quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Por que Dilma sobe e Aécio despenca?

Resultado da última pesquisa Datafolha

Por Ivonaldo Leite 

Dizia o italiano Paolo Mantegazza que ‘a ciência é o melhor instrumento para medir a ignorância’. Ao analisarmos a atual campanha presidencial, de forma retrospectiva, não cabe senão reconhecer pertinência à afirmativa de Mantegazza – isto se o analista mobiliza métodos que, sendo originários do consistente background da ciência social, lhe permitam ir além da aparência dos fenômenos.  Entendamo-nos.
Após o primeiro turno, seguiu-se uma “onda” de entusiasmo no ninho tucano, com o candidato Aécio, de dedo em riste, praticamente a montar a equipe do seu governo, já tendo até mesmo divulgado quem seria o seu Ministro da Fazenda – Armínio Fraga, ex-Presidente do Banco Central (no Governo Fernando Henrique Cardoso). Contudo, esta última semana que precede a eleição está a cair como um balde de água fria entre os tucanos, com recuperação da Presidente Dilma, estando ela, segundo as últimas sondagens, à frente do seu oponente. Por que então sobe Dilma e despenca Aécio?
Comecemos com o mais prosaico: a avaliação do governo federal. Tão afeitos à erudição, os tucanos “esqueceram” de fazer a devida leitura da série estatística de avaliação do Governo Dilma. Mesmo nos momentos mais difíceis da gestão da Presidente (como em junho de 2013), quando, imprudentemente, determinados órgãos de imprensa divulgavam que as ‘sete pratas do Egito tinham caído sobre o país’, a taxa de rejeição do Governo (ruim e péssimo) nunca foi superior à soma de ótimo, bom e regular - conforme pode ser observado no gráfico abaixo. Agora, em outubro, ótimo e bom somam 42%, tendo-se uma taxa de regular de 37%. Ora, com uma avaliação dessas, como imaginar que o Governo estava liquidado ou era impopular? Mas os tucanos seguiram com a escalada de equívocos.

Fonte: Datafolha - 20/10/2014
 O segundo erro foi eleger como pólo mobilizador da campanha o ódio contra o PT, brandindo que ‘deve ser banido da administração brasileira, que ‘é um ajuntamento de corruptos’, e coisas do gênero (a propósito foi, e é, no mínimo, estranho ver pessoas religiosas, aecistas, sendo movidas pelo discurso do ódio...).  Como o ódio, de acordo com a sabedoria antiga, envenena a alma, e assim cega, os tucanos tornaram-se incapazes de reconhecer o papel positivo que o PT desempenhou na história brasileira (reconhecido até por outros críticos do partido). Mais ainda, passaram a se referir ao partido de forma homogênea, como se todos aqueles que integram a legenda e/ou que tomaram parte na sua construção fossem partícipes de eventuais ilícitos cometidos por alguns, e que, diga-se, estão sob investigação ou cumprindo penalidades. O resulto disso é que o PSDB conseguiu algo inédito: fez com que antigos integrantes do partido, que estavam afastados (ou até mesmo já tinham se desfiliado da agremiação), voltassem a firmar fileiras em defesa da reeleição da Presidente Dilma, sentindo-se insatisfeitos (e mesmo agredidos) com as injúrias tucanas.
O terceiro equívoco foi apontar o dedo como uma metralhadora giratória, com o tucanato de alta plumagem se apresentando como guarda-chaves da ética – sem que tenha a menor condição para isso. A última semana e a presente têm sido ilustrativas na demonstração disso. Ao abrir a mala dos escândalos do PSDB, em um dos debates, e perguntar onde estavam os envolvidos nos casos Sivam, compra de votos para a reeleição, pasta cor de rosa, mensalão tucano de Minas Gerias e compra de trens em São Paulo, respondendo, em seguida, ‘todos soltos’, a Presidente Dilma mostrou como é seletiva e hipócrita a preocupação ética do PSDB. Para completar, nos últimos dias, da tão repisada questão Petrobras, onde, diga-se, o Governo colabora com as investigações, chega a informação que tucanos graúdos receberam propina.
O quarto erro veio do bico do tucano-mor. Ultimamente, o ex-Presidente Fernando Henrique Cardoso tem tendido a dizer coisas empoladas. Ao afirmar que os eleitores da Presidente Dilma eram desinformados, a um só tempo, deu “lustração” para manifestações preconceituosas contra os nordestinos e aglutinou a insatisfação destes contra o candidato Aécio. Mas o ex-Presidente não parou por aí. A sua última é uma crítica à distribuição de bolsas pelo Programa Ciências Fronteiras, para que jovens graduandos brasileiros tenham uma experiência em universidades estrangeiras. Pelo seu passado como acadêmico, essa é uma posição que não se esperava dele. Mas dele também não se esperava – como ocorreu em seu governo - que passasse oito anos sem abrir uma nova universidade federal no país e nem mesmo  realizasse concurso para as existentes. Talvez devamos lembrar que, no processo de alianças que o levou à Presidência da República, ele pediu-nos que esquecêssemos o que havia escrito como sociólogo.
Os tucanos apresentam-se, ainda, sustentando dois emblemas: renovação e competência. A propósito da renovação, trata-se de um caso conceitual único, ou seja, renovar significa então voltar ao passado – entregar novamente o governo aos que o controlavam antes. Alegam a necessidade de alternância de poder, mas esse é um discurso que, para eles, não vale em São Paulo, onde estão no Palácio dos Bandeirantes há mais de vinte anos. E a competência? O terreno aí é, no mínimo, gelatinoso. Após “tantos anos de competência” em São Paulo, o que se tem, hoje, é falta de água, racionamento, que eles, com astúcia retórica, chamam de ‘administração de recursos hídricos’.
Last but not least, o peso dos fatos imputados à vida pregressa do candidato Aécio Neves: episódios relacionados à Lei Maria da Penha, à Lei Seca, à questão das drogas, à conduta na administração de Minas Gerais, etc. No caso da reação das mulheres ao candidato, é significativa a inversão de curva que as últimas pesquisas têm captado, e mesmo entre os homens, conforme pode ser visto nos dois gráficos abaixo.


datafolha sexo


Faltando poucos dias para a eleição, essa tendência de fato é um péssimo sinal para Aécio Neves. Se ela for consolidada daqui até domingo, como consolo, restará aos tucanos e aliados penitenciarem-se lembrando do italiano Paolo Mantegazza: o preço pago por se ignorar a realidade é o devaneio, é não ir a lugar nenhum. Quem almeja a Presidência da República, como de resto qualquer outro cargo na vida pública, não pode se limitar a criar factóides, apontar o dedo aos outros – escondendo, contudo, o seu telhado de vidro – e apostar no ódio como combustível de campanha. 

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