sexta-feira, 26 de abril de 2013

'Sentimentos do Mundo': Entre Drummond e Paulo Diniz


No caminho do mundo, segundo Paulo Diniz: encanto ou desencanto da vida  


Em atenção a uma sugestão, faço a postagem a seguir sobre Paulo Diniz e os seus 70 anos de música e poesia. Pernambucano do agreste do estado, da cidade de Pesqueira, Diniz consagrou-se nacionalmente com uma substancial obra, que vai desde a 'musicalização de poetas', como Carlos Drummond, até a trabalhos/composições com valor ontológico - o ser, o tempo, a existência. Os Sentimentos do Mundo, lembrando Drummond. E assim temos, por exemplo:

Caminhos que me levam
Não têm Sul nem Norte
Mas meu andar é firme
Meu anseio é forte
Ou encanto a vida
Ou desencanto a morte
(Paulo Diniz, Vou-me Embora) 

 Paulo Diniz - canto de uma obra múltipla                                                                                                                                       

Por Juareiz Correya 

Nascido em Pesqueira, Agreste de Pernambuco, no dia 24 de janeiro de 1940, Paulo Lira de Oliveira perdeu o pai, Manuel Roque, ainda criança, e foi criado com o sacrifício da mãe, dona Amélia, costureira pobre, que fez de tudo para alimentar, vestir e educar o menino junto com a irmã, mais nova, Maria das Dores. Depois da escola, o menino Paulo (quase foi registrado como Paulo Cícero, por causa do desejo da mãe em sua religiosidade nordestina) se virava como engraxate, na tentativa de ajudar a mãe e a irmã e, na escola da vida, abria mais os olhos, a mente e o coração para além da Serra do Ororubá, luz e norte de Pesqueira.

Ainda jovem, Paulo iniciou a carreira de radialista na sua cidade natal, trabalhando na Rádio Difusora Pesqueira. Mudou-se para o Recife, foi locutor na Rádio Jornal do Commercio e trabalhou ainda como locutor em rádios do Ceará. Foi o jovem radialista Paulo Oliveira que chegou ao Rio de Janeiro, em 1964, para trabalhar na Rádio Tupi, Rádio Mayrink Veiga, e ingressar na emissora que liderava a audiência popular na capital carioca : a Rádio Globo. 
Trabalhando na Globo, cantarolando algumas coisas nas horas vagas, o pernambucano fez uma composição de brincadeira, e um amigo radialista, de quem era parceiro, no seu programa, em tom descontraído, dizia : "E então, seu Diniz ? Está triste ou está feliz ?" O bordão servia como introdução para tocar a "brincadeira musical" do cantor inédito Paulo Diniz (assim lançado com o compacto simples da sua composição "O chorão"). A tal brincadeira, sucesso antecipado no Programa Luiz de Carvalho, estourou nas rádios de todo o País (chegou na época a tocar/vender mais do que Roberto Carlos). Paulo faturou shows em todos os Estados brasileiros, sem obra definida, na base do compacto simples, e bastava "cantar só um lado" que era o que o povo queria.
Do fulminante sucesso do compacto lançado pela Discos Copacabana em 1966, o cantor, que havia desistido de seguir a carreira de radialista, viveu um tempo amargo de dureza e mergulhou na vida boêmia do Rio de Janeiro em busca dele mesmo, da sua identidade como homem e como artista. Cantava em bares para sobreviver. Violonista autodidata, músico intuitivo, criador inquieto e aberto para a profusão de idéias e criações do seu tempo, Paulo Diniz enveredou pelo caminho sem fim do rico e inesgotável cancioneiro popular brasileiro. E, com a sua música simples, marcada por uma interpretação personalíssima, em companhia de um letrista carioca, tão sofrido quanto ele, compôs e lançou um elepê com as suas canções e do parceiro Odibar : QUERO VOLTAR PRA BAHIA (Odeon, Rio, 1971), produzido pelo amigo e radialista Adelzon Alves, lançado com sucesso, firmou o nome de Paulo Diniz na emblemática constelação da MPB. A história desse disco, em particular, merece um instigante capítulo à parte na biografia de Paulo Diniz e na história do nosso cancioneiro moderno.
O criador inquieto e insatisfeito, como todo artista verdadeiro, não se "aquietava" mesmo com o sucesso. E lia, de cambulhada, o que lhe chegava às mãos e o que o seu coração descobria nas andanças e outras harmonias do mundo. Drummond, vivo, dizia, turbilhonando a sua cabeça : E agora, José ? E agora, Paulo ? E agora você ?
Quando musicou e lançou o poema "José", fazendo com que o maior poeta brasileiro vivo fosse cantado, de norte a sul do País, por crianças de 8 a 80 anos, Paulo Diniz surpreendeu muita gente e até provocou preconceito no meio jornalístico que, desrespeitosamente, não o considerava "capaz" de musicar a poesia de Drummond. Era muita ousadia...
Pois é. Ele ousou e fez. Ao longo de sua carreira - mais de 100 canções, de sua autoria e com alguns parceiros, gravadas em 15 elepês e CDs, Paulo Diniz já compôs e interpretou composições, além de Drummond, com a poesia de Manuel Bandeira("Vou-me embora pra Pasárgada"), Ferreira Gullar ("Bela bela"), Jorge de Lima ("Essa Nega Fulô", Gonçalves Dias ("Canção do Exílio"), Gregório de Matos ("Definição do Amor"), Augusto dos Anjos ("Versos Íntimos") e Adélia Prado ("Amor Feinho"). E tem ainda poemas musicados inéditos de Ascenso Ferreira, Jayme Griz, Zé da Luz, e mais Adélia e mais Drummond. Todos os poemas musicados serão reunidos na edição especial de um CD - PAULO DINIZ E O SENTIMENTO DO MUNDO - que será lançado em breve.
Nos seus 70 anos de música e poesia, Paulo Diniz continua o mesmo compositor e músico intuitivo com a sua criatividade antenada com a leitura do "sentimento do mundo", aliando a sua voz à interpretação da palavra mais humana de notáveis poetas brasileiros.

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