Por Carlos Melo
(Cientista político)
O destino do PSDB não tem
mais importância; a legenda demonstrou que está sincronizada com a média do
sistema político nacional. Nem promessas de voltar atrás no apoio ao governo
Temer são relevantes. Risíveis são as declarações de que se pautaram pela
''ética da responsabilidade'', pesando meios e fins em relação ao país. Triste
fim de Max Weber, acabar como sofisma em bico de tucano.
Pedantismos
sociológicos à parte, o maior problema é mesmo o Brasil, hoje um vazio de
ideias e lideranças; deixado à sorte da crise, sem referências que possam
contornar a situação. Tão cedo, não se constituirá um centro capaz de reestruturar
seu sistema político, reformando e modernizando-o. A lacuna ao centro
favorecerá a polarização e o populismo, o que traz riscos evidentes.
De
imediato, o que se vê é que a crise não cessará: o governo Temer é um trem
descarrilhado; admite todo o tipo de concessões para se salvar e se fortalecer
de modo a atropelar o que resta de instituições. Seus desmentidos não escondem
intenções de que o objetivo é desqualificar os principais agentes da Lava Jato:
o ministro Edson Fachin e o Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot.
''Estancar a sangria'', como disse Romero Jucá.
No
quadro presente, será improvável fazer reformas estruturais e conduzir ajustes
fiscais relevantes. A reforma Trabalhista, por adiantada tramitação, ainda vai;
mas a da Previdência tende a ficar para as calendas — dificilmente será
aprovado mais que um símbolo. Ao mesmo tempo, renegociações com estados e todo
tipo de interesse que possam significar proteção política, agravarão a situação
das contas públicas.
À
existência de um teto de gastos, é justo imaginar cortes de investimentos e na
área social; ou que venham aumentos de impostos. Também a economia será incapaz
de um salto significativo; a aceleração, se houver, será lenta. Para
investidores estrangeiros, o país ainda é melhor caminho para ganhos elevados
do que os demais BRICS; mais cautelosos, nativos olham com apreensão, colocam o
pé no freio. Dificilmente, o padrão de crescimento do primeiro trimestre se
repetirá.
Ao
mesmo tempo, no front político não há perspectiva de paz: as denúncias contra o
presidente, sua equipe e aliados não cessarão; há, sem dúvida, muito potencial
de desgastes. Enterrar a Lava Jato é sonho de dez em cada dez dos mais de
trezentos picaretas que, em quase todos os partidos, estão envolvidos com ela.
Mas, não há força para isso: bem ou mal, a sociedade reage. No mínimo, há um
empate estabelecido. Para desespero de Jucá, o sistema continuará a sangrar.
O
sistema de pesos e contrapesos da democracia foi afetado: o Tribunal Superior
Eleitoral deu mostras de uma Justiça incapaz de arbitrar o conflito político;
houve aí o desgaste de personagens e instituições, que, pela omissão ou ação
parcial, perderam credibilidade. A possibilidade de algum avanço nesse campo
ficará por conta do Supremo Tribunal Federal — a última cidadela, também
cercada de controvérsia.
Logo,
o país não sai da sinuca tão já. As eleições do ano que vem devem ocorrer
envoltas nesse ambiente — e é plausível que o país continue encalacrado mesmo
depois delas. Numa atmosfera de muita incerteza, a disputa eleitoral pode
ferver ao mesmo ritmo das tensões sociais, com retroalimentação de ambos. PT,
Ciro Gomes, Marina Silva, Jair Bolsonaro, João Doria; nomes colocados, qual
seria capaz de abrir diálogos, propor pactos e estabelecer limites às contendas?
De onde menos se espera é mesmo de onde nada vem.
A
pergunta que não pode ser negligenciada é: quanto tempo a democracia brasileira
suportará? Nossas tradições não nos garantem. Ademais, democracia não prescinde
de lideranças. O diabo é enxergar onde elas estão. A ''ética da
responsabilidade'' exigirá coragem para mudar, posturas morais, propostas
reformistas no campo político; comunicação, diálogo e firmeza. Não há espaço
para sofismar.
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Fonte: http://carlosmelo.blogosfera.uol.com.br/