Por Ives Gandra Filho
(Advogado, Professor
Emérito da Universidade Mackenize)
Em
1964 e 1981, em dois Congressos das Comunidades Portuguesas espalhadas pelo
mundo, realizados em Lisboa, defendi a tese de que a vocação lusíada de
integração de povos, ao longo de sua história, poderia permitir que as nações
de língua portuguesa, em quatro continentes, conformassem uma autêntica
confederação de países.
É
que a história brasileira está indissoluvelmente ligada à de Portugal, mais do
que a história das nações hispânicas à de sua colonizadora.
Assim
é que o Brasil teve sua independência proclamada por um rei português (Pedro
4º, em Portugal e 1º, no Brasil) e ofertou uma rainha brasileira que governou
Portugal (Maria da Glória) durante anos, em face da característica maior do
povo lusitano de integração e permanência nos espaços aonde chega. Essa maneira
de ser de seu povo torna os países de língua portuguesa na África, na Europa e
na América, além do Timor Leste, nações com cultura, costumes e tradições mais
próximas do que aquelas de outros povos.
Numa
área territorial de dimensões semelhantes, em que se dividiu a América Latina
entre a Espanha e Portugal, o gênio português conseguiu manter, no Brasil, a
unidade que a Espanha não obteve, vendo o território por ela colonizado, quando
independente, ser fracionado em inúmeras nações. Talvez a razão disso tenha
sido o fato de Portugal, desde 1140, ano de sua independência, ter sido uma
nação de governo centralizado, não sofrendo a instabilidade do resto da Europa,
onde, muitas vezes, os senhores feudais eram mais fortes que os reis.
Temos
um patrimônio cultural comum, uma maneira de receber outros povos --veja-se o
cosmopolitismo da cidade de São Paulo-- que é, talvez, a característica maior
dessa solidariedade, hoje tão necessária, num mundo conturbado, em que as ideologias
--corruptoras de ideais-- conformam regimes políticos geradores de
turbulências, semiditaduras, ódios plantados e violências claras à dignidade
humana, em muitos espaços geográficos.
A
característica maior da maneira de ser dos portugueses no mundo foi aceitar a
cultura local, mantendo a unidade de sua própria cultura e valores, que nós, no
Brasil, herdamos, ao recebermos de Portugal uma nação continental. Acolhemos
todos os povos, mantendo nossa maneira de ser, o que pode transformar-se em
plataforma para a valorização futura do diálogo e entendimento entre os povos.
Por
isso, poderíamos aproveitar, num mundo em transformação, essa ponte que
Portugal representa, na União Europeia, e o Brasil, no continente americano,
para os povos de língua portuguesa. É de se lembrar que a comunidade
luso-brasileira cresce continuamente, tanto de portugueses no Brasil, como de
brasileiros em Portugal, sendo que para lá se dirige nosso maior contingente de
estudantes no exterior.
Devemos
abrir, pois, novas perspectivas, que transcendam as soluções políticas de
conveniência de pactos regionais limitativos, para acordos mais abrangentes,
visto que as raízes da comunidade luso-brasileira são cada vez mais profundas e
ofertam, se soubermos aproveitar, oportunidade de integração de espaços muito
mais amplos, com as potencialidades daquele europeu, tese que defendi em Lisboa
em 1964 e 1981, via uma autêntica comunidade das nações de língua portuguesa.
À
luz de tais horizontes comunitários, que têm no idioma e nos valores culturais
indestrutíveis alicerces, é que a data de 22 de abril mereceria uma reflexão
maior por parte de lusos e brasileiros.
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Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/162402-dia-da-comunidade-luso-brasileira.shtml
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