terça-feira, 17 de dezembro de 2013

'A esperança é o único dever e a saudade é uma jaula'

Tal asserção é do jornalista (e também poeta) pernambucano Geneton de Moraes Neto, em Funeral das Brancas Nuvens (1970 e nada). Autor de, entre outros, Dossiê Moscou, Geneton mostra que não é só no campo do jornalismo que ele mostra a que veio. De certo modo, o seu construto faz-me lembrar do quadro Cavalaria Vermelha, de Kazimir Malevich. A conferir. 

Cavalaria Vermelha: anúncio e enigma 

Funeral das Brancas Nuvens (1970 e nada), por Genton de Moraes Neto 

Eu vos anuncio o funeral da década das ausências
1970 e nada
Boa noite, imperadores da desesperança!!
Boa noite, patrulhas de gás lacrimogênio!!
Boa noite, senhores tristes do poder!!
Boa noite, velhos irmãos de cabelos cortados!!
Boa noite, batalhões de choque!!

Boa noite.... Durma em paz, Tio Sam

Eu vos anuncio o funeral da década das Brancas Nuvens...
1970 e nada
Boa noite, Planalto Central do Brasil!!
Boa noite, mestres de moral e cívica!!
Boa noite, heróis de estátuas!!
Boa noite, loucos carcereiros sem rosto!!
Durmam sem medo de nossas garras...
Eu vos anuncio o funeral da década sem bandeiras...
1970 e nada

Boa noite.....
Sonhem agora com a Paz Celestial
Os anos 60 já vão longe, longe, longe
E todos os profetas erraram!!

As ruas de maio em Paris,
A Primavera de Praga,
As cordilheiras da América,
Os palcos de Woodstock,
São agora um retrato na parede!

1960 sonhos, 1960 sonhos mortos e 1970 e nada!

Então....
Boa noite imperadores da desesperança!
Toquem os sinos da aleluia! Nós estaremos ouvindo em algum lugar
Vistam a roupa de sábado, afinem o coro dos contentes,
Vocês sabem, o nosso grito ficará calado...

E aí...
Bom dia, John Lennon de quarenta anos...
Bom dia, poetas de todas as manhãs...
Bom dia, pássaro-azul da felicidade-geral, que voa longe de nós agora...

Olhem o nosso coração
Ele resiste
Porque os velhos sonhos passaram para sempre e as nossas mãos, vazias de bandeiras, vão reconstruir novas miragens.

A esperança é o único dever e a saudade é uma jaula.

Então,
Boa noite, imperadores da desesperança!
Boa noite, patrulhas de gás lacrimogênio!
Boa noite, velho Marx!
Boa noite, Profeta das Oliveiras!
Vocês foram crucificados!

Eu vos anuncio que nós não estamos plenamente mortos!
Eu vos anuncio
Que nós
Não estamos
Plenamente
Mortos!

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