Lenio Luiz Streck** Certa vez, preocupado com a falta de gols, o Presidente da   FIFA pensou em uma solução: aumentar o tamanho das goleiras. À época, cheguei   a sugerir que, em vez disso, poderíamos proibir os goleiros de terem mais de   um metro e meio, o que daria o mesmo resultado. E o futebol ficaria   (formalmente) mais "eficiente".  Ora, lendo o artigo do Prof. Naomar de Almeida Filho propondo o fim dos mestrados, recordei-me da FIFA. Ou seja, já que precisamos de doutores (embora não seja isso que conste explicitamente no texto, pois se trata mais de uma defesa dos mestrados profissionalizantes-MP), por que não acabar com os mestrados e alçar todos os graduados diretamente ao mais alto patamar? Pergunto: alguém acha que, pelo simples fato de acabar com os mestrados, melhoraríamos o nível da pós-graduação? O fato de o mestrado ter sido criação da ditadura militar   não lhe retira a importância. O mestrado de hoje já não é o mesmo. Não há   dúvidas de que o mestrado fez com que melhorasse o nível do doutorado. O   mestrado (acadêmico) não é  uma "licenciatura exótica" (sic),   como quer fazer crer o Prof. Naomar. Trata-se de um importante passo para a   formação plena de docentes e de profissionais não docentes. A exigência do   mestrado é diferente da de um doutorado. Não se estuda Aristóteles no   mestrado do mesmo modo (profundidade) que no doutorado. A teoria aristotélica   não muda; seu nível de aprofundamento é que se altera.  No limite, poder-se-ia aceitar a tese do Prof. Naomar para   algumas áreas. Mas para  as áreas das Ciências Sociais Aplicadas (em   especial, para o direito), a retirada do mestrado acadêmico seria um   desastre. Com a proposta, um aluno sai da graduação e vai ou para um mestrado   profissionalizante, ou para o doutorado.  É isso? E com que bagagem iria para o doutorado? Já temos   problemas com alunos que "pulam" diretamente do mestrado para o   doutorado ou com doutorados que não exigem que o aluno curse disciplinas. E,   fora daqui, há países como a Espanha que, na área do direito, extinguiram o   mestrado. O resultado não é animador (na verdade, os doutorados de lá são   feitos para "exportação" - a maioria dos alunos vão daqui da A.   Latina, sendo que em alguns diplomas consta: no valido em território   nacional...!). Mais: veja-se os dottorati de ricerca da Itália: os alunos   fazem durante o doutorado um masters, exatamente para compensar a falta do   mestrado autônomo e dos créditos em disciplinas de doutorado, já que o   doutorado é de pesquisa (veja-se a falta que faz o mestrado); na França, o   DEA virou uma espécie de preparação para o doutorado.  Já por aqui - e   falo especificamente do direito - , corremos o risco de recebermos uma   enxurrada de diplomas  de doutorados semi-presenciais e/ou à distância   de duas universidades argentinas (além de uma do Paraguai), em "convênios"   (sic) com IES brasileiras. Uma delas (da Argentina) oferece, em anúncio em   São Paulo, 160 vagas de uma só vez (veja-se: terrae brasilis, com 17   doutorados, oferece por volta de 230 vagas/ano...!) E, atenção: correm boatos   que esses diplomas serão validados em Pindorama. Agora vai! Viva o complexo   de Caramuru. Embora essas questões relativas à área do direito não   tenham relação com o artigo do Prof. Naomar, vale o contexto, e nesse   sentido, a contribuição do Professor é, sim, valiosíssima, porque estabelece   o debate. Aliás, um necessário debate. Sei que o Professor Naomar não disse   que queria que os alunos que saem da graduação ingressem direto no doutorado.   Mas dá para inferir isso. Devemos debater, sim. Sua preocupação é mais do que   válida, quando refere a necessidade de MP's. etc. Mas, mesmo assim, estes não   servem - mas não servem mesmo - para áreas como o direito, filosofia,   teologia, sociologia. Podem ser bons para a epidemiologia, engenharia,   administração, etc. Penso que nossos mestrados funcionam muito bem. Há como   fazer uma boa graduação sem professores mestres bem formados? Há problemas?   Muitos. Mas extinguir os mestrados acadêmicos agravará a crise.   Inspirarmo-nos no Protocolo de Bologna é sucumbir a modelos, estes sim,   exóticos. O que é bom para Europa é bom para o Brasil?  Pergunte-se aos   maiores professores de lá se eles concordam com esse "encurtamento na   formação" constante no protocolo. Bologna é o caos.  Numa palavra: como no caso da FIFA, eu prefiro apostar na melhoria da pontaria   dos atacantes. Treinando mais, eles haverão de fazer mais gols. Há sempre um   longo caminho a percorrer. Fico preocupado com teorias eficientistas. Aliás,   em várias ramos do conhecimento, sabemos o que representa buscar eficiência a   qualquer preço. ---------------------- ** Lenio Luiz Streck, Doutor em Direito, Professor   Titular da UNISINOS-RS, membro, por seis anos, do Comitê da CAPES, área do   direito.  |   
quinta-feira, 1 de dezembro de 2011
Resposta ao artigo o 'Fim do Mestrado': continuando o debate
De uma leitora deste blog, recebo um artigo em resposta ao que ontem publiquei sobre o fim dos mestrados. Márcia (UFPE), muito obrigado pela leitura deste espaço. O artigo-resposta é de Lenio Luiz Streck, da UNISINOS e ex-integrante de um comitê de área da CAPES. Com uma pitada de ironia, ele faz um "good point". A seguir, vale a pena a leitura.
Estou adorando o debate...Será que terá resposta?
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