Por
Guilherme Gutman e Pedro Duarte
A caracterização de um sujeito como alguém romântico
recupera conceitos como “melancolia” e “nostalgia”. Emerge, assim, a noção de
um presente faltoso, um passado que se foi e certa esperança de um futuro que
nunca chega. A relação entre Romantismo,
melancolia e modernidade pode ser descrita através de uma dimensão
crítica. Apesar dessa crítica representar algo aceso e vigilante, e a
melancolia aparentemente associar-se a um desânimo e passividade, a reflexão
sobre o diálogo entre esses três elementos é possível através do caráter
crítico inesperado da melancolia. Essa tese encontra-se no pensamento de Michel Löwy, principalmente, em sua
obra Romantismo e messianismo, na qual se pretende descobrir tal
dimensão nas reflexões marxistas.
A
modernidade marcha a todo vapor calcada no Progresso e na Ciência, e a
melancolia acompanha o movimento, não se apresentando passiva diante dele, mas
crítica. O olhar melancólico seria quase como um antídoto à visão progressista
da modernidade e da História. Ele é um olhar dirigido não para a face épica das
criações humanas, mas para os seus escombros e seu aspecto trágico.
A
dimensão do ruminar é entendida
pelos teóricos da melancolia como o seu aspecto positivo. O ser melancólico não
apenas perde alguma coisa ao não conseguir lidar com funções pragmáticas e
elementos mundanos, mas ganha a possibilidade de pensamento e criação. Ele é
capaz de transformar objetos pretensamente úteis em objetos de ruminação. A melancolia como ruminação, dessa forma, exige um
processo muito mais lento que o tempo racional e científico.
A
melancolia aparece no Romantismo marcada por um caráter histórico. A
modernidade nasce sob o signo melancólico porque a sua base é a falta, a perda.
O significado da palavra moderno
surge de uma autoconsciência histórica da modernidade. O sujeito moderno não se
sente mais capaz de confiar na sabedoria antiga para prosseguir. O seu mundo
está marcado por uma crise na história da cultura e por um desamparo.
É
justamente a conquista da autoconsciência da modernidade que possibilita a
querela entre Romantismo e Classicismo quanto à beleza estética.
O que a vida moderna teria perdido em relação à Grécia seria a capacidade de
basear-se em um padrão. A modernidade
não pretendeu abandonar os gregos, mas reconheceu o padrão de vida desses como
insuficiente para compreensão dos problemas do mundo moderno. Nesse momento,
encontra-se um olhar melancólico diante de um mundo que perdeu uma forma já
estabelecida.
Perde-se,
portanto, a importância da beleza clássica e surge uma nova categoria no lugar
do belo, o sublime. O belo representa um sentimento estético de puro prazer, harmonia
e perfeição. Já o sublime é prazer
com dor, alegria com tristeza. Na
modernidade não há mais a ligação entre um sujeito e seu objeto através de um
fio pleno. Experimenta-se um mundo de caráter problemático e confuso. Tal
condição se reflete na arte e no desenvolvimento das obras do período.
O
homem moderno olha para a natureza e não consegue mais encontrar um lugar para
si. Caminha na escuridão por não ter mais uma tradição clássica que o oriente e
enfrenta, desamparado, ruínas e escombros. É no Romantismo que a paisagem e
natureza ganham pela primeira vez um papel que não é o de cenário, um mero pano
de fundo. A natureza romântica não é mero objeto a ser manipulado pela
humanidade. Ela é um personagem vivo e poético que não está apenas atrás do
que acontece, mas é o que acontece. No entanto, ela não se mostra
totalmente. É nebulosa.
O
sublime é definido pelos
filósofos do final do século XVIII como um sentimento estético derivado do
momento de incapacidade da imaginação humana em nomear alguma coisa, ou seja,
de uma resistência do objeto. O sublime
aparece quando todo o padrão de medida é implodido. Para Kant, no sublime encontramos um grande prazer, pois é como se nossa
imaginação apresentasse um desafio ao nosso pensamento. Quando ela não consegue
formar uma imagem precisa de determinada coisa, a imaginação recorre ao
pensamento para que esse atue de alguma maneira. Eis o sublime.
Tanto
o belo quanto o sublime são, no pensamento kantiano, características subjetivas e tipos de
representação nos quais não encontramos o absoluto diretamente, mas indiretamente. Um sujeito tem acesso
ao absoluto na medida em que se
frustra e fracassa por não conseguir atingi-lo. O absoluto se afasta a cada tentativa e simboliza uma ausência
sentida porque tentada. Há um contato com o
absoluto diante da impossibilidade
de assim representá-lo. Essa ideia auxilia a compreensão do caráter melancólico
do Romantismo: o reconhecimento
da incapacidade científica de tudo esclarecer.
A
melancolia romântica é uma crítica à modernidade feita a partir dela mesma. Se
a modernidade critica todos os tipos de ideais já definidos, é preciso que ela
seja também autocrítica. E é justamente o caráter melancólico produzido por
esse período histórico que possibilita a crítica de si mesmo.
O
que se aprende desde os filósofos antigos é que o bem encontra-se do lado da claridade, do Sol. O Romantismo, por sua vez, valoriza a
noite e descarta sua associação ao mal.
A claridade, a luz são fundamentais se o interesse do observador é
pragmático, objetivo e busca reconhecer certa ordem. Mas é a escuridão que
possibilita a visão da unidade, do conjunto e que impulsiona a imaginação. A
tradição romântica aponta para a visualização da dimensão contrastiva da noite
e descarta sua subestimação. O sonho e
o inconsciente tornam-se
fundamentais diante da desconfiança da autodeterminação e da vigília do homem.
O amor romântico é prazer e serenidade.
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Fonte: www.casadosaber.com.br
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