os outros antes de serem submetidos às minhas condições de
possibilidade e reconstruídos à minha imagem, é preciso que estejam lá (na
própria carne do mundo) como relevos ou desvios, isto é, como variantes de uma
única Visão da qual também participo63. Nessa extensão, aquele
paradoxo se amplifica consideravelmente: se a corporeidade se desliza para um
"meio" que ela não ocupa sozinha, é porque se encontra co-presente
com outros corpos, aclimatada às próprias coisas. A minha carne e a carne do
outro fundam uma só estrutura, isto é, refazem e prolongam aquela coesão de
princípio tecida umbilicalmente pela Carne do Mundo. Assim, a experiência do
corpo anuncia, a bem da verdade, outra experiência mais ampla da qual ele se
torna uma variante exemplar: a Carne. Em meio a essa perspectiva, a partir de
agora, por meio da reconfiguração da experiência do corpo, a noção de carne
parece cumprir, cada vez mais, uma significação inédita do ponto de vista desse
novo empreendimento transcendental que Merleau-Ponty eleva sob uma exigência
ontologicamente radical.
É desse modo que
chegamos, então, ao nervo de nossa questão condutora: – Que estatuto é esse, de
um transcendental imerso numa experiência mais integral, um
"transcendental", por assim dizer, "encarnado"?
6
Como vemos, a
destinação do argumento transcendental conduzida até aqui por Merleau-Ponty se
inscreve, decididamente, nos termos de uma nova teoria do ser cujo emblema é a
noção de Carne. Ora, qual é a originalidade dessa noção e em que medida ela
cumpre ou satisfaz aquela pretendida exigência transcendental?
A noção de carne,
perspectiva Merleau-Ponty, é o tema nuclear que o século XX restaura e
aprofunda64. Por isso, ela se projeta
como "um tema totalmente diverso"65, quer dizer, é o
"inventário de uma experiência"66 jamais
traçada, pela tradição filosófica como uma linha de força decisiva.
Merleau-Ponty passa a figurá-la como uma espécie de "massa opaca"67, ou seja, uma "massa
interiormente trabalhada [...] constituindo, portanto, o meio formador do
objeto e do sujeito"68. Ela é o "Ser de
entremeio ou entre-dois, um interser"69, o Ser de indivisão, a
intersensorialidade mais geral pela qual o visível e o invisível, o dizível e o
indizível se mesclam solidariamente. Ela é o sistema de inervação, cujo grau
estesiológico, intensivamente mais amplo, traz à tona não uma essência
inteligível, mas a forma de um sensível exemplar que reveste toda idealidade,
cujas estruturas não residem mais numa consciência constituinte, mas em nossa
comunhão corporalmente irrefletida e, por isso mesmo, consanguínea com o mundo.
Tudo isso só é possível porque "trazemos em nosso ser encarnado o alfabeto
e a gramática da vida, mas que nem em nós, nem nela supõe sentido algum
definitivo"70. Trata-se de uma
gramática imperiosa do Ser, exprimirá Merleau-Ponty, não traduzida em sua
significação última pelo vocabulário clássico da metafísica. Gramática
verdadeiramente transcendental, já que ela se torna a origem de toda
transcendência, sem abstenção alguma à nossa relação de princípio com o mundo.
Ora, em que pese seu mérito, a consciência não é tudo, não pode tudo; não
abarca a totalidade do real, ignorando, conforme os termos de Husserl, a
"presença sensível e carnal do mundo em nós-mesmos"71. Nessa perspectiva, a
verdadeira filosofia transcendental só pode encontrar a sua radicalização
máxima aí, isto é, em meio a essa adesão íntima e originariamente carnal de
nossa experiência mais efetiva. Pensar a Carne como Ser de transcendência é
refazer, mais propriamente, esse círculo de nossa conaturalidade com o mundo,
com o outro, com as coisas. É interrogar o sentido mais profundo de "nossa
encarnação numa natureza"72.
Eis, então, em linhas
gerais, o sentido desse recomeço de uma nova teoria transcendental: o caráter
irrevogável pelo qual a vida ambígua se faz corpo ou, se se quiser, se faz
carne. Ora, é exatamente essa projeção anticartesiana que a noção
merleau-pontyana de Carne viria explicitar enquanto reconquista de uma nova
significação da subjetividade e, portanto, do sentido último da tarefa
transcendental. Nas palavras de Dupond:
O cogito não é o fundamento transcendental da luz do mundo:
ele tenta recolher e expressar em palavra a essência da verdade assim como ela
se anuncia na luz do mundo. além disso, o cogito é, sobretudo, um outro nome, uma outra expressão
dessa luz do fenômeno cujo nome é, do lado do ser, a carne. O pensamento do cogito e o pensamento da carne são inseparáveis. E é, por
isso, que é impossível saber o que Merleau-Ponty entende por cogito sem explicitar também o que ele chama de carne73.
Dessa maneira, se
toda reflexão, conforme ilustra Merleau-Ponty, tem por modelo a mão palpante
através da mão palpada, é porque precisamente aí já nos encontramos
circunscritos num novo domínio transcendental, cuja base é manifestamente
ontológica. Assistimos à deflagração de uma generalidade aberta, prolongamento
do volante do corpo, já que a experiência do corpo testemunha o caráter de
unidade de nós mesmos, aprofundando nossa inserção no mundo em face de Outrem.
O corpo se transfigura enquanto "totalidade aberta"74, cuja "carne nos faz
compreender a carne do mundo"75. É sob tal condição que
há "abertura de nossa carne imediatamente preenchida pela carne universal
do mundo"76 enquanto
campo privilegiado de transcendência. Como diz Merleau-Ponty, a Carne prefigura
esse "enigma do sensível, essa tele-visão, que, no mais privado de nossa
vida, nos torna simultâneos com os outros e com o mundo"77. É esse caráter de
simultaneidade que vem transformar, por completo, o estatuto das relações entre
o transcendental e o empírico. Por isso, problematiza Merleau-Ponty acerca do
caro tema husserliano: "se o transcendental é intersubjetividade, como
evitar que as fronteiras do transcendental e do empírico se entrelaçam?"78. Ora, como já vimos, não
há absolutamente como desintegrar a subjetividade da facticidade. Sob esse
prisma, é preciso reconhecer que "o transcendental desce à história, ou,
se preferir, o histórico deixa de ser relação exterior de dois ou vários
sujeitos absolutamente autônomos"79.
Merleau-Ponty exibe
aqui, em plena luz, o caráter intersubjetivo do transcendental. Ora, se o
sujeito é, concretamente, projeto e "inerência ao mundo"80, é porque o próprio Mundo
se transfigura, em carne e osso, como o "verdadeiro transcendental"81. É a partir desse
coeficiente de facticidade que o Outro se revela enquanto aquela extensão
irrecusável de mim mesmo. Assim, a situação histórica e intersubjetiva jamais
encerra este pacto com o mundo. Ela confirma apenas a anuência de que o mundo
é, desde sempre, seu princípio de transcendência. O transcendental
transfigurado agora carnalmente dá a conhecer uma alteridade radical que, em
sua mais genuína aparição, se revela como carne de minha carne. Razão pela qual
aquela metamorfose que presenciávamos entre o vidente e o visível, entre meu
corpo e o corpo do outro, minha carne e a carne do mundo, se torna,
significativamente, nesse momento, o gesto ou a expressão mais originária do
enigma da subjetividade. Se a reflexão toma de empréstimo todas essas estruturas,
é porque, a essa altura, "minha encarnação não é mais uma 'dificuldade',
ou seja, um defeito no diamante transparente da filosofia, mas o fato típico, a
articulação essencial de minha transcendência constitutiva"82. Ambos, visível e
invisível perfazem um só círculo, circunscrevem um só campo de transcendência,
ensaiam e prolongam o enigma perpétuo de uma só dublagem ontológica. Aqui, não
há mais "espiritualismo, mas filosofia da carne e do intercorporal como
direito e avesso do mesmo Ser"83.
De sua obra inicial à
sua obra tardia, Merleau-Ponty jamais perde de vista, pelo menos, um claro
propósito filosófico: o de que a encarnação e a transcendência perspectivam uma
só "experiência integral, ou seja, a inerência de si ao mundo ou do mundo
a si, de si ao outro e do outro a si"84. É esse
"entrelaçamento de minha vida com as outras vidas, de meu corpo com as
coisas visíveis, pela confrontação de meu campo perceptivo com aquele dos
outros, pela mistura de minha duração com as outras durações"85 que
se torna a condição sine qua non,
inabdicável. A consciência abdica de ser uma "operação cognitiva e
desinteressada"86 para
fulgurar-se numa nova ordem de relação na qual Merleau-Ponty sempre persistira:
"a relação do sujeito e do objeto não é mais estarelação de
conhecimento de que falava o idealismo clássico e no qual o
objeto aparece sempre como construído pelo sujeito, mas uma relação
de ser segundo a qual, paradoxalmente, o sujeito é seu corpo, seu mundo e sua situação, vindo, de
certa forma, a se permutar"87. Ora, era justamente essa
"resistência à passividade que o criticismo não concedia, em última
análise, nenhuma importância [...] uma vez que ele subentendia que o pensamento
do filósofo não está submetido, pois, a nenhuma situação"88. Por isso, não se trata
mais de "explicar o mundo ou dele descobrir as 'condições de
possibilidade', mas de formular uma experiência do mundo, um contato com o
mundo que precede todo pensamento sobre o mundo"89. Nessa
direção, a tarefa transcendental esboçará outro condicionamento, dessa vez,
decididamente ontológico: não se orientará mais pelas "condições de
possibilidade, mas pelas condições de realidade"90 em
que "existe um sentido autóctone do mundo que se constitui no comércio de
nossa existência encarnada com ele vindo a formar o solo de toda doação de
sentido (Sinngebung) decisória"91.
Nesse entremeio, se
"estamos misturados ao mundo e aos outros numa confusão inextricável"92, é porque já nos movemos
noutro terreno especulativo: estamos bem longe de uma ideia dogmática do ser
que se contenta em investigar tão somente as condições que o tornam possível.
Por essa razão, se há um ato transcendental por excelência, esse será aquele
que consiste em "retornar ao mundo vivido aquém do mundo objetivo [...]
restituindo à coisa sua fisionomia concreta"93. Nessa medida,
Uma filosofia se
torna transcendental, ou seja, radical, na medida em que não se instala numa
consciência absoluta sem mencionar os passos que conduzem a ela, mas
considerando-se a si mesma como um problema. Na medida ainda em que não
postular a explicitação total do saber, mas reconhecendo como problema
filosófico fundamental, esta presunção da
razão94.
A Carne é o que
metaforiza essa radicalidade transcendental do acontecimento, fazendo
compreender que o "ontológico" e o "ôntico" não são
exatamente contraditórios, mas coesos. Entre ambos não há cisão, colisão; mas
coesão, contrapartida secreta que os anima num só regime de promiscuidade.
Aqui, o percurso do transcendental se confunde com o percurso, como diz
Merleau-Ponty, das "sinuosidades do real". Não mais paralelismo: a
essência não se separa do fato; ela o acompanha em sua multiplicidade e em seu
envolver mais íntimo. Em sentido heraclitiano, banham-se no mesmo rio, num só
fulgor do acontecimento, num só devir perpétuo. Um não exclui o outro;
mesclam-se solidariamente, perfazendo, conforme a expressão de Kant, uma
"coesão sem conceito". Ora, o que significa dizer que a consciência
filosófica supõe um horizonte que a precede ou que só surge no interior de um
campo prévio? Significa, sobretudo, admitir que o entendimento não retira de si
mesmo a substância que tece sua cadeia de verdades, como faz a aranha com a sua
teia. O mesmo Espírito-Aranha a que, por ironia, Sartre se reportara
criticamente, mas de que ele próprio se tornaria uma vítima a mais da ilusão
retrospectiva de um pensamento que sobrevoa. Agora, vemos melhor em que medida
a Razão perde sua jurisprudência; não pode mais estabelecer-se enquanto
tribunal face à Experiência, reconstruída agora, transcendentalmente, em sua
significação ontológica. Que experiência então é essa, evocada em novo regime
transcendental? Ora, uma ordem sensível e primeira de nosso experimentar
simultâneo com o Ser, dirá Merleau-Ponty, e, portanto, irredutível egoicamente.
É uma experiência de textura, de imbricação, de promiscuidade, nervura comum ou
aderência mais íntima, na qual a reflexão com todas as suas estruturas
requeridas se efetiva indivisivelmente. Trata-se, mais uma vez, de um gênero de
experiência global, aquém de todo juízo ou operação intelectual – experiência
cuja interrogação transcendental terá o seu recomeço realocando-se na concretude
do humano, demasiadamente humano, para além de qualquer cosmovisão teísta,
antropológica, naturalista ou humanista. É dela que nasce o impulso vital no
qual o tempo e a corporeidade se fundem carnalmente, circunscrevendo uma só
estrutura do acontecimento.
Desse modo, o
mistério da encarnação95 deixa
de ser um absurdo, um escândalo a mais para a razão, ou ainda, um enigma
imperscrutável, incompreensível. O transcendental reconhece, aqui, seu
verdadeiro "DNA": a Carne, enquanto esse interminável "ciclo
completo"96, "tecido comum de
que somos feitos"97, de cujo cordão
umbilical, jamais somos cortados.
Referências
bibliográficas
DUPOND, P.
"Entre o mortal e o eterno: o cogito carnal". In: A
fenomenologia da experiência:
horizontes filosóficos da obra de Merleau-Ponty. Trad. R. V. Marques. Goiânia:
Editora UFG, 2006. p. 203-222.
[ Links ]
MERLEAU-PONTY, M. La structure du comportement. Paris: PUF, 1942.
[ Links ]
_____. Phénoménologie de la
perception. Paris:
Gallimard, 1945. [ Links ]
_____. Signes. Paris: Gallimard, 1960.
[ Links ]
_____. Le visible et l'invisible. Paris: Gallimard, 1964.
[ Links ]
_____. Résumés de cours: Collège de France
(1952-1960). Paris: Gallimard, 1968.
[ Links ]
_____. L'œil et l'esprit. Paris: Gallimard, 1985.
_____. La nature. Paris: Seuil, 1995.
[ Links ]
_____. Éloge de la philosophie. Paris: Gallimard, 1953.
[ Links ]
_____. Sens et non-sens. Paris: Gallimard, 1996.
[ Links ]
_____. Notes de cours (1959-1961). Paris: Gallimard, 1996.
[ Links ]
_____. Le primat de la perception et
ses conséquences philosophiques. Paris: Verdier, 1996.
[ Links ]
_____. Parcours (1935-1951). Lagrasse: Verdier, 1997.
[ Links ]
_____. Parcours deux (1951-1961). Lagrasse: Verdier, 2000.
[ Links ]
_____. Causeries
(1948). Paris: Seuil, 2002.
[ Links ] MOUTINHO,
L. D. S. "Tempo e sujeito: o transcendental e o empírico na
fenomenologia de Merleau-Ponty". In: Temporalidade
na Filosofia Contemporânea – Revista Dois Pontos vol.
1, nº 1, 2004, p. 11-57. silva, C. a. f. A
carnalidade da reflexão: ipseidade e
alteridade em Merleau-Ponty. São Leopoldo, RS: Nova Harmonia, 2009.
[ Links ]
_____. A
natureza primordial: Merleau-Ponty e o logos do mundo
estético. Cascavel, PR: Edunioeste, 2010 (Série Estudos Filosóficos, nº 12).
[ Links ]
---------------------------------
1Trabalho originalmente
apresentado no "XIII Simpósio de Filosofia Moderna e Contemporânea"
transcorrido no período de 27 a 31 de outubro de 2008 na UNIOESTE – Campus de Toledo e reapresentado, numa segunda versão, no
II Simpósio Merleau-Ponty na UNSAM, em Buenos Aires, no período compreendido
entre 7 e 8 de agosto de 2009.
2 MERLEAU-PONTY, M. La structure du comportement, p. 1.
3 MERLEAU-PONTY, M. La structure du comportement, p. 202.
25 Merleau-Ponty
observa, portanto, que a fenomenologia promove uma nova definição do a
priori: "Kant", diz ele, "já
mostrou que o a priori não
é cognoscível antes da experiência, quer dizer, fora de nosso horizonte de
facticidade, e que não se pode tratar de distinguir dois elementos reais do
conhecimento, dos quais um seria a
priori e o outro a
posteriori [...] A partir do momento em que a experiência –
quer dizer, a abertura ao nosso mundo de fato – é reconhecida como o começo do
conhecimento, não há mais nenhum meio de distinguir um plano das verdades a
priori e um plano das verdades de fato, aquilo que o mundo
deve ser e aquilo que efetivamente ele é" (MERLEAU-PONTY, M. Phénoménologie
de la perception, p. 255).
30 MERLEAU-PONTY,
M. Phénoménologie de la perception, p. 75-76. Trata-se, aqui, de escavar "uma
razão imanente à desrazão" (Idem, Sens
et non-sens, p. 87), já que a reflexão não se
separa do irrefletido, a não ser apenas para apanhá-lo. Nessas condições,
"reencontramos o irrefletido, mas o irrefletido ao qual voltamos não é o
que antecede a filosofia ou que antecede a reflexão; é o irrefletido
compreendido e conquistado pela reflexão" (Idem, Le
primat de la perception et ses conséquences philosophiques, p. 55-56). Assim, pois, conforme Moutinho,
"se é verdade que a reflexão desvela um irrefletido, é verdade também que
ela o desvela apenas a distância, sem que o sujeito possa fundir-se a ele. É
nesse sentido que ela é uma 'reflexão radical': o radicalismo de Merleau-Ponty
não é como o de Husserl, um alargamento do Ego, não é a operação de uma redução
que faça entrar o correlato na esfera transcendental; não é tampouco uma fusão
do sujeito com aquilo sobre que medita, com o 'sujeito irrefletido' que ele
busca conhecer; o seu radicalismo é, ao contrário, fazer que a reflexão seja
consciência de um irrefletido sobre o qual está plantada e do qual
depende" (MOUTINHO, L. D. S. "Tempo e sujeito: o
transcendental e o empírico na fenomenologia de Merleau-Ponty", p. 14).
39 MERLEAU-PONTY,
M. Le visible et l'invisible, p. 144. "Não é o Eu penso que contém
eminentemente o Eu sou. Não é minha existência que é reduzida à consciência que
dela tenho, é inversamente o Eu penso que é reintegrado ao movimento de
transcendência do Eu sou e a consciência à existência" (Idem, Phénoménologie
de la perception, p. 439).
53 "Não
é preciso tratar o Eu transcendental como o verdadeiro sujeito e o eu empírico
como sua sombra ou seu rastro. Se a relação entre eles fosse esta, poderíamos
retirar-nos no constituinte, e esta reflexão fenderia o tempo, ela seria sem
lugar e sem data" (MERLEAU-PONTY, M. Phénoménologie
de la perception, p. 487-488).
87 MERLEAU-PONTY,
M. Sens et non-sens,
p. 89. Trata-se de explorar a "inerência de mim ao mundo e de mim ao
outro; tal inerência é o que descreve esse paradoxo e essa confusão, fazendo ver o elo do sujeito e do mundo, do sujeito e dos
outros ao invés de explicar,
conforme faziam os clássicos, através do recurso ao espírito absoluto"
(Idem, op. cit., p. 74).
95 É
significativamente esse horizonte temático que consagramos em nossos dois
livros: A carnalidade da reflexão: ipseidade e alteridade em Merleau-Ponty. São
Leopoldo, RS: Nova Harmonia, 2009 e A
natureza primordial: Merleau-Ponty e o logos do mundo
estético. Cascavel, PR:
Edunioeste, 2010 (Série Estudos Filosóficos, nº 12).
------------------------
Fonte:
Nenhum comentário:
Postar um comentário