Reconfigurações da social-democracia: perspectivas de outro tipo.
Por Tânia Madeira
O título do artigo do The
Guardian diz quase tudo: “Não há alternativa à austeridade? Essa mentira está
agora desvendada”. Portugal é o tema central. Mas se há uns tempos o país era a
montra da austeridade, hoje é um exemplo exatamente pelo oposto. Mal abrimos
o artigo, encontramos o Bairro Alto, em Lisboa. É esta a fotografia
escolhida para ilustrar o artigo de opinião que dá uma bofetada a todos quantos
garantiam que não havia alternativa à austeridade.
Os
cortes duros e demorados que foram apresentados como a única solução para
a sobrevivência, depois da crise financeira que mergulhou muitos países num
caos económico, são para o jornal inglês, uma falácia. Uma mentira que foi
desvendada: “Graças a Portugal, sabemos quão grande foi o falhanço desta
experiência forçada na Europa”, lê-se no artigo de opinião assinado
por Owen Jones.
O
colunista explica como Portugal, um dos países europeus mais atingidos pela
crise económica, enfrentou um resgate com duras medidas
de austeridade “exigidas pelos credores e aplicadas com entusiasmo” pelo
governo liderado por Pedro Passos Coelho.
O
jornal lembra algumas das medidas tomadas como a privatização de serviços
públicos, aumento do IVA, a sobretaxa de IRS, salários e pensões, e outros
benefícios, reduzidos. E aponta como os “cortes devastadores” na educação,
na saúde, segurança social tiveram “consequências humanas terríveis”.
Mas, em tom de ironia, lê-se: “tudo isso era necessário para curar a doença do
excesso de gastos. Foi a lógica”.
Depois
da crítica à falácia da austeridade, o The Guardian explica como tudo mudou a
partir do final de 2015 com a geringonça, aquilo a que o jornal chama “uma
nova experiência de governo” liderada pelo primeiro-ministro António Costa e apoiada
pelos partidos da esquerda radical. Prometeram virar a página da austeridade,
contra todos aqueles que previam o desastre, ou mesmo uma tragédia grega, à la
Syriza, mas o “desastre prometido não se materializou”.
O
jornal inglês escreve, mesmo, que o governo português se pode orgulhar, ao
ter conseguido um crescimento económico sustentável, um aumento de
13% no investimento, redução do défice em mais de metade para 2,1%, o mais
baixo de sempre em quatro décadas, apenas um ano depois de ter assumido o
poder. E remata: “esta é a primeira vez que Portugal cumpre as regras
orçamentais da zona euro”, referindo-se à saída de Portugal do Procedimento por
Défice Excessivo (PDE). “E entretanto, a economia cresce há treze trimestres
consecutivos”.
O
artigo, que faz o governo português corar de elogios, faz crer que
Portugal “pode
oferecer-se como um modelo para o resto do continente”. E diz porquê:
“conseguiu aumentar o investimento público, reduzir o défice, reduzir o
desemprego e alcançar um crescimento económico sustentado”. Tudo isto
devolvendo rendimento e confiança às pessoas e atraindo de novo os
investidores. Numa frase: “Portugal conseguiu aquilo que nos tinha sido
dito que era francamente impossível”.
O
sucesso de Portugal é “inspirador e frustrante” porque levanta questões
perturbadoras: “Para quê esta miséria humana na Europa? E a Grécia, onde
mais da metade dos jovens caiu no desemprego, onde os serviços de saúde
foram dizimados, onde a mortalidade infantil e o suicídio aumentaram? E
Espanha, onde centenas de milhares foram expulsos de suas casas? E França, onde
a insegurança económica alimentou o crescimento da extrema direita?”.
A
lição à Europa chega no fim: “Portugal dá a todos uma valente repreensão. A esquerda
europeia deve usar a experiência portuguesa para remodelar a União Europeia e
travar a austeridade em toda a zona euro. Ao longo da década perdida da Europa,
milhões de nós consideraram que havia uma alternativa. Agora temos a prova.
----------------------
Fonte: http://www.jornaleconomico.sapo.pt/noticias/portugal-acabou-com-a-mentira-ha-alternativa-a-austeridade-escreve-o-the-guardian-200727#.WaAjdif8_Kn.facebook