segunda-feira, 6 de maio de 2013

António Nóvoa - Profissão Professor: Cenários do trabalho docente


Abaixo, extratos de uma intervenção de António Nóvoa, autor com vasta obra e pesquisa nas Ciências da Educação sobre a problemática educativa, e também, atualmente, Reitor da Universidade de Lisboa. Os extratos são de uma intervenção sua no âmbito de uma atividade da FENPROF (a  principal Federação dos Professores Portugueses). Como ele próprio tem realçado ultimamente, é chegado o momento de se fazer um debate claro e direto sobre a educação, situando de modo objetivo, por exemplo, o que se requer da escola e o papel do trabalho docente.  É chegado o momento de ultrapassar o excesso de discursos, as “espumas de palavras”, as citações inócuas, os textos que muito falam, mas nada dizem. Pode ser que leve tempo, mas é chegado o momento. Conceber a escola no que lhe é específico (assegurar a aprendizagem), é a melhor forma de se “carimbar um passaporte” para a inclusão – e o contrário: não o é transformá-la numa espécie de instituição de prevenção/assistência social, em detrimento da aprendizagem, sobrecarregando os professores com funções que não são da sua responsabilidade. 





"Estamos a assistir, nos últimos anos, a um regresso dos professores e à afirmação da profissão docente, depois de quase quatro décadas de relativa invisibilidade", começou por referir António Nóvoa, que retomou e actualizou no auditório da Secundária de Camões os "desafios" da conferência que realizou a pedido da União Europeia, em Setembro de 2007.*

"É certo que a sua importância, dos professores e do seu trabalho, nunca esteve em causa, mas os olhares viraram-se para outros problemas e preocupações: nos anos 70, foi o tempo da racionalização do ensino, da pedagogia por objectivos, do esforço para prever, planificar, controlar; depois, nos anos 80, assistimos a grandes reformas educativas, centradas na estrutura dos sistemas escolares e, muito particularmente, na engenharia do currículo; nos anos 90, dedicou-se uma atenção especial às organizações escolares, ao seu funcionamento, administração e gestão", lembrou o Reitor da Universidade de Lisboa, que caracterizou aqueles períodos como momentos de diminuição da capacidade de intervenção da profissão docente e de substituição dos professores por "novas ferramentas".

Entretanto, no início deste século XXI, realça Nóvoa, começa a notar-se a necessidade de "dar uma nova centralidade à profissão docente".

"Quatro ideias muito simples" 
apontadas à valorização da profissão 
Mais adiante, o prestigiado investigador deixou à apreciação da assistência "quatro ideias muito simples" apontadas à valorização da profissão docente.


A primeira: "é preciso passar a formação de professores para dentro da profissão", é preciso reforçar "a intervenção da profissão na formação dos seus profissionais".

A segunda: "é preciso promover novos modelos de organização da profissão". Nóvoa destacou a importância da cultura profissional e afirmou, a propósito, como exemplo, que a profissão integra mal os jovens profissionais na profissão ("por vezes, são para eles os piores horários, as piores turmas e as piores escolas"). Realçou a importância do trabalho de equipa, observando a dado passo:

"Grande parte dos discursos torna-se irrealizável se a profissão continuar marcada por fortes tradições individualistas ou por rígidas regulações externas, designadamente burocráticas, que se têm acentuado nos últimos anos. A colegialidade, a partilha e as culturas colaborativas não se impõem por via administrativa ou por decisão superior. Mas, a exemplo de outras profissões, como os médicos, os engenheiros ou os arquitectos, pode inspirar os professores. O modo como construíram parcerias entre o mundo profissional e o mundo universitário, como criaram formas de integração dos mais jovens, como concederam uma grande centralidade aos profissionais mais prestigiados ou como se predispuseram a prestar contas públicas do seu trabalho são exemplos para os quais vale a pena olhar com atenção."

Segundo o Reitor da UL, há, entre os professores, "uma forte identidade sindical", mas a cultura profissional "é ainda frágil". Matérias fundamentais como a nova concepção de escola, a cultura colaborativa, capaz de introduzir dinâmicas de diferenciação, e as referências profissionais marcaram, nesta fase, a intervenção de António Nóvoa, atentamente seguida pelo auditório.

A terceira: é a avaliação, abordada na perspectiva de elemento central, pilar da afirmação das profissões, relacionado com os itens de confiança, credibilidade e prestígio. Nóvoa deixou, nesta matéria, uma crítica contundente às "práticas empobrecedoras" de avaliação. Depois de caracterizar três formas possíveis de avaliação (inter-pares, como sucede no Ensino Superior; externa, realizada pelos "experts"; e de mecanismos hierárquicos), o Reitor da Universidade de Lisboa manifestou-se a favor da primeira, afirmando a propósito: "Devem ser os professores a ocupar este espaço. Se não, serão outros a fazê-lo".


A quartaé preciso reforçar a presença pessoal e pública dos professores. "Há que dinamizar a capacidade de intervir publicamente", sublinhou António Nóvoa. "É ainda frágil a intervenção dos professores no debate sobre as questões da Educação". Depois, deu um exemplo significativo e deixou um desafio:
Nos jornais "fala-se muito das escolas e dos professores. Falam os jornalistas, os colunistas, os universitários, os especialistas. Mas há uma ausência dos professores, uma espécie de silêncio de uma profissão que perdeu visibilidade no espaço público. É necessário que os professores também marquem presença, é necessário que os professores também aqui intervenham mais".

A força de uma profissão define-se, em grande parte, 
pela sua capacidade de comunicação com o público
"Hoje, impõe-se uma abertura dos professores ao exterior. Comunicar com a sociedade é também responder perante a sociedade. Possivelmente, a profissão tornar-se-á mais vulnerável, mas esta é a condição necessária para a afirmação do seu prestígio e do seu estatuto social. Nas sociedades contemporâneas, a força de uma profissão define-se, em grande parte, pela sua capacidade de comunicação com o público", observou.

Nos momentos finais da sua intervenção, Nóvoa associou a revalorização da cultura escolar e a redefinição da escola a uma visão de futuro e destacou  a necessidade de construir uma escola centrada na aprendizagem: não basta estar na escola, é preciso que todos aprendam na escola!



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