Sociólogo da Educação Basil Bernstein |
Por Lucíola Licínio de C. P. Santos
(Faculdade de Educação - UFMG)
Decidi
fazer o doutorado em Londres por diversas razões. A razão mais forte que me
levou a escolher o, então, Departamento de Sociologia da Educação do Instituto
de Educação da Universidade de Londres, foi identificar que nele trabalhava o
professor Basil Bernstein. É que havia lido, há algum tempo, um artigo de sua
autoria, sobre ''Códigos restritos e elaborados'', publicado em livro
organizado pela professora Zaia Brandão, que me impressionou fortemente, pois
versava sobre as diferenças de linguagem entre as pessoas das camadas populares
e as provenientes das classes médias e suas relações com o sucesso e fracasso
escolar. Apesar de este artigo ter sido, posteriormente, muito criticado e,
sobretudo, porque naquele período predominavam no campo educacional brasileiro
as idéias de autores franceses, como Bourdieu e Passeron, Snyders, Baudelot e
Establet, e de autores americanos como Bowles e Gintis, neste cenário as idéias
de Bernstein me pareciam inovadoras e desafiantes.
Na primeira metade da
década de 80, quando iniciei o doutorado no Instituto de Educação da
Universidade de Londres, Basil Bernstein ocupava a cátedra Karl Mannheim e era
o intelectual de maior prestígio dentro e fora da instituição. Dessa forma,
logo no início do curso comecei a ler o volume 3 de Class, codes and
control (Classe, códigos e controle). O livro também me causou uma
forte impressão, aspecto este enfatizado por diferentes intelectuais que
escrevem sobre o autor. Os conceito de classificação e estrutura ofereciam
grande potencial para entender melhor o campo do currículo, sua forma de
organização, suas disputas e a prática pedagógica, o que era um dos objetos
centrais de meu interesse. Da mesma forma o texto, que está no capítulo 6 do
livro, com o título de ''Class and pedagogies: visible and invisible'' (Classe
e pedagogias: visíveis e invisíveis) teve grande importância na minha
compreensão sobre as práticas escolares. Era um texto que punha por terra minha
visão otimista sobre as pedagogias chamadas progressistas, alternativas ou
inovadoras. O desafio de ver por um novo ângulo algo bastante familiar, de
poder pensar e de interpretar por uma nova perspectiva alguns discursos bem
enraizados na tradição pedagógica me estimulava intelectualmente.
A seguir, vi-me diante do
desafio de ler uma primeira versão do ''Discurso pedagógico'', tarefa que,
realmente, tomou-me muito tempo, pois considerei o texto difícil e instigante.
Era a primeira vez que lia um trabalho de discussão do processo de produção do conhecimento
escolar dentro de uma abordagem completamente nova. O texto provocava-me certa
inquietação porque era difícil aceitar que o conhecimento escolar no seu
processo de constituição fosse deslocado de seu campo de produção e, por meio
de recontextualizações sucessivas, passasse a ser relocado no interior da
escola, afastando-se completamente, neste processo, do conhecimento científico
e mantendo com este, nas palavras do autor, uma relação apenas virtual. No
entanto, apesar das dificuldades que o texto apresentava, pude perceber que
estava diante de um autor que modificava minha visão sobre a escola e o
currículo.
Neste artigo, em primeiro
lugar busco traçar um perfil do autor e de sua obra, lançando mão das inúmeras
publicações sobre seu trabalho e da influência pessoal e intelectual que teve
na trajetória de acadêmicos de diferentes países e filiações teóricas. A
seguir, busco apresentar as principais idéias do autor para, finalmente,
avaliar a importância de seu trabalho e suas contribuições para o campo
educacional. É claro que neste processo faço escolhas, realço determinados
aspectos e, assim, termino por recontextualizar a obra de Bernstein, a partir
de minha compreensão, de minha interpretação e de meu julgamento sobre o que
considero mais significativo em seu trabalho.
Quero, todavia, deixar
claro que em cada leitura que faço de um texto de Bernstein, entendo melhor um
conceito que pensava ter apreendido. Isto ocorre por dois motivos. Por um lado,
o trabalho do autor, por ser muito denso, a cada leitura, abre possibilidade de
nos defrontarmos com um aspecto que nos havia passado despercebido. Por outro
lado, Bernstein é um autor fiel a si mesmo, cuja obra consiste em um
refinamento cada vez maior e mais elaborado, do ponto de vista teórico, de conceitos
com alto nível de abstração que vão se tornando cada vez mais complexos. Na
verdade, sua obra está centrada na relação entre linguagem e educação, de forma
explícita, quando escreveu trabalhos no campo da sociolingüística e, de forma
mais ampla e profunda, em trabalhos posteriores. A partir do conceito de
código, baseado nos códigos lingüísticos e estabelecendo analogias entre este e
os processos educacionais, constrói sua teoria sobre o processo de constituição
dos conhecimentos escolares. Este enraizamento na lingüística continua presente
em seus últimos trabalhos, como em um de seus últimos artigos em que analisa os
diferentes tipos de conhecimento e suas intra e inter-relações, publicado
no British Journal of Sociology of Education (1999), intitulado
''Conhecimento horizontal e vertical''.
Por último, gostaria de
ressaltar que este artigo pode parecer possuir um caráter laudatório. Contudo,
quero esclarecer que considero que todas as teorias ou conceitos teóricos podem
ter falhas e estão e devem estar sujeitos à crítica. O caso de Bernstein, neste
sentido e neste momento, é um pouco diferente, por que existem críticas
procedentes quanto à precisão de determinados conceitos elaborados pelo autor,
discordâncias consistentes quanto a determinados aspectos de sua abordagem
teórica. Todavia, grande parte da crítica que é feita aos seus trabalhos
decorre de má interpretação, de incompreensões sobre o que ele quis dizer, o
que até pode ser imputado a sua escrita densa e muitas vezes de difícil
leitura. Em razão disto, um dos objetivos deste trabalho é resgatar a
relevância de sua obra, prejudicada por incompreensões e críticas, em muitos
casos, inadequadas e injustificadas.
BERNSTEIN SEGUNDO SEUS
PARES
Com o afastamento de
Bernstein da universidade, com o agravamento de seus problemas de saúde e,
finalmente, com sua morte, cresceu o interesse pelo seu trabalho e uma série de
publicações foi produzida. O Instituto de Educação de Londres lançou um
trabalho A Tribute to Basil Bernstein: 1924-2000 (Um tributo a
Basil: 1924-2000), em que colegas, colaboradores e acadêmicos de diferentes
países lhe prestam uma homenagem. Nesta obra, os autores expressam a
importância, em suas carreiras, de Bernstein, suas contribuições para o campo
educacional. Relatam também suas relações pessoais com este intelectual, em que
a amizade e o apoio se manifestavam ora por gestos generosos, ora por frases e
conversas cheias de ironia e até mesmo sarcasmo, ora por uma atitude relaxada,
em um chá ou almoço, em um restaurante ou em sua residência. Nas suas
conversas, além de temas acadêmicos, discutia sobre música, pintura, arte em
geral e, até mesmo culinária, o que mostra a grande versatilidade deste
intelectual, evidenciada na sua capacidade de transitar e de ter conhecimentos
sobre os mais variados temas e práticas do mundo contemporâneo.
Mas o que dizem amigos e
intelectuais sobre Bernstein? Diferentemente de nossa tradição, na qual, em uma
homenagem a um morto, ninguém expõe suas diferenças ou seus aspectos menos
''nobres'', neste livro os autores apresentam problemas que tiveram com o
autor, discordâncias, mas também ajudas, contribuições e gestos de amizade.
Assim, tem-se um retrato de Bernstein, muito próximo do que ele foi como pessoa
e de sua importância para o campo educacional.
Basil Bernstein nasceu em
1924 e morreu em 2000, tendo iniciado sua carreira acadêmica na Universidade de
Londres na década de 60. Ocupou a cátedra Karl Mannheim, foi chefe do
Departamento de Sociologia da Educação e, quando se aposentou, recebeu o título
de professor emérito. Dentre seus trabalhos encontram-se artigos em diferentes
periódicos ingleses e de diversos países, e destacam-se cinco livros,
traduzidos em diferentes línguas. Os três primeiros, sob o título de Classe,
códigos e controle, foram publicados em três volumes, na primeira
metade da década de 1970. O primeiro deles, publicado em 1971, com o subtítulo
''Theoretical studies towards a sociology of language''(Estudos teóricos da
sociologia da linguagem). O segundo, com o subtítulo ''Applied studies towards
a sociology of language'' (Estudos aplicados à sociologia da linguagem), foi
publicado em 1973. O terceiro, publicado em 1975, é intitulado ''Towards a
theory of educational transmissions'' (Em direção a uma teoria das transmissões
educacionais). Em 1990, Bernstein publica The structuring of pedagogic
discourse, como o volume 4, de Classe, códigos e controle, que
foi traduzido para o português em 1996, com o título A estruturação do
discurso pedagógico: classe, códigos e controle. O último livro, Pedagogy,
simbolic control and identity: theory, research, critique (Pedagogia,
controle simbólico e identidade: teoria, pesquisa, crítica) foi publicado em
1996. Observe-se que Bernstein continuou a publicar até praticamente o final da
década de 90.
De acordo com Halsey
(2001), emérito professor da cadeira de Sociologia de Oxford, Bernstein pode
ser considerado o cientista social mais inventivo e sério que saiu da London
School of Economics depois da Segunda Guerra Mundial. Da mesma maneira, Sadovnik
considera que por quatro décadas seu trabalho no campo da sociologia, apesar de
gerar muitas controvérsias, teve um papel central na formação de sociólogos e
lingüistas. A importância do trabalho de Bernstein fica bem expressa, quando na
ocasião de sua morte, Sadovnik (2001) afirmou que ''o mundo da sociologia
perdeu um gigante''.
Douglas, professora de
antropologia do University College, da Universidade de Londres, diz que nos
anos de 1960 teve um forte impacto diante da leitura de um artigo de Bernstein,
cujo título era ''A socio-linguistic approach to social learnig'' (Uma
abordagem sociolingüística da aprendizagem social). Em suas palavras ''eu me
senti eletrificada''. Ela explica que, apesar de não ter entendido bem o
artigo, teve um forte sentimento, pois percebeu que realmente estava ali uma
pessoa definitivamente envolvida com os problemas culturais. Naquele tempo a
antropologia, segundo Douglas, já estava preocupada em buscar entender a
cultura inglesa, mas fazia isso estudando culturas de outros grupos, vivendo em
locais distantes e diferentes desta sociedade. Para a autora, a preocupação
central de Bernstein era a transmissão da cultura e ela se expressa sobre isto
afirmando:
Sua
temática era na verdade a relação das palavras com as coisas, tradução,
interpretação/incompreensão, todas estas questões postas em uma grande
perspectiva, a pré-seleção de significados. Era axiomático para os antropólogos
daqueles tempos que a compreensão sempre é filtrada por meio de uma cortina de
preconceitos e de vieses sociais. (2001, p.109)
Também para Cicourel
(2001), professor de sociologia da Universidade da Califórnia, Bernstein deu
grande importância às interações sociais e tratou a esfera cultural como objeto
de análise com características próprias e não como um mero apêndice da
economia.
Ainda mostrando a
relevância do trabalho de Bernstein, Douglas se volta para a incompreensão das
críticas levantadas ao seu trabalho sobre os códigos restritos e elaborados,
apontando que injustamente ele foi visto por alguns como determinista. Ela
rebate estas interpretações argumentando:
Sua
teoria põe em relevo um círculo da interações dinâmicas entre os atos
discursivos permitidos, que regulam o que pode ser pensado e realizado, e o
comportamento permitido o que reage sobre o discurso e por sua vez o
transforma. (2001, p.112)
De acordo com Atkinson,
professor da Universidade de Cardiff, a sociologia está sempre reinventando a
roda, pela ausência de uma memória coletiva nesta área. Para ele, muitas idéias
que aparecem como novas se devem ao fato de as pessoas não conhecerem a
produção e as realizações do passado. Grande parte das idéias que é acolhida
com entusiasmo ao ser divulgada por conter abordagens e conceitos novos, só
conquista prestígio porque um grande segmento do mundo acadêmico desconhece as
teorias e a produção do passado. Segundo o autor ''a sociologia contemporânea
recapitula o passado sob o disfarce do novo'' (Power et al., 2001, p.36).
Considerando este aspecto, o autor ressalta que o trabalho de Bernstein não pode
ser vítima desta amnésia sociológica, uma vez que os temas por ele trabalhados
como linguagem, identidade, cultura são agora redescobertos pelos cientistas
sociais. Para Atkinson, Bernstein, que tinha um grande conhecimento dos
clássicos e que se inspirou em trabalhos de sociólogos, antropólogos e
lingüistas, conseguiu produzir uma obra intelectual original e com identidade
própria, que não se confunde com as dos demais intelectuais. Para este autor,
Bernstein trabalhou, ao longo de sua carreira, sem abandonar suas preocupações
centrais, reelaborando e redefinindo suas idéias, buscando desenvolvê-las,
criando novas formas de abordá-las. Dessa maneira, ''ele conquistou por si
mesmo uma biografia intelectual que se destaca das vulgaridades da moda'' (2001,
p.37). As formas e a estrutura da educação foram sua matéria-prima e elas
continuam como temáticas relevantes no campo da análise sociológica e
antropológica pois:
...a
transformação de idéias em mercadorias, do campo intelectual em mercado, do
artesanato intelectual em produtividade, a incorporação do conhecimento em
desempenhos mensuráveis. Estes (temas) permanecem como uma agenda contínua de
pesquisa central para a imaginação sociológica. (2001, p.37)
Para Whitty (2001), que o
sucedeu na cátedra Karl Mannheim e é hoje o diretor do Instituto de Educação,
Bernstein teve um papel de grande destaque na instituição, pois influenciou
toda uma geração. A própria decisão de Whitty de trabalhar com a sociologia do
currículo foi decorrente do fato de ter sido seu aluno. Para ele, Bernstein foi
sempre uma fonte de inspiração que perpassou toda a sua vida acadêmica.
Segundo Stephen Ball, que
ocupa atualmente a cátedra Karl Mannheim, a leitura do texto de Bernstein sobre
''classificação e enquadramento'' teve um grande impacto em sua formação. Para
este autor, a maneira como Bernstein analisa as hierarquias no sistema
educacional constitui-se em uma forma radicalmente nova, com brilhantes insigths,
o que para ele faz deste artigo o melhor artigo escrito no campo da sociologia
da educação (2001, p.41).
Young, considerado um dos
líderes do movimento intitulado Nova Sociologia da Educação e aluno de
Bernstein, afirma que duas das sugestões de Bernstein, durante o curso de
mestrado, influenciaram toda a sua vida profissional. Relata que Bernstein
mostrava, em suas aulas, como a sociologia da educação não se constitui na
aplicação de teorias sociológicas ao campo educacional. Para Bernstein, o papel
da sociologia da educação era explicitar as formas como as instituições educacionais
expressam características da sociedade da qual fazem parte. Considerando um
privilégio ter sido aluno e colega de Bernstein, Young afirma:
Eu
me lembro de sua contínua habilidade de levantar importantes questões
educacionais, seu ceticismo sobre qualquer coisa que parecesse um modismo
intelectual e sua determinação em levar seriamente as idéias dos outros. (2001,
p.170)
Apple (2001), professor da
Universidade de Wisconsin-Madison, nos Estados Unidos, afirma que a produção de
Bernstein teve grande influência em seu trabalho e no de seus estudantes.
Apesar das constantes discussões e de algumas discordâncias que se manifestavam
em conversas pessoais e por correspondência, Apple diz que o conhecimento do
seu trabalho transformou-o, sendo isto a coisa mais importante que um professor
pode fazer.
Hasan (2001), emérito
professor de lingüística na Universidade Macquarie, da Austrália, afirma que
Bernstein, tendo começado com um trabalho mais concreto e local na década de
1950, com crianças que mostravam uma determinada forma de comportamento,
produziu uma teoria mais abstrata e ampla capaz de explicar não apenas aquele
tipo de comportamento, mas também suas potenciais variações.
Kudomi (Power et al.,
2001), professor de sociologia da educação da Universidade de Hitotsubashi, em
Tóquio, traduziu com seu grupo de trabalho o livro Pedagogia, controle
simbólico e identidade para a língua japonesa. Para este pesquisador,
o legado de Bernstein para os intelectuais japoneses, sua teoria pedagógica,
tem um valor inigualável, do ponto de vista teórico e metodológico, uma vez que
se constituem em instrumental valioso para enfrentar os problemas que a
educação apresenta na atualidade.
Para Brannen (Power et al.,
2001), professor do Instituto de Educação da Universidade de Londres,
Bernstein, que advogava o rigor da investigação social, via com preocupação a
mercantilização da pesquisa. Percebendo a crescente pressão e demanda sobre a
produção de pesquisadores e de estudantes-pesquisadores, Bernstein
problematizou as principais questões vivenciadas hoje no campo da investigação.
Por um lado, coloca a perspectiva da pesquisa entendida como uma cultura, um
artesanato em que os estudantes aprendem por imersão e sob a direção de um
professor experiente. Por outro lado, mostra o crescimento de um outro tipo de
pesquisa, produzida em razão da demanda e da produtividade, em que a exigüidade
do tempo elimina a inovação teórica e provoca o aparecimento de problemas de
ordem metodológica.
Morais (2001), professora
da Universidade de Lisboa, sua ex-aluna de doutorado que trabalha com o ensino
de ciências, cuja pesquisa é várias vezes citada pelo autor, afirma que o
interesse pela sociologia tem crescido entre os acadêmicos no campo do ensino
de ciências, principalmente entre os adeptos de Vygotsky.
BERNSTEIN SEGUNDO
BERNSTEIN
Educação e democracia
Como foi visto, os estudos
de Bernstein estão escritos em uma linguagem densa, com um alto nível de
abstração. Resumi-los, portanto, se torna uma tarefa complexa. Nesse sentido,
esta seção do artigo busca apresentar alguns dos mais destacados aspectos de sua
teoria, apontando seus principais conceitos e as bases sobre as quais foram
construídos. O objetivo é realçar algumas de suas contribuições para a
compreensão dos processos educacionais1.
Esta parte do trabalho
baseia-se no último livro publicado pelo autor (Bernstein, 1996a), no qual faz
uma reflexão sobre o desenvolvimento de sua obra. Ele inicia o livro (p.6-13)
enfatizando a importância da educação para a construção de uma sociedade democrática.
Ele afirma que a educação, como a saúde, sendo bem público, tem um papel
central na produção e reprodução das injustiças sociais. Em razão disso, para o
autor, torna-se necessário examinar os vieses ou desvios enraizados na própria
estrutura do processo de ensino-aprendizagem dos sistemas de ensino e de seus
pressupostos sociais. Bernstein mostra que a escola, para cumprir seu papel,
deverá garantir três direitos. O primeiro deles se refere ao desenvolvimento
pessoal, à formação dos sujeitos e opera no nível individual. O segundo, que
opera no nível social, diz respeito ao direito de ser incluído, que é diferente
de ser absorvido, pois inclui a idéia de autonomia. O terceiro, que opera no
nível político, é o direito à participação, que inclui a possibilidade de
participar na construção, manutenção ou mudança da ordem social.
No entanto, para ao autor,
a escola em sentido metafórico é como um espelho que reflete imagens positivas
e negativas. A escola reflete imagens que são ''a projeção da hierarquia de
valores, de valores de classe'' (1996a, p.7). Do ponto de vista acústico,
também a escola apresenta grandes diferenças na produção e na recepção de sons.
Em seu interior, apenas algumas vozes são ouvidas ou soam familiares, outras
vozes são silenciadas e os sons ali produzidos não têm significado para grande
parte dos estudantes. As distorções presentes no sistema escolar são, para o
autor, decorrentes da forma como este sistema opera na distribuição de
conhecimento, de recursos, de acesso e nas condições necessárias para que a
aprendizagem ocorra. As desigualdades na distribuição destes elementos afetam
os direitos ao desenvolvimento pessoal, à inclusão e à participação. O autor
acrescenta que ''é altamente provável que os estudantes que não recebem estes
direitos na escola tenham origem em grupos sociais que não recebem estes
direitos na sociedade'' (1996a, p.8).
Bernstein avança a
discussão mostrando como a escola lida com as hierarquias externas a ela e com
as questões de ordem social, justiça e conflito. A forma como a escola
desconecta as hierarquias de sucesso internas a ela das hierarquias
provenientes das diferenças entre as classes sociais externas a ela pode ser
explicada pela elaboração de um discurso mitológico que incorpora interesses
sociais e políticos que permeiam a vida social. Este discurso é constituído por
dois pares de elementos que se combinam e se reforçam.
Um
par celebra e tenta, aparentemente, produzir uma consciência nacional comum,
unida e integrada; o outro par trabalha junto para desconectar as hierarquias
interiores à escola de sua relação causal com as hierarquias sociais externas à
escola. (1996a, p.9)
Em primeiro lugar, estaria
o mito da consciência nacional, construído pela escola como algo distinto do
mito de origem, sucesso e destino. A cultura escolar inclui celebrações,
rituais e discursos presentes em sua linguagem e no ensino de disciplinas, como
história e literatura, que são os instrumentos para a constituição e
preservação desse mito. O outro mito que se relaciona a este é o mito da
sociedade como um organismo em que todas as atividades têm funções importantes
e equivalentes. Este mito implicitamente justifica e mantém as diferenças de
gênero, mas não de uma maneira aberta, uma vez que as relações de gênero são mostradas
como resultado de diferenças de ordem biológica.
O segundo par de mitos se
relaciona com a maneira como a escola tenta construir uma estratificação
distinta da estratificação social. A escola estratifica os alunos a partir do
critério de idade que se apresenta como um critério não arbitrário,
diferentemente das relações arbitrárias existentes nos grupos sociais como
classe, religião e etnia. A escola precisa legitimar suas hierarquias,
relacionadas ao desempenho escolar – fracasso e sucesso – a partir de outros
critérios, diferentes das hierarquias nas relações de poder existentes entre os
grupos sociais. Neste sentido, a escola justifica o fracasso, por meio de
características inatas e do déficit cultural das famílias das crianças. Ao lado
deste mito, o autor apresenta o mito dos grupos culturais com identidade e
interesses comuns. No entanto, como mostra o autor, apesar da melhoria nas
oportunidades educacionais em relação a gênero, raça e classe, a classe social
permanece como maior regulador na distribuição dos estudantes no que diz
respeito ao sucesso e fracasso escolar. Finalizando, o autor afirma que ''a
cultura de classe age para transformar microdiferenças em macrodesigualdades e
estas desigualdades levantam questões cruciais para a relação entre democracia
e educação'' (1996a, p.12).
Seria importante pois, para
Bernstein, entender as características intrínsecas ao processo de
estratificação dos sistemas educacionais, bem como que grupos sociais estariam
mais provavelmente incluídos nos diferentes segmentos produzidos por este
processo de estratificação. Em decorrência, elabora seus estudos dando
centralidade às questões relacionadas ao processo de comunicação pedagógica que
se constitui no mais importante meio de controle simbólico. Seu objetivo é
descrever as práticas organizacionais, discursivas e de transmissão presentes
nas agências pedagógicas e o processo por meio do qual a aprendizagem se faz de
forma seletiva.
Nessa introdução, Bernstein
manifesta seu interesse de trabalhar com a produção de uma teoria que explique
como funciona o aparelho escolar, analisando, como internamente, pela própria
forma como é constituído, ele produz as diferenças de desempenho. Já estava
posto, na época em que iniciou seu trabalho, que a escola reproduzia desigualdades
sociais. O objetivo do autor, nesse caso, é explicar como, na própria
constituição do aparelho escolar, estas desigualdades se inscrevem por meio de
mecanismos intrínsecos à escola e a forma como esta se organiza para socializar
conhecimentos. Ao buscar criar uma teoria explicativa desse processo, Bernstein
reafirma sua preocupação com os direitos à educação.
Ao descrever os processos
de comunicação pedagógica, ele mostra como a escola trabalha e, dessa forma,
explicita como as diferenças que ocorrem no desempenho dos alunos não estão
apenas relacionadas à estrutura social, mas também com a própria forma como
estas hierarquias se inscrevem ou são elementos constituintes do aparelho
pedagógico. Sua teoria não contém uma proposta de mudança ou alternativas para
a transformação da educação. Contudo, ao buscar desvendar elementos intrínsecos
ao aparelho escolar, que condicionam a produção e recepção diferenciada de
mensagens ou de discursos, o autor abre caminho para o entendimento mais
profundo de como as desigualdades educacionais são produzidas e justificadas.
A partir desse
entendimento, abre-se a possibilidade de se repensar a educação. Isso significa
compreendê-la realmente como direito social, que inclui o aperfeiçoamento
pessoal, a inclusão social e a participação política. Uma educação para a
cidadania, que só poderá ser alcançada com mudanças na estrutura vertebral da
escola, naquilo que lhe é central, nas formas como o aparelho escolar funciona
na distribuição de conhecimentos de várias ordens. Em conseqüência disso é que
talvez as modas e medidas reformistas que invadem a escola em todas as partes
do globo sejam tão inócuas, porque atingem aspectos periféricos da estrutura
escolar, deixando intactos os elementos estruturais por meio dos quais a escola
produz o sucesso e o fracasso escolar.
RELAÇÕES DE
PODER E CONTROLE SOCIAL
Para Bernstein, as teorias
da reprodução cultural, incluindo o trabalho de Bourdieu, vêem a educação como
um transportador de relações de poder externas à educação. Para tais teorias,
as relações de poder existentes na sociedade, no tocante a raça, gênero e
classe, são transportadas para o interior da escola e reproduzidas por esta. O
que o autor argumenta é que não têm sido objeto de análise a constituição e o
funcionamento da estrutura que permite que tais relações sejam transportadas
pelos sistemas de ensino e no seu interior. Para Bernstein, é fundamental
explicar como são transmitidos estes aspectos de dominação referentes à classe,
patriarcalismo e etnia no interior do aparelho escolar. O que está ausente,
segundo Bernstein, das teorias da reprodução é uma análise interna da estrutura
do discurso pedagógico, ou seja, o que está faltando é uma teoria sobre ''a
estrutura do discurso, a lógica do discurso, que fornece os meios pelos quais
as relações externas de poder possam ser transportadas por ele'' (1996a, p.18).
A partir desta questão o autor mostra que sua preocupação é entender como os
textos educacionais são organizados e como são construídos, postos em
circulação, contextualizados, apreendidos e também como sofrem mudanças.
Evidenciando sua preocupação central, Bernstein interroga:
Sumarizando,
como poder e controle são traduzidos em princípios de comunicação, e como estes
princípios de comunicação diferencialmente regulam formas de consciência no que
se refere a sua produção e suas possibilidades de mudança? (1996a, p.18)
Para responder a esta
questão, o autor se volta para a análise do poder e do controle social. Do
ponto de vista teórico e do ponto de vista analítico, o autor afirma que poder
e controle são considerados elementos distintos, apesar de estarem mutuamente
inter-relacionados nos estudos empíricos. Por meio das relações de poder, de
acordo com sua perspectiva, estabelecem-se, legitimam-se e reproduzem-se fronteiras
entre diferentes categorias de grupos, como, por exemplo, classe e gênero,
assim como entre diferentes categorias de discursos e de agentes. O poder está,
portanto, relacionado ao espaço, delimitando fronteiras e colocando pessoas,
discursos e objetos em diferentes posições. Por sua vez, o controle estabelece
formas de comunicação apropriadas para as diferentes categorias, ou seja, o
controle estabelece a comunicação legítima para cada grupo, de acordo com as
fronteiras estabelecidas pelas relações de poder, buscando socializar as
pessoas no interior destas relações. Neste sentido, ''...o poder constrói
relações entre e o controle de relações dentro de
dadas formas de interação'' (1996a, p.19).
Com esses dois elementos,
poder e controle, Bernstein construiu os instrumentos para compreensão do
processo de controle simbólico que regulam diferentes modalidades do discurso
pedagógico. O autor usa o conceito de classificação para
analisar as relações entre as categorias, sejam elas sujeitos, discursos ou práticas.
A expressão classificação é geralmente usada para distinguir um atributo ou um
critério que constitui uma categoria. Bernstein enfatiza que está usando a
expressão classificação em um sentido diferente do usual, uma vez que ela não
se refere a um atributo, nem mesmo a uma categoria, mas às relações entre as
categorias.
Considerando, por exemplo,
uma série de categorias de discursos escolares, como o discurso da física, da
história, da geografia, o autor argumenta que o espaço que cria a especialização
destes discursos não é interno a eles, mas é um espaço entre estes discursos e
entre os outros que a escola veicula. As fronteiras entre estes discursos são
elementos essenciais na especialização de cada um deles, pois se seu isolamento
é quebrado, a categoria fica ameaçada de perder sua identidade. Assim, o
sentido de um discurso só pode ser entendido no interior das relações com
outras categorias do grupo. É o isolamento entre as categorias do discurso que
mantém os princípios relacionados à divisão social do trabalho. Segundo
Bernstein, ''em outras palavras, é o silêncio que transporta a mensagem de
poder'' (1996a, p.21).
O autor distingue ainda
entre classificações fortes e fracas. Quando existe um grande isolamento entre
as categorias, pode-se dizer que a classificação é forte. Quando uma
classificação é forte, cada categoria tem uma única identidade e voz, assim
também como suas próprias regras de relações internas. De forma oposta, quando
a classificação é fraca os discursos, as identidades e as vozes são menos
especializados. No entanto, tanto as classificações fortes como as fracas
transportam relações de poder. O princípio de classificação tem uma função
externa que regula as relações entre os indivíduos e uma outra função que
regula relações no interior do indivíduo. A classificação cria ordem,
contradições, clivagens e dilemas que são reprimidos pelo isolamento. No
indivíduo, o isolamento se torna uma defesa psicológica e, na medida em que for
suprimido, irá revelar as contradições, os dilemas e as clivagens. Como exemplo
de forte classificação, o autor apresenta o isolamento que existia no período
medieval entre as práticas manuais e as práticas intelectuais. Para dar outro
exemplo relacionado com a reestruturação do conhecimento no século XX, Bernstein
faz uma distinção entre discursos como ''singular'' e discursos como
''regiões''. Como exemplo de discursos singulares, há os discursos produzidos,
sobretudo a partir do século XIX, como a física, a química e a sociologia.
Estes discursos são criados no campo da produção do conhecimento e são
discursos específicos, sobre um determinado objeto, ou seja, são discursos
sobre eles mesmos. Para o autor, nas últimas décadas do século XX,
intensifica-se uma recontextualização dos singulares, criando-se uma
regionalização do conhecimento, de que são exemplos a Arquitetura, a Engenharia
e as Ciências da informação. A regionalização seria um índice do grau de
tecnologização do conhecimento, pois a regionalização representa uma interface
do campo da produção de conhecimento e do campo da prática (1996a, p.21-23).
Analisando a classificação
do conhecimento no interior da escola, Bernstein focaliza dois tipos de
currículo. No primeiro tipo estão aqueles em que há uma forte classificação,
denominados ''coleção'', em que as fronteiras entre as disciplinas são bem
nítidas. O segundo tipo são os currículos em que a classificação é fraca e são
denominados ''integrados'', sendo que nestes as fronteiras entre as disciplinas
são pouco nítidas. Nos currículos de forte classificação, o progresso nas
disciplinas se desenvolve gradativamente, partindo de um conhecimento local e
concreto, com o domínio de operações simples, até princípios gerais mais
abstratos que serão adquiridos em níveis mais avançados da trajetória dos estudantes
no processo de escolarização. Quando as crianças falham ou se evadem da escola,
elas provavelmente foram posicionadas dentro de um conhecimento mais fatual e
de operações mais simples. Somente aqueles que têm sucesso e alcançam níveis
mais elevados de escolarização tornam-se, geralmente, conscientes dos mistérios
do conhecimento, percebendo que o que prevalece no discurso de cada disciplina
não é a ordem, mas a desordem, assim como a possibilidade de pensar o
impensável (1996a, p.25-26). O autor, ao discutir este aspecto, indaga quais
seriam as razões e os interesses que levam à organização dos conhecimentos de
forma isolada, com forte classificação, e quais seriam os interesses que levam
à integração de conhecimentos, colocando-os de forma mais relacionada de modo
que as fronteiras entre eles sejam pouco nítidas. Este aspecto será mais
desenvolvido quando for discutida a distinção entre diferentes pedagogias.
Voltando-se para a prática
pedagógica, Bernstein passa a explicar as formas de controle que regulam e
legitimam a comunicação nas relações pedagógicas. Ele usa o conceito de
enquadramento para analisar as comunicações que são legitimadas na prática
pedagógica. Enquadramento refere-se ao controle nas interações comunicativas
presentes na práticas pedagógicas, que podem ocorrer tanto entre pais e filhos,
professores e alunos, assim como entre médico e paciente, dentre outras. É que,
para Bernstein, o conceito de prática pedagógica é mais amplo do que a prática
que ocorre no interior das escolas, pois abrange, por exemplo, outras relações
que envolvem processos de produção e reprodução cultural, como as relações
existentes entre médicos e pacientes, psiquiatras e chamados doentes mentais,
arquitetos e planejadores. Enquanto o princípio da classificação está
relacionado com o nosso posicionamento em um determinado lugar, definindo por
meio do reconhecimento desta posição a possibilidade de voz e de silêncio, o
princípio de estrutura se constitui em um meio para a aquisição da mensagem
considerada legítima. ''Assim, classificação estabelece vozes e enquadramento
estabelece a mensagem'' (1996a, p.27). Enquadramento diz respeito à realização
do discurso, uma vez que se relaciona com a forma pela qual os significados são
encadeados e se tornam públicos. Nesse sentido, enquadramento se refere à
natureza do controle sobre seleção e comunicação, à seqüência, ao ritmo
esperado para a aquisição e a base social na qual a transmissão ocorre.
Quando o enquadramento é
forte, o transmissor tem um controle explícito sobre a seleção, seqüência e
ritmos da prática pedagógica. No caso de o enquadramento ser fraco, o aprendiz
tem um controle mais aparente no processo de comunicação. Quando o
enquadramento é forte, os alunos são rotulados em termos de atenção, interesse,
cuidado e esforço, enquanto no caso de um fraco enquadramento, os aprendizes
são vistos a partir de seu interesse em ser criativos, interativos e autônomos
(1996a, p.27-28). As regras de ordem social que estão presentes no
enquadramento são chamadas pelo autor de discurso regulativo e as regras de
ordem discursiva são denominadas discurso instrucional2. Nos tipos de prática pedagógica
denominados pedagogias visíveis, o enquadramento é forte e as regras do
discurso instrucional e do discurso regulativo são explícitas. Já nas
denominadas pedagogias invisíveis, em que o enquadramento é fraco, as regras
dos dois discursos são implícitas.
No contexto da relação ensino-aprendizagem,
Bernstein mostra que a classi-ficação, como foi visto, está relacionada às
regras de reconhecimento, uma vez que o indivíduo pode reconhecer a
especificidade do contexto em que se encontra. Os princípios de classificação
são como uma chave para distinguir características do contexto, orientando o
falante/estudante para compreender aquilo que é esperado dele e que
comportamentos e discursos são considerados legítimos. O enquadramento está
relacionado com as regras de realização. Diferentes formas de enquadramento
agem seletivamente sobre as regras de realização permitindo a produção de
textos diferentes. ''A regra de realização é necessária para produzir o texto
legítimo'' (1996a, p.32). Muitas crianças das camadas populares podem ter domínio
das regras de reconhecimento, ao perceberem as relações de poder nas quais
estão envolvidas e sua posição nestas relações. Contudo, podem não dominar as
regras de realização, pois não conseguem produzir o que é considerado texto
legítimo. Dessa forma, são as regras de reconhecimento que permitem ao
estudante identificar que significados são relevantes e as regras de realização
permitem saber como utilizar esses significados para produzir o texto legítimo.
O dispositivo pedagógico
Bernstein argumenta que,
por um lado, existe uma crescente compreensão das relações entre o sistema
educacional e os sistemas políticos, econômicos e culturais nacionais e
internacionais. Por outro lado, afirma que a sala de aula tem sido objeto de
numerosos estudos. Entretanto, o autor mostra que existem importantes questões
que esses estudos deixam de levantar. O autor explica que muitos deles
voltaram-se para a discussão sobre o que é transmitido ou transportado para o
interior da escola, sem discutir ou aprofundar aspectos relacionados ao próprio
processo de transmissão. Com seu trabalho, Bernstein quer preencher esta lacuna
sobre as práticas pedagógicas, procurando identificar os princípios subjacentes
à pedagogização do conhecimento, que tornam possível a comunicação pedagógica.
Segundo o autor, se existem trabalhos que analisam as mensagens pedagógicas e
suas bases institucionais e ideológicas, não há muitos estudos sobre a
gramática social, sem a qual não é possível a produção das mensagens
pedagógicas (1996a, p.38).
O autor inicia sua análise
sobre o discurso pedagógico, mostrando que há uma clara distinção entre o
dispositivo transmissor e aquilo que é transmitido. Partindo da conceituação do
dispositivo lingüístico como um dispositivo de regras formais que governam as
várias combinações realizadas na fala e na escrita, o autor indaga se o
dispositivo lingüístico seria em si mesmo neutro. Baseando-se em Halliday,
afirma que as regras do dispositivo lingüístico não são ideologicamente
neutras, mas refletem ênfases nos significados potenciais criados pelos grupos
dominantes. O dispositivo da transmissão, o transportador, é constituído por
regras relativamente estáveis, enquanto o transmitido, a mensagem, se
fundamenta em regras contextuais. Fazendo uma analogia com o dispositivo
lingüístico, o autor introduz seu conceito de dispositivo pedagógico. Este
dispositivo tem regras internas que regulam a comunicação pedagógica e que
integram este dispositivo. Dessa forma, a comunicação pedagógica age
seletivamente em relação aos significados potenciais. O autor identifica como
significados potenciais, que fazem parte do processo de comunicação pedagógica,
os discursos potenciais que estão disponíveis para ser pedagogizados. Apesar
das diferenças, o dispositivo pedagógico tem muitas similaridades com o
dispositivo lingüístico, pois ele também torna possível uma série de
comunicações potenciais. No entanto, existe uma grande diferença entre os dois,
no que diz respeito a um aspecto: enquanto no dispositivo pedagógico uma
determinada forma de comunicação pode subverter as regras do dispositivo, o
mesmo não ocorre em relação ao dispositivo lingüístico (Bernstein,1996a, p.
41-42).
De acordo com Bernstein, o
dispositivo pedagógico fornece a gramática intrínseca do discurso pedagógico. A
gramática do discurso pedagógico é constituída por três tipos de regra: as
regras distributivas, as recontextualizadoras e as avaliativas.
Para explicar o que são
regras distributivas, o autor argumenta que em todas as sociedades existem duas
formas de conhecimento, o esotérico e o mundano, em outras palavras, o
impensável e o pensável. As variações entre os dois ocorrem de acordo com a cultura
e no decorrer da história. O que é esotérico em uma sociedade ou em um período
do tempo pode vir a ser mundano em outra época. O autor prossegue mostrando
que, essencialmente, mas não necessariamente, nas sociedades modernas, o
controle do pensável e do impensável é realizado pelo sistemas educacionais. De
forma simplificada, segundo Bernstein, enquanto o pensável é trabalhado na
educação básica, o impensável está, sobretudo, circunscrito às agências de
ensino superior. Assim, para o autor:
Sociologicamente
falando, as regras distributivas criam um campo especializado para a produção
do discurso com regras especializadas de acesso e formas de controle do poder
também especializadas. (1996a, p. 46)
As regras de
recontextualização é que criam o discurso pedagógico. Bernstein define o
discurso pedagógico ''como uma regra que embute dois discursos: um discurso de
habilidades de vários tipos e suas relações mútuas e um discurso de ordem
social''. Geralmente, para o autor, no campo educacional se faz uma distinção
entre habilidades e valores, uma vez que muitos pesquisadores trabalham como se
na educação habilidades e valores fossem coisas distintas. Contudo, na visão de
Bernstein, existe apenas um discurso, pois o discurso pedagógico não pode ser
identificado com aquilo que ele transmite, como a física, a matemática etc.
Afirma ainda que o discurso pedagógico não é um discurso, mas um princípio. Um
princípio por meio do qual outros discursos são apropriados e colocados em uma
relação especial uns com os outros, com o propósito de uma transmissão e
aquisição seletiva. É um princípio para deslocar, relocar e focalizar um
discurso, de acordo com seu próprio princípio. Desta forma, o discurso
pedagógico se constitui em um princípio de recontextualização, que, seletivamente,
se apropria, reloca, refocaliza e relaciona outros discursos, para constituir
sua própria ordem (1996a, p.46).
O princípio de
recontextualização cria os campos recontextualizadores e seus agentes. O autor
distingue entre o campo da recontextualização oficial, criado e dominado pelo
Estado e seus agentes e o campo da recontextualização pedagógica, constituído
pelos educadores, departamentos de educação nas universidades, pelos periódicos
especializados e pelas fundações de pesquisa. Para o autor, o aspecto dominante
do discurso pedagógico é o regulativo, de cunho moral, capaz de modelar o
caráter, as maneiras, as condutas e as posturas. Bernstein afirma que é o
discurso regulativo que produz a ordem do discurso instrucional, pois não há
discurso instrucional que não seja dominado pelo discurso regulativo. Qualquer
disciplina escolar é recontextualizada ao ser deslocada de seu campo de
produção. Há uma seleção de conteúdos, da seqüência e do ritmo em que serão
trabalhados na escola. O processo não é derivado da lógica existente no campo
da produção desses conhecimentos. O processo de ensino-aprendizagem é um fato
social e nele o discurso regulativo fornece as regras da ordem interna do
discurso instrucional. Logo as teorias da instrução fazem parte do discurso
regulativo, uma vez que em seu interior existe um modelo de aluno, de professor
e de suas relações (1996a, p.47).
Partindo dessas idéias,
Bernstein mostra que o discurso pedagógico especializa o tempo, o texto e o
espaço, colocando-os em uma relação especial. Nesse sentido, o tempo é
transformado em idade, o texto em conteúdo e o espaço em contexto. No interior
das relações da prática pedagógica, a idade (muitas vezes pensada em termos de
estágios) transforma-se em aprendizagem, o conteúdo, em avaliação e o contexto,
em transmissão.
Discurso pedagógico e
identidades
Segundo Bernstein, nos anos
de 1960, houve uma certa convergência no interior das ciências humanas e isso
teve conseqüências para o campo pedagógico. Vários autores, de diferentes
áreas, passaram a usar o conceito de competência. Bernstein exemplifica tal
processo, apontando as áreas e seus teóricos: competência lingüística
(Chomsky), competência cognitiva (Piaget), competência cultural (Lévi-Strauss),
competência prática (Garfinkle) e competência sociolingüística (Dell Hymes).
Seus trabalhos demonstram que as competências são criativas e tacitamente
adquiridas em interações informais (1996a, p.54-55).
O campo pedagógico passa
também a ser influenciado pelo conceito de competência. Bernstein faz uma
distinção entre competência e desempenho. O conceito de competência, para o
autor, está relacionado, no campo educacional, a um significado emancipatório,
associado à idéia de que não existe déficit cultural; de que o sujeito é ativo
na criação de significados e práticas sociais; de que a aprendizagem é um
processo interno, tácito e invisível e que não pode ser regulado externamente.
De forma diferente, o conceito de desempenho põe ênfase no produto final, isto
é, diz respeito a um texto específico que o estudante deveria produzir e às
habilidades necessárias para a realização desta produção. Para Bernstein, as
orientações e finalidades da educação variam tanto no modelo de desempenho como
no de competência (1996a, p.56-67).
Bernstein passa, então, a
relacionar as duas modalidades de prática pedagógica, ligadas ao conceito de
competência e de desempenho, com o processo de construção de identidades. Ele
relaciona a idéia da estrutura do conhecimento singular e regionalizado com
dois tipos diferentes de práticas pedagógicas e de construção de identidades.
Da mesma forma, ele identifica três modelos de competência e de construção de
identidades, derivados de diferentes modalidades de práticas pedagógicas que
estabelecem formas diferenciadas nas relações entre sujeito, conhecimento e
sociedade.
Nesse processo, ele aponta
o papel exercido na construção desses discursos pelo campo de
recontextualização oficial, dominado pelo Estado, e o campo de
recontextualização pedagógica, dominado pelos educadores. O autor mostra como,
na atualidade, o Estado, de forma centralizada, monitora o currículo, ao mesmo
tempo em que estimula a descentralização da administração escolar. Esta
descentralização, no entanto, tem-se tornado um fator importante na criação de
uma cultura empresarial competitiva no interior do sistema de ensino. Bernstein
analisa, em síntese, as estratégias adotadas em razão das exigências do mercado
e das novas formas de reorganização do capitalismo e suas relações com as
estratégias educacionais dos diferentes segmentos sociais de origem dos alunos,
ou seja, com as aspirações diferenciadas de educação dos diferentes grupos
sociais. Todas estas variáveis que interferem no campo educacional repercutem
na prática pedagógica, levando à formação de modelos híbridos e,
conseqüentemente, possibilitando uma grande diversidade de processos
relacionados à construção de identidades sociais.
Finalmente, o autor observa
como a própria diversidade e as oposições intrínsecas a esse processo de
formação de identidades terminam por criar base para resistências. Nesse
sentido, para Bernstein:
Tais
diversidades podem ser menos um índice de fragmentação cultural, como supõem os
pós-modernistas, e mais um ressurgimento cultural geral de rituais de
interiorização em novas formas sociais. (1996a, p. 80)
Teoria e pesquisa
Bernstein diz que os três
volumes de Class, codes and control representam um primeiro estágio
no desenvolvimento de sua teoria sobre o discurso pedagógico e as modalidades
de controle social. Seu trabalho teve origem nos anos 50, partindo de problemas
empíricos sobre a razão do sucesso escolar e de suas relações com os processos
de socialização. Segundo o autor, ele não estava satisfeito com as teorias
sobre o processo de socialização que o explicavam como um ''processo místico de
internalização 'de valores, papéis e disposições' ''. Naquele momento, ele se
sentia atraído pelo interacionismo simbólico de Mead e com os primeiros
trabalhos da Escola de Chicago, em que a comunicação tinha um papel central e
em que as culturas marginalizadas eram estudadas por meio de estudos detalhados
de orientação etnográfica. Durkheim e Cassirer forneciam uma perspectiva
kantiana que, de formas diferentes, chamavam-lhe a atenção para a base social
das formas simbólicas. Marx despertou seu interesse ao relacionar a questão de
classe com formas de consciência e suas relações com a divisão social do
trabalho e as relações de produção. Com esses elementos, Bernstein afirma que
teve condições de pensar no impensável, ligando a análise de Durkheim sobre
solidariedade mecânica e orgânica com relações de poderes diferenciadas (1996a,
p.91).
O autor começa, então, a
estudar como diferentes posições de poder criam diferentes modalidades de
comunicação, que são valorizadas também de formas diferentes pela escola.
Iniciando seu trabalho sobre modalidades de comunicação e suas relações com a
educação, em ''códigos restritos e elaborados'', a partir do final dos anos de
1970 e início dos 1980, ele constrói uma explicação sobre o processo de estruturação
do discurso pedagógico.
Bernstein explica como, no
decorrer de sua produção, teoria e pesquisa de base empírica foram se
inter-relacionando, de forma que ele pudesse desenvolver um trabalho que se
aprofundava e ia superando problemas com os quais se defrontava no decorrer do
processo. As pesquisas foram realizadas por estudantes de doutorado e
pós-doutorado e outros colaboradores. Por exemplo, Bernstein esclarece que a
formulação de conceitos para a descrição das modalidades de códigos elaborados
institucionalizados pelo sistema escolar nasceu da conceitualização das
modalidades de sistemas familiares e de seus princípios de controle. Este foco,
de acordo com o autor, foi definido pelas pesquisas realizadas por um grupo a
partir da segunda metade dos anos de 1960 até a segunda metade dos anos de
1970. As investigações estavam voltadas para o estudo da origem dos códigos
sociais na família e suas manifestações/realizações sociolingüísticas em
crianças de 5 a 7 anos, buscando estabelecer relações com sua influência no
desempenho escolar, na escola primária, de crianças das camadas populares.
Apesar da formulação teórica dos tipos de famílias já estar pronta desde 1963,
só foi publicada no início da década de 1970, depois da realização de vários
trabalhos empíricos que buscavam descrever formas de controle.
Ainda nos anos de 1960, o
autor diz que começa a analisar dois sistemas que se inter-relacionam na
escola. Um de natureza instrumental, relacionado com a transmissão de
competências ou habilidades específicas e outro, de ordem expressiva, voltado
para a transmissão de condutas, maneiras e para a formação do caráter. Baseado
nos conceitos de Durkheim sobre solidariedade mecânica e orgânica, Bernstein
trabalha com a idéia de que as escolas estavam mudando, saindo da solidariedade
mecânica para a solidariedade orgânica. Essas idéias são utilizadas e
exploradas em trabalhos empíricos. O autor, no entanto, percebia limitações
teóricas em seu trabalho. Os conceitos usados para analisar as modalidades de
códigos elaborados utilizados pela escola não estavam ainda conectados com os
conceitos formulados para explicar os códigos. Havia uma dificuldade de
transitar do nível macro para o nível micro, pois os modelos de explicação do
sistema de transmissão que ocorre na escola não forneciam os princípios básicos
que explicassem formas de ensino-aprendizagem no nível micro da prática
pedagógica. É nesse contexto que Bernstein afirma que, a partir de Durkheim,
formula o conceito de classificação e, a partir do interacionismo simbólico,
ele chega ao conceito de enquadramento, embora ele os defina de forma diferente
daquela que tais conceitos têm nas formulações teóricas em que se originaram
(1996a, p.91). Mais uma vez, por meio de pesquisa, Bernstein pode avaliar e
perceber a complexidade das relações existentes entre o código pedagógico da
família, o background cultural da família, o nível de
desenvolvimento dos estudantes e a modalidade do código elaborado utilizado na
prática pedagógica assim como os diferentes níveis de desempenho e conduta dos
alunos em sala de aula.
Permanecia, no entanto, um
problema: a separação entre habilidades de natureza instrumental, o
conhecimento dos conteúdos escolares e a aprendizagem de formas de
comportamento e atitudes de ordem expressiva. Por meio de pesquisas realizadas
em escolas, ele pode rever seu conceito de enquadramento. Passou, desse modo, a
definir enquadramento como controle presente em dois discursos, sendo que um
está embutido no outro: o discurso instrucional, voltado para a transmissão de
diferentes habilidades, e o discurso regulativo, por meio do qual são
transmitidas regras de ordem social. Foi também por meio de pesquisa que o
autor diz que pode ser evidenciada a relação entre as modalidades de prática
pedagógica em termos de sua classificação e enquadramento e a atuação das
regras de reconhecimento e de realização para a construção do texto considerado
legítimo pela escola. Nesse contexto, Bernstein explicita o seu conceito de
código, cuja definição mais aprimorada foi elaborada em 1981. Segundo o autor:
''código é um princípio, tacitamente adquirido, que seleciona e integra
significados relevantes, a forma de suas realizações e dos contextos que
evoca'' (1996a, p.110).
Segundo Bernstein, nos
diferentes artigos que escreveu, desde a década de 1970 até o início dos anos
de 1990, tinha como foco central a distinção entre formas de prática
pedagógica, em que se procurava verificar sua localização em termos de classe
social, e a ideologia subjacente a tais práticas. A partir do conceito de
enquadramento, o autor busca distinguir entre as práticas em que as regras
hierárquicas e discursivas estavam implícitas e aquelas em que estas regras
estavam explícitas. Baseando-se nisso, o autor afirma ter sido possível
identificar dois princípios de prática pedagógica: as visíveis e as invisíveis.
Uma prática pedagógica é denominada visível, quando as relações hierárquicas
entre estudantes e docentes e as regras de organização, relacionadas com a
seqüência e o ritmo do ensino-aprendizagem são explícitas e conhecidas pelos
estudantes. No caso das pedagogias invisíveis, as relações e regras são
implícitas e não são conhecidas pelo aluno. É que, neste último caso, a prática
pedagógica, suas regras e critérios são derivados de teorias complexas sobre o
desenvolvimento da criança e do adolescente, teorias da lingüística e da gestalt,
em alguns casos, teorias psicanalíticas. O argumento central sobre a
instituição e a escolha das famílias por escolas onde predominem um desses
tipos de práticas constitui-se em um conflito de natureza ideológica, entre
frações da classe média, sobre formas de controle. Para o autor, há uma
distinção entre os interesses de segmentos da classe média que trabalham no
campo da produção e os de segmentos que trabalham no campo do controle
simbólico. Essas diferenças na divisão do trabalho, no setor da produção e no
campo do controle simbólico, são complexas, muitas vezes se inter-relacionam e
terminam por oferecer as condições para o desenvolvimento de formas de prática
pedagógica distintas que se dirigem à formação de tipos de consciência ou de
formas de conduta também distintas. O autor mostra que foram realizadas três
pesquisas de base empírica, cujo objetivo era trabalhar com o desenvolvimento
da teoria em nível macro. Nesse sentido, buscava-se uma articulação entre
formas de divisão do trabalho e sua conexão com o sistema escolar, em termos da
construção e instituição de práticas pedagógicas compatíveis com os interesses
de diferentes frações das classes médias (1996a, p.112-113).
Finalmente, o autor amplia
sua teoria, ''incluindo a construção do discurso pedagógico como uma gramática
subjacente ao campo de produção, recontextualização e prática pedagógica''
(1996a, p.118). Bernstein utiliza-se muito de gráficos e diagramas, e seu
modelo é sintetizado em um diagrama, no qual dispõe os grupos sociais e suas
relações com o poder, o conhecimento e a consciência e suas conexões com o
dispositivo pedagógico; a seguir, dispõe as regras: distributivas,
recontextualizadoras e de avaliação; ao lado destas estão os campos de
produção, recontextualização e reprodução dos discursos, seguidos dos processo
de criação, transmissão e aquisição. O diagrama sinaliza com setas as origens e
inter-relações entre estes elementos (1996a, p.118)3. Com base nesse modelo foram
realizadas algumas pesquisas sobre a estrutura e as relações que estão nele
representadas.
Finalizando as explicações
que fornece sobre seu próprio processo de produção, Bernstein afirma que partes
de sua teoria sempre precederam a pesquisa. Seus alunos de pós-graduação
utilizaram-se das formulações teóricas produzidas pelo autor e estas
formulações, por sua vez, geraram mais questões para a teoria, exigindo maior
refinamento. Foi este o processo de produção teórica, por meio do qual
Bernstein desenvolveu seu trabalho. Buscou, ao longo dele, estabelecer uma
relação entre os insights no campo da teoria e a pesquisa de
base empírica, sem a qual ele afirma que não poderia ter elaborado os
princípios de descrição. É importante salientar que, para Bernstein, a teoria
deve fornecer uma descrição explícita e não ambígua sobre os objetos que
analisa.
Orientação teórica
Bernstein busca também
explicar a metodologia na qual se fundamentaram os projetos de pesquisa
realizados a partir de suas elaborações teóricas. Ele observa que se tem
indagado sobre o fato de seu trabalho fundamentar-se em dicotomias, em que cada
pólo, de certa forma, funciona como tipo ideal: elaborado/restrito,
posicional/pessoal, aberto/fechado, visível/invisível, coleção/integrado,
dentre outros. O autor concorda que trabalha com conceitos que se opõem, mas
não que se constituam tipos ideais, no sentido weberiano, como apontam alguns
de seus críticos. Para ele, um tipo ideal é construído com base em um modelo
que reúna um número de características abstraídas do fenômeno, de modo a
fornecer recursos para identificar a presença ou a ausência destas
características e um meio de analisar o fenômeno pelo conjunto de suas
características. No seu caso, estes conceitos são princípios que geram um grupo
de relações, nas quais qualquer forma em que eles se apresentem pode ser apenas
uma das formas reguladas por tais princípios. Nesse sentido, Bernstein enfatiza
que as dicotomias com as quais trabalha estão relacionadas com as fronteiras,
ou seja, sua preocupação é identificar a razão pela qual determinadas coisas
são colocadas juntas e outras separadas. A partir daí, é possivel interrogar:
Quais são os interesses que fazem com que sejam colocadas juntas? Quais são os
interesses que fazem com que se mantenham separadas? Estas questões levantam o
problema das relações de poder e da forma como estas relações se estruturam,
construindo fronteiras que possibilitam a manutenção e a circulação de poder em
seu interior (1996, p.126-127).
Reafirmando a influência de
Durkheim em seu trabalho, Bernstein justifica que o trabalho de Durkheim foi
considerado conservador, funcionalista ou positivista, pela forma como foi
recontextualizado, sobretudo nos Estados Unidos, com base nos estudos de
Parsons. Bernstein afirma que é, no entanto, a ligação de Durkheim com o
estruturalismo que fez com que vários autores classificassem o trabalho dele
próprio, Bernstein, como estruturalista. Entretanto, considera que essa
identificação do seu trabalho não o excluiria de outras influências.
Se o autor, por um lado,
busca definir a estrutura do sistema, por outro, também está preocupado com as
possibilidades de mudança, o que demonstra que seu trabalho está influenciado
por outras tendências diferentes do estruturalismo. Para ele, no entanto, as
interações relacionadas ao princípio de enquadramento têm um potencial para
mudar a classificação, ou seja, mudanças nas formas de controle podem resultar
em mudanças nas relações de poder. Como as formas de controle se relacionam com
as interações dos sujeitos, estes podem mudar por negociações/resistências o
tipo de enquadramento, o que pode vir a alterar as relações de poder que
estabelecem as fronteiras entre os grupos sociais e entre as formas de
conhecimento, por exemplo.
Finalmente, Bernstein
realça que existem trabalhos que buscam estabelecer relações entre sua teoria e
as teorizações produzidas por Foucault. Em síntese, o autor quer salientar que
seu trabalho é influenciado por diferentes fontes e, conseqüentemente, não pode
ser classificado em uma única tendência dentro do campo sociológico. Esta
singularidade é ressaltada em vários textos, de diferentes autores, voltados
para uma análise da produção de Bernstein.
AS GRANDES CONTRIBUIÇÕES
DO AUTOR
Pôde-se ver que várias
pesquisas e estudos foram realizados a partir de conceitos teóricos e de
modelos conceituais elaborados por Bernstein, mas, além disso, muitos artigos e
livros foram e têm sido publicados em torno da obra do autor. Esta parte do artigo
se fundamenta nestes trabalhos, sobretudo em três importantes publicações sobre
sua obra.
Em 1995, Alan Sadovnik
organizou uma coletânea, intitulada Knowledge & pedagogy: the
sociology of Basil Bernstein (Conhecimento e pedagogia: a sociologia de Basil Bernstein),
em que diferentes intelectuais de diversos países do mundo escrevem artigos
sobre e/ou baseados em Bernstein.
A edição está organizada em
seis partes e na primeira, em sessão introdutória, o próprio editor, Sadovnik,
faz uma apresentação crítica da produção de Bernstein, ressaltando que a obra
buscou apresentar uma visão geral do trabalho do autor, analisando alguns de
seus conceitos-chave, bem como examinar, com base na sociologia, as
controvérsias levantadas pelo seu trabalho. Da segunda até a quinta parte,
estão agrupados vários artigos de diferentes autores sobre diferentes aspectos
teóricos, práticos e de pesquisa relacionados às teorias e aos conceitos
desenvolvidos pelo teórico. Na última parte, Bernstein faz comentários sobre os
diferentes artigos, focalizando interpretações e usos e comenta também as
críticas postas em relevo nos escritos de diferentes autores.
Outra obra também de 1995,
intitulada Discourse and reproduction: essays in honor of Basil
Bernstein (Discurso e reprodução: ensaios em honra de Basil
Bernstein), foi editada por Paul Atkinson, Brian Davies e Sara Delamont. Os
editores afirmam, na introdução, que o livro não busca fazer uma exegese da
produção de Bernstein nem uma revisão de seu trabalho. A despeito da grande
contribuição do autor para a sociologia e de sua reputação internacional, os
editores consideram que o livro procura celebrar as contribuições de Bernstein,
sem se deter contudo apenas nos artigos sobre ele. A obra contém artigos de
acadêmicos experientes que expõem suas idéias, algumas relacionadas ao trabalho
do autor e outras, que constituem contribuições próprias desses autores para o
campo da sociologia da educação.
O periódico inglês
intitulado British Journal of Sociology of Education, no número 4,
do volume 23, editado em dezembro de 2002, publicou uma edição especial,
intitulada ''Basil Bernstein's: theory of social class, educational codes and
social control'' (A teoria de classe social, códigos educacionais e controle
social de Basil Bernstein). O editorial deste número destaca que foi pedido a
cada um dos colaboradores que explorasse de forma didática um aspecto
particular do trabalho de Bernstein relevante para a sociologia da educação e
para a pesquisa social.
Com base nessa literatura,
o artigo passará a apresentar os principais aspectos focalizados por alguns
trabalhos que podem contribuir para a compreensão tanto teórica quanto para
aplicações de seus conceitos em diferentes áreas da pesquisa sociológica.
Os trabalhos de
Bernstein no campo da sociolingüística
Diferentes autores
(Atkinson, 1995; Hasan, 2001) analisam os primeiros trabalhos de Bernstein no
campo da sociolingüística, as críticas que produziram e a explicação para
incompreensões e interpretações pouco acuradas do trabalho do autor. O fato de
ter discutido as diferenças entre a linguagem das crianças das camadas
populares e das camadas médias, identificando dois tipos de códigos, que ele
chama de restritos e elaborados, fez com que se tornasse alvo de várias
críticas, sobretudo a partir dos trabalhos de Labov, passando esses primeiros
estudos de Bernstein a serem associados com teorias do déficit cultural. O
próprio termo restrito pode ter influenciado as interpretações desses trabalhos
e parece que a melhor explicação sobre as questões suscitadas foi realizada por
Halliday, como se constatará a seguir.
Segundo Halliday (1995),
quando Bernstein lecionava no ensino básico, no final dos anos de 1950,
buscando entender o fracasso escolar das crianças de camadas populares, ele
começou a explicar a razão do problema em termos de diferença nas formas de
percepção. Enquanto as crianças das camadas populares aprendem a ser sensíveis
aos conteúdos e a perceber os fenômenos em termos das fronteiras existentes
entre eles, as crianças das camadas médias aprendem a ser sensíveis à estrutura
e a perceber os fenômenos em termos de suas mútuas relações. Bernstein, logo no
início de seus estudos, segundo Halliday, viu que tais diferenças eram
semióticas. Halliday mostra como, a partir daí, Bernstein estabeleceu uma
diferença entre a linguagem formal e a linguagem pública. Por um lado, a
linguagem pública, dentre outras características, apresenta frases curtas,
gramática simples, sentenças inacabadas, uso de conjunções, uso limitado de
adjetivos e advérbios, afirmações formuladas com questões implícitas, enfim, é
uma linguagem de significados implícitos. Halliday cita Bernstein, o qual
afirma que uma linguagem pública contém ''sua própria estética, uma forma de
expressão simples e direta, emocionalmente vigorosa, substancial e poderosa, e
uma gama de metáforas de considerável força e adequação'' (Bernstein, 1971,
p.54). Na linguagem pública, está também mais presente a conexão ou as relações
mais inclusivas. De maneira diferente, os códigos formais ou elaborados são
explícitos, apresentando um alto grau de planejamento em que a atenção do
ouvinte não é considerada como certa. Dessa forma, os códigos elaborados
constroem seus significados por meio de princípios mais gerais, que são
acessíveis apenas a certos grupos. Segundo Halliday, Bernstein fez com que esta
diferença parecesse paradoxa, usando as expressões universalista e particularista4.
Halliday salienta o fato de
Bernstein demonstrar que nas formas de aprender e usar um discurso, a criança
aprende um código que regula suas ações verbais e o que é necessário para atuar
na estrutura social em que está inserida. Citando literalmente Bernstein,
Halliday mostra que para o autor ''o discurso é o processo pelo qual a criança
vem a adquirir uma identidade social específica''. Halliday ainda ressalta que
Bernstein deixava bem claro que um código não era melhor que o outro, uma vez
que cada um possui sua própria estética e possibilidades.
Quando Bernstein publicou
seus estudos no campo da lingüística estava tornando-se polêmico o conceito de
déficit, o qual vinha embutido em determinadas concepções. Desta forma, segundo
Halliday, referindo-se ao conceito de códigos elaborados e restritos:
Seu
conceito de código restrito foi denunciado como se considerasse as classes
operárias como tendo inteligência inferior e toda uma mitologia foi construída
ao redor da questão do déficit versus diferença, na qual foi
destinado a Bernstein o papel de bode expiatório. (p.133)
Em tom indignado, Halliday
afirma que, convivendo com Bernstein, conversando com ele ou lendo seus
trabalhos, a associação destes com a teoria do déficit é tão bizarra que fica
até difícil dar uma resposta a essa ordem de acusação. Vai além, mencionando
que Mary Douglas já havia tornado claro que era óbvia a solidariedade de
Bernstein para com as crianças das classes operárias. Halliday argumenta que
Bernstein mostrou os mecanismos pelos quais o acesso ao código elaborado estava
associado à questão de classe social. Como nos Estados Unidos, onde o problema
de classe social está mascarado pela questão étnica, existe um tabu sobre a
discussão que envolve classes sociais. Assim, de acordo com Halliday, ao abrir
esta discussão, os ataques de que foi alvo se constituíram basicamente em uma
resposta de pânico.
Halliday afirma que
Bernstein percebeu claramente que a linguagem não reflete de forma passiva nem
a construção conceitual da realidade material, nem de um determinado modelo de
relações sociais. Parte da idéia de que as formas do discurso também não são
neutras, são, ao contrário, partes integrantes da dinâmica social com suas
desigualdades e assimetrias de acesso ao poder e ao conhecimento. Nesse
sentido, segundo ainda o autor, ''estas desigualdades devem estar presentes nas
atividades semióticas pelas quais poder e conhecimento são construídos''
(Halliday, 1995, p.138).
Finalizando, Halliday
salienta a contribuição de Bernstein no campo da lingüística afirmando:
...Bernstein
constitui, como Bühler e Malinowski, uma das figuras principais, que não
pertencendo ao campo da linguística influenciou criticamente nossa forma de
pensar sobre a linguagem. [...] Os linguistas, atualmente, têm uma visão mais
rica dos processos de significação em decorrência do trabalho de Bernstein.
(p.141)
Tendências e orientações
teóricas no trabalho de Bernstein
Diferentes autores atribuem
a Bernstein as mais diferentes orientações teóricas, assim como apontam
influências de diferentes correntes na sua produção. A afirmação de que seu
trabalho é original e representa uma síntese pessoal de diferentes tradições
mostra que realmente é difícil tentar enquadrar o trabalho de Bernstein em
determinada filiação ou corrente de pensamento no campo das ciências sociais.
Alguns autores tentam demonstrar, por exemplo, as afinidades entre Bernstein e
o estruturalismo, enquanto outros classificam sua produção como inspirada em
autores clássicos da sociologia, havendo ainda os que associam alguns de seus
trabalhos às correntes pós-estruturalistas.
Entre os que discutem a
visão estruturalista nos trabalhos de Bernstein, encontra-se Atkinson (1995).
Este autor inicia um artigo dizendo que escrever sobre o estruturalismo
presente nos trabalhos de Bernstein não é o mesmo que dizer simplesmente que
ele é um estruturalista5, uma vez que o trabalho de
Bernstein constitui uma síntese com origem em diferentes tradições teóricas6.
Indicando diferentes
tendências dentro do estruturalismo, Atkinson afirma que ''é na noção de
código, entretanto, que o estruturalismo de Bernstein está formulado em sua
maneira mais potente (e mal interpretada)''. O autor argumenta que código para
Bernstein é um princípio regulador ou um mecanismo subjacente às manifestações
de superfície do discurso, da percepção e da ordem do sentido, isto é, para
Bernstein o código regula a seleção e organização dos discursos. Atkinson,
fundamentando-se em afirmações de Bernstein7, mostra que nas análises deste
último há uma distinção entre a estrutura invisível e mais profunda dos códigos
e de seus princípios gerativos e as estruturas visíveis e de superfície das
suas realizações na prática social (1995, p.92).
Outro autor que relaciona o
trabalho de Bernstein ao estruturalismo é Sadovnik (1995). Ele enfatiza que
Bernstein nunca abandonou uma posição estruturalista inspirada em Durkheim,
tendo também incorporado uma visão neomarxista e categorias weberianas no
conjunto de sua produção. Todavia, diz que é preciso remover algumas idéias
sobre o funcionalismo que são associadas ao estrutural-funcionalismo, para se
entender a sociologia de Bernstein. Sadovnik argumenta que o trabalho mais
recente de Bernstein converge para a tradição européia do estruturalismo em
razão de sua ênfase em sistemas classificatórios, manutenção de fronteiras e
uso do conceito de códigos. Para este autor, no entanto, a sociologia de
Bernstein busca incorporar ao estruturalismo a teoria do conflito. Em resumo,
como outros autores, Sadovnik termina por afirmar:
Mais
do que trabalhando a partir de uma teoria sociológica, ou tentando sintetizar
um número de teorias, Bernstein tem tentado desenvolver e refinar um modelo que
seja capaz de descrever as complexas relações entre diferentes aspectos da
sociedade. (p.30)
A originalidade do trabalho
de Bernstein se encontra na possibilidade de conjugá-lo com diferentes
tendências do pensamento social. As afinidades entre algumas de suas idéias e
as de Foucault têm sido realçadas por diferentes autores, como afirma Tyler
(1995). Como Foucault8, Bernstein está interessado nas
relações entre poder, conhecimento e discurso, mas critica Foucault, afirmando
que no trabalho deste não há uma análise substantiva das relações entre
agências, sujeitos e das relações sociais por meio das quais poder,
conhecimento e discurso agem como dispositivos reguladores (Bernstein, 1990,
p.134). Baseando-se em Diaz, Tyler afirma que, enquanto Bernstein trabalha no
nível macro, buscando compreender as relações entre o discurso pedagógico e as
classes sociais, Foucault, por meio de estudos de natureza microanalítica,
busca detectar o poder regulador do discurso. A similaridade entre ambos é que
os dois estão preocupados em demonstrar como hierarquias e diferenças são
constituídas por meio de técnicas, procedimentos e regras que classificam,
normalizam e constroem os diferentes grupos sociais.
Assim como alguns
acadêmicos que baseiam seus trabalhos em análises de teorias
pós-estruturalistas, intelectuais que estudam a questão de gênero encontram na
produção de Bernstein idéias e conceitos para desenvolver seu trabalho. Arnot,
por exemplo, escreve um artigo em que expõe as influências dos estudos de
Bernstein acerca dos códigos educacionais sobre a teoria feminista. A autora
considera que os conceitos de classificação e enquadramento podem ser
utilizados para explicar como a cultura escolar é marcada pelas relações de
gênero (1995, p.309). Da mesma maneira, Delamont (1995) afirma que apesar de
Bernstein não ter escrito sobre gênero especificamente, seu trabalho contém
orientações teóricas e dados empíricos para os estudos e pesquisas voltadas
para a questão.
Por último, não se pode
deixar de destacar que o trabalho de Bernstein tem sido utilizado em cruzamento
com o de outros autores, como, por exemplo, Vygotsky (Morais, 2002; Daniels,
2001), além de servir como uma das referências importantes para os que
trabalham com os processos de escolarização das elites e classes médias
(Cookson, Persell, 1995; Power, Whitty, 2002) e, principalmente, para os
pesquisadores que se voltam para a investigação das interações e práticas da
sala de aula, incluindo desde a educação infantil até o ensino superior (Jenks,
1995; Davies, 1995; Tyler, 1995; Moss, 2002).
CONCLUSÃO
É interessante observar
como as fortes críticas ao trabalho de Bernstein sobre códigos restritos e
elaborados tiveram um papel definitivo na sua produção intelectual. Ao invés de
causarem inibição ou barreiras, atuaram como desafios para que ele aprofundasse
a produção dos conceitos, tornando-os mais precisos e abrangentes, refinasse
sua produção teórica, muitas vezes explicitando o implícito. Foi a crítica que
também o levou a explicar seu próprio processo de produção intelectual,
mostrando suas conexões com a pesquisa de base empírica. Além disso, em seus
textos e intertextos, o autor está sempre dialogando e respondendo às criticas
potenciais ou já elaboradas ao seu trabalho. De forma explícita há, além de
afirmações feitas nos próprios estudos, uma seção em que responde a cada uma
das interpretações ou críticas de seu trabalho, em livros por ele escritos ou
por outros intelectuais comentando o seu trabalho (Bernstein, 1996; Sadovnik,
1995).
Na minha vida acadêmica,
tenho por diversas vezes usado conceitos e idéias de Bernstein, uma vez que sua
obra possibilita a incursão em vários campos da prática pedagógica, que é um
objeto central no meu trabalho como professora e pesquisadora. Como diversos
autores enfatizam, seus conceitos de classificação e enquadramento mostram-se
como ferramentas importantes para entender o campo do currículo, as disputas em
torno das disciplinas, assim como as diversas formas de construção da prática
pedagógica, em função e como resultado dos diferentes interesses das classes
sociais. O texto sobre ''Pedagogias visíveis e invisíveis'', publicado em Cadernos
de Pesquisa (Bernstein, 1984), é uma leitura imprescindível para o
entendimento de diferentes propostas pedagógicas, sobretudo hoje, quando os
sistemas educacionais passam por processos de mudança de diferentes níveis.
Considero, no entanto, o
texto sobre o discurso pedagógico o que mais contribuiu para que eu
compreendesse o processo de produção do conhecimento escolar – sua construção e
circulação. Nele, além da síntese de conceitos previamente elaborados,
Bernstein oferece uma análise profunda e consistente sobre um campo pouco
explorado. O processo de constituição dos saberes escolares, a sua distinção
das outras formas de conhecimento e seu processo de produção introduzem um
debate de fundamental importância para quem discute a prática pedagógica em
geral ou a que ocorre no interior de uma determinada disciplina.
A originalidade,
contemporaneidade e relevância dos problemas abordados por Bernstein constituem
um legado inestimável para quem está preocupado com a escola, sua organização,
seus processos de trabalho, de socialização dos conhecimentos e valores, suas
relações com a comunidade na qual ela se insere. Sem oferecer soluções para os
problemas com os quais a educação se defronta, Bernstein constrói conceitos e
teorias que possibilitam iluminar a compreensão da complexa teia de relações
entre escola e sociedade. Se a compreensão de um fenômeno por si mesma não produz
mudanças é, no entanto, condição necessária para que estas ocorram.
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Fonte: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-15742003000300003. Título original: 'Bernstein e o campo educacional: relevância, influências e incompreensões'.