Por
Ivonaldo Leite
Dos
fatores que desvirtuam o comportamento humano, três, por certo, sobressaem logo
de imediato: os de caráter ontológico, os de agregação massificada e os de
ideologias.
No
primeiro caso, o ser humano pode ser tomado por três elementos que têm a propensão
de gerar três tipos de violência: 1) a competição, que gera o ataque aos
outros; 2) a desconfiança, que origina a violência para se defender; 3) o
desejo de glória, nutrindo-se bastante da vaidade, que faz emergir a violência (simbólica
ou não) por causa de ninharias, de coisas pequenas - a pequenez.
No
segundo caso, temos as massas, o comportamento de grupos, multidões. As respostas
em relação ao que consiste a diferença entre o comportamento de indivíduos e de
grupos são diversas, mas podem ser congregadas sinteticamente, até porque as
distinções são mais de grau do que de natureza. Se o medo, a alegria e a raiva
são três emoções humanas fundamentais, quando relacionadas às multidões, elas
se tornam, respectivamente, pânico, júbilo e hostilidade. O comportamento de
massa pode levar as pessoas a fazer o que elas provavelmente jamais fariam se
estivessem sozinhas. Evidentemente que a agregação coletiva é um meio imprescindível
para obtenção de conquistas, mas não se deve perder de vista que os limites
entre a "sabedoria" e a "loucura" das multidões é tênue, e isso envolve grandes
riscos – nesse sentido, basta lembrar em que resultou a ação extasiada das
massas nazi-fascistas ou de regimes, em “princípio bem intencionados”, como o do
Khemer Vermelho no Camboja.
No
terceiro caso, estamos diante do conceito de ideologia. Visão social de mundo,
falsa consciência, visão invertida da realidade, a ideologia tem sido uma
formulação polissêmica. Dessa polissemia, importa reter que a absolutização de
pontos de vista, o apego férreo a um conjunto de ideias, a incapacidade de
fazer autocrítica, etc., alimenta a ideologia. Assim, as ideias passam a ter “vida
própria”, sobrepondo-se ao que de fato a realidade é, levando então os seus portadores
ao erro constante.
Neste
artigo, o terceiro da série que tenho vindo a escrever sobre a paralisação das
atividades no Centro de Ciências Aplicadas e Educação (CCAE)/Campus IV/UFPB, coloco
em realce, preliminarmente, a abordagem a respeito dos referidos três fatores tendo
em conta exatamente os últimos acontecimentos. Descontada a alta voltagem de
ocasiões como as de uma paralisação de atividades, é chegado o momento da busca
da razão, do bom senso e de se reconhecer como efetivamente os fatos são. É
chegado o momento de se evitar o desvirtuamento de comportamento.
A
cultura democrática não se fortalece quando, sobretudo numa universidade (que
deve ser um exemplo para a sociedade), a comunicação cede lugar a meios que
negam a interação e corroem a transparência e o respeito entre as partes. Quando não se reconhece os passos processuais da
negociação, e se constroem versões que desqualificam esses. Nesse sentido, não tem
amparo na realidade a versão segundo a qual o diálogo esteve zerado desde a
deflagração da paralisação, e que só no último dia 16/08 foi que ele ocorreu
pela primeira vez. Por que negar que encontros anteriores aconteceram com a
presença da própria Reitora e de representantes da sua equipe, de onde
resultou, por exemplo, a abertura do RU de Rio Tinto? Dizer que o diálogo
esteve zerado durante todo esse tempo não tem sustentação na realidade, e nem
tampouco contribui para a resolução da situação e o encerramento da paralisação.
Em
seu Ensaio Sobre a Lucidez, o
escritor lusitano José Saramago afirma que, às vezes, determinada questão pode
ser relevada, mas nunca o será se houver maneira de a usarem como pretexto.
Que, nos próximos dias, sem desvirtuamentos, a paralisação das atividades no
CCAE seja cessada, como resultado da negociação, e por inexistência de
pretexto.
De modo particular, difícil pensar na realidade desses fatos e não pensar em literatura...
A situação que se vive em face dessa paralisação, em alguns aspectos, faz-me lembrar de Orwell com o magistral “A Revolução dos Bichos”. Sobretudo, do grito da massa em virtude de qualquer oposição: “Quatro pernas bom, duas pernas ruim”. Numa intensa tentativa de “convencer” a todos os bichos dessa ideia. Em consequência, não importa quem seja do grupo das “quatro patas”, ou das pernas... Todos são bons e todos são ruins, respectivamente. O desenrolar dos fatos, parece-me, revela a fraqueza e cretinice de algumas ações e posições por parte de quem, em nome do justo, age com injustiça. O que me lembra, também, Saramago: “Quantos cegos serão precisos para fazer uma cegueira.” (?) - Ensaio Sobre a Cegueira.
Enfim, aguarda-se o desenrolar dos capítulos.