Um ano que vai, uma geração que se conta. A certa altura da vida, vai se tornando possível dar um balanço no passado sem cair em autocomplacência. Digo isto repisando Antonio Candido, no prefácio que escreveu à 26ª edição do clássico Raízes do Brasil, de Sérgio Buraque de Holanda. Os homens e mulheres que, hoje, contam um pouco mais de 35 anos e menos de 45, na área das Ciências Humanas, por certo, tomaram contacto, em sua formação, com a obra-mestra do pai de Chico Buarque. Eu que, quando a li, já tinha tido treino anterior em Marx, de par com a abordagem de Caio Prado Júnior em Formação do Brasil Contemporâneo, nunca cheguei a abonar a tese-lugar-comum que convencionou o estabelecimento de fronteiras entre três livros clássicos da formação brasileira: além dos dois citados, também Casa Grande e Senzala, de Gilberto Freyre. O valor das três obras parece hoje razoavelmente reconhecido. Mas só é assim porque, indo um ano, abre-se caminho para se contar uma geração. Ver o que não se via, dirão os historiadores analíticos da longa duração. E sem cair em complacência, pois, repetindo Antonio Candido uma vez mais, 'o nosso testemunho se torna o registro de muitos, de todos que, pertencendo ao que se denomina uma geração, julgam-se a princípio diferentes uns dos outros e vão, aos poucos, ficando tão iguais, que acabam desaparecendo como indivíduos para se dissolverem nas características gerais de uma época'. Por ser assim, registrar o passado já não é então falar de si; é, sim, falar dos que participaram de uma certa ordem de coisas, de interesses e de visão de mundo, no momento particular, específico, do tempo que se deseja evocar.
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